Foi uma minissérie longa, cheia de suspense e reviravoltas, mas terminou na noite de terça-feira (22), no plenário da Câmara dos Deputados: o teto de gastos acabou, em seu lugar existe um novo marco fiscal que define as regras - e o mais importante, os limites - do gasto público no Brasil.
Mas se desenhar a moldura já foi difícil, o desafio mesmo será entregar a obra de arte que terá de ocupar o espaço vazio: o aumento na arrecadação que permitirá ao governo Lula entregar a promessa de zerar o déficit do orçamento - algo em torno de R$ 150 bilhões, conforme o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
E já que está aberto o capítulo das promessas, a do candidato que venceu a eleição presidencial era de colocar o pobre no orçamento e o rico no Imposto de Renda. No mesmo dia em que pôde celebrar uma vitória relativa - nove entre 10 economistas dizem que o arcabouço não para em pé se não for recheado por novas receitas -, o Brasil teve uma boa mostra que a segunda tarefa é muito mais difícil do que a primeira.
É verdade que o marco fiscal vai à sanção presidencial desbastado: os deputados aceitaram deixar fora do limite de despesa as do Fundeb, para educação básica, e o fundo constitucional do Distrito Federal. Mas transformaram outro extra de R$ 32 bilhões - patrocinado pela ministra do Planejamento, Simone Tebet - só em 2024 em "despesas condicionadas" - ou seja, cada uma terá de ser aprovada individualmente. A Câmara também recolocou despesas com ciência e tecnologia dentro do novo teto.
Pelas regras do novo marco fiscal, se o governo não atingir a meta de déficit zero - ou de 0,25% pela margem de tolerância no final de 2024 - será punido no ano seguinte. No mercado, a estimativa mais frequente para esse resultado, até agora, é de 0,8% - o percentual é relacionado ao PIB, ou seja, se a economia crescer, reduz a quantia necessária para alcançar a meta (por aumentar o denominador).
Ou seja, se não cumprir esse compromisso, o governo federal será obrigado a cortar despesas um ano antes da eleição. Daí o requisito de "obra de arte" para o próximo desafio da equipe econômica: a ministra do Planejamento tem nove dias para mandar ao Congresso um orçamento de 2024 adequado às mudanças. Mas seus colegas de equipe econômica terão de fazer mágica para aumentar arrecadação. No episódio da tributação sobre offshore - aquele pé de meia guardado no Exterior, como tinha o ex-ministro da Economia, Paulo Guedes - teve um mostra de como é difícil colocar os ricos no imposto de renda.