Complicou: a votação da PEC da Transição na Câmara dos Deputados ficou para a próxima terça-feira (20), cinco dias antes do Natal. Ainda é possível? Todos sabem, a essa altura, do que é capaz o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), em datas e prazos mais improváveis. A grande questão é se está disposto a fazê-lo.
Existe, portanto, um sério risco de que o novo governo tome posse sem resolver uma questão considerada essencial desde o dia seguinte à eleição. O que está em jogo é o preço que aceitará pagar a Lira para garantir a "licença para gastar".
Há muitas versões sobre o tamanho da conta. O simples apoio do PT a sua reeleição para a presidência da Câmara, já manifestado, não foi suficiente. Houve especulações de que Lira teria exigido, em troca dos 308 votos necessários para aprovar a PEC da Transição na Câmara, seis votos no Supremo Tribunal Federal (STF) que permitissem manter o orçamento secreto. A tese nasceu de informações de que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, teria defendido a derrubada da maior ferramenta de poder de Lira em conversas com ministros do STF.
Com o julgamento no STF a 5 a 4 contra o mecanismo, essa entrega, que já não era factível, tornou-se inviável. As moedas de troca, agora, seriam dois ministérios: o da Saúde e uma parte do Desenvolvimento Regional, que deve ser dividido em Cidades e Integração Nacional. Dadas as circunstâncias, seria como não fazer a troca de governo na pasta, do ponto de vista dos interesses de Lira.
Na Saúde, mandou e desmandou - mais o último do que o primeiro - o líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros, alvo de uma antológica delação durante a CPI da Covid. O naco do Desenvolvimento Regional permitiria a manutenção do controle de Lira sobre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), sua galinha dos ovos de ouro.
Por isso, voltou a crescer entre aliados de Lula a ideia de buscar uma alternativa à PEC, como logo depois do anúncio de que essa seria a medida legal mais segura. No entorno do presidente eleito, há quem admita até erro de articulação, mas poucos são capazes de fazer chegar a Lula a avaliação de um pequeno grupo da transição: o excesso de ambição na formulação da proposta, que mesmo depois de um corte de R$ 30 bilhões ainda ronda os R$ 200 bilhões, joga a favor de Lira.