
Na quinta-feira à tarde, confesso: chorei.
Não sou católico. E nem é preciso ser. Porque quem não se emociona com a comoção da escolha de um novo Papa já está totalmente anestesiado por esse mundo que anda nos roubando, aos poucos, até a nossa capacidade de sentir.
Em meio a um planeta exausto de más notícias, de bombas, de barulho e de corrupção, surgiu, na Praça São Pedro, uma nova esperança. A fumaça branca subiu e o mundo voltou a olhar para o céu, nem que fosse só por alguns segundos.
O novo líder da Igreja Católica se chama Leão XIV. E o nome que ele escolheu diz tudo — ou quase tudo.
Leão XIII, o último a usar esse nome, guiou a Igreja na virada do século 19 para o 20 com coragem. Foi o Papa que enfrentou a questão social de frente. Falou de trabalho digno, de justiça, de equilíbrio entre fé e realidade. Em pleno século 19, já dizia que não dava pra ignorar as dores do mundo moderno. Foi ele quem lançou as bases da Doutrina Social da Igreja. Um precursor do que Francisco, com toda sua ternura e radicalidade, veio aprofundar mais de um século depois.
Agora, ao adotar o nome de Leão XIV, o cardeal Robert Francis Prevost sinaliza algo precioso: continuidade e coragem.
Continuidade com o espírito reformador de Francisco, cuja humanidade era tamanha que incomodava justamente aqueles que há muito já se perderam de si mesmos. E coragem de se posicionar, numa Igreja ainda ferida por escândalos e tensionada entre dogmas imutáveis e um mundo que exige respostas novas.
A escolha desse nome pode ser um rugido de volta às origens. Mas também pode ser — e tomara que seja — um sopro de novo fôlego.
Porque o que a Igreja precisa hoje não é de mais gestão, e sim de mais escuta. Ela não precisa de administradores, precisa de pastores. Pastores como Cristo era, dispostos a se abaixarem, a se sujarem de humanidade, a ouvirem o que as palavras não dizem.
Leão XIV assume o trono de Pedro num mundo descrente. Não só de Deus, mas das pessoas, das instituições, do futuro. Ele também assume esse posto num mundo hiperconectado, inquieto e impaciente. Um mundo que não aceita mais discursos sem prática e que só vai respeitar uma Igreja que se ofereça como consciência moral, e não como ditadora de costumes.
O desafio é gigante.
Mas todo novo Papa carrega, nos ombros, um pedaço do mundo e no olhar, uma chance de renascimento.
E foi isso que eu vi quinta-feira: olhos marejados, corpo curvado, e uma dignidade que parecia renascer com cada sino da Basílica.
Se Leão XIV conseguir unir a fé de Francisco com a força do nome que escolheu, pode ser que a Igreja volte a inspirar não apenas os católicos, mas todos os que ainda acreditam que a luz precisa vencer a cegueira.
Que ele ouça, que ele sinta, que ele cuide. Porque, nesses tempos de trevas, um bom pastor ainda pode fazer toda a diferença.