Com o anúncio do estímulo à indústria automotiva, nesta semana, o governo federal adicionou R$ 2 bilhões a uma conta estratosférica, a da renúncia fiscal, direta ou indireta.
Além de trocar a ênfase do programa de carros para caminhões e ônibus, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ainda tentou esfumar os contornos de uma nova renúncia, mas apenas adiou a perda de arrecadação.
A manobra ficou assim: em vez de uma desoneração direta de tributos, o governo vai dar créditos tributários às montadoras que venderem os veículos com descontos aos consumidores. Com esse desenho, o valor do desconto dado ao consumidor poderá ser usado no futuro para abater do pagamento de impostos à União.
Apesar da "disfarçada", o efeito líquido é o mesmo, do ponto de vista arrecadatório, apenas um pouco adiado. Mostrou que ao menos uma lição foi aprendida: especialmente no governo Dilma Rousseff, foi concedida uma montanha de estímulos tributários, com forte perda de receita, que não produziram o efeito desejado: mais consumo, mais produção e mais emprego.
Mas se o governo Dilma foi pródigo na concessão de benefícios, conhecidos como "bolsa empresário", o que se supunha uma espécie de oposto conseguiu a pouco invejável façanha de, em apenas um ano, aumentar em mais de um terço a contas de subsídios, estímulos e incentivos. O Ministério do Planejamento informou nesta semana que a montanha de renúncias fiscais que "media" R$ 425,3 bilhões em 2021, ganhou um novo pico em 2022: R$ 581,5 bilhões.
É um aumento de 36,7% em apenas um ano. Ou para melhor entendimento, foram adicionados R$ 156,2 bilhões em benesses de discutíveis benefícios para toda a sociedade - e mais controverso ainda do ponto de vista da eficiência para reduzir pobreza e desigualdade, as maiores vergonhas do Brasil.
É essa conta sobre a qual Haddad repete, semana sim, semana também, ter intenção de reduzir em pelo menos R$ 150 bilhões para fazer seu novo marco fiscal parar em pé. Agora, fica claro: seria o valor que cresceu em apenas um ano. Por isso, foi preciso reduzir a ambição do programa e condicionar o benefício ao efetivo desconto ao consumidor.
E como tudo está conectado, nessa conta estão as reduções artificiais nos preços dos combustíveis pela via da redução de tributos - nesse caso não só federais, mas estaduais, o que seria inconstitucional. E tudo se juntou outra vez na tentativa de empurrão à venda de veículos: o que vai financiar a renúncia fiscal futura é a recomposição da tributação do diesel. Um artificialismo a mais, um a menos.