O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quinta-feira (15), o julgamento sobre a constitucionalidade das emendas de relator. Mas com placar de 5 a 4 contra o orçamento secreto, a Corte interrompeu a sessão, a pedido dos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
As ações em questão foram apresentadas pelos partidos Rede, PSB, Cidadania e PSOL, de oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro. A relatora do caso é a presidente do STF, ministra Rosa Weber. Segundo a magistrada, a análise do caso será retomada na manhã da próxima segunda-feira (19), na sessão de encerramento do ano judiciário.
O julgamento começou em 7 de dezembro. Na sessão de quarta-feira da semana passada (7), o governo federal e o Congresso se uniram na defesa do instrumento, criado em 2020 e que já distribuiu R$ 53,5 bilhões. Nesta semana, também na quarta-feira (14), Rosa Weber abriu a votação se manifestando contra a prática, que, segundo ela, é incompatível com a Constituição, e determinando a publicação de informações sobre serviços, obras e compras realizadas com as verbas do orçamento secreto e identificação dos solicitadores e beneficiários, no prazo de 90 dias. A sessão foi encerrada logo após a explanação da relatora.
Primeiro a votar na sessão desta quinta-feira (15), ministro André Mendonça discordou do voto de Rosa Weber, disse que o orçamento secreto é, sim, constitucional, mas determinou que ele precisa seguir as mesmas regras de transparência do orçamento. O ministro viu "omissão parcial" dos poderes Executivo e Legislativo ao deixar de regulamentar a execução das emendas para atender aos princípios da transparência e publicidade. Para ele, no entanto, não se pode falar em "orçamento paralelo".
Em seu voto, Mendonça sugeriu prazo de 60 dias para que o Congresso garanta às emendas de relator o mesmo nível de transparência das outras emendas. E afirmou que eventual posicionamento do STF proibindo a execução das emendas poderia sobrepor a autonomia legislativa:
— Entendo que merece uma meditação prolongada de nossa parte sobre as condições de possibilidade e limite de uma intervenção do Supremo na matéria.
Na sequência, foi a vez de Kássio Nunes Marques. Ele defendeu que o orçamento secreto é assunto legislativo e votou a favor da continuidade do esquema. Disse que as ações não tiveram "êxito dentro do Parlamento" e buscam o Judiciário como "espécie de terceiro turno de deliberação". Entretanto, concordou com os autores da ação no que diz respeito à falta de transparência na distribuição e pagamento das emendas:
— As programações orçamentárias são públicas e devem estar à disposição para qualquer cidadão em consulta.
Após um intervalo, a sessão recomeçou com o voto de Alexandre de Moraes, que acompanhou os colegas que o antecederam nesta quinta e votou pela constitucionalidade do orçamento secreto. Reconheceu, contudo, assim como os demais, que há pouca transparência sobre a destinação dos recursos, embora, segundo ele, a última palavra sobre o orçamento público deva ser dada pelo Congresso Nacional.
— Não entendo que o Legislativo deva ser afastado de participar da destinação de recursos orçamentários. Existe toda uma caracterização do nosso orçamento e, de tempos para cá, começou a haver uma participação maior do legislativo. Essa é uma premissa básica de que o Congresso deve participar, até porque é o Congresso que aprova o Orçamento — defendeu o ministro, que propôs ainda critérios para distribuição das emendas.
Para Moraes, a destinação dos recursos deve observar a proporcionalidade entre parlamentares da maioria e da minoria e entre bancadas do Congresso, "para evitar que haja privilégio de um parlamentar sobre o outro".
Com a relatora
Quinto ministro da Corte a votar, Edson Fachin foi o primeiro do dia a acompanhar o voto da relatora Rosa Weber e julgar inconstitucional a prática das emendas de relator. Para ele, aspectos como a falta de registro, problemas no controle e transparência e inexistência de prévia vinculação ao autor as emendas ferem "os princípios republicanos da legalidade, moralidade, publicidade e impessoalidade".
Fachin condenou a "utilização personalista, discricionária e aleatória de parcela vultosa do orçamento federal" e disse que "não há transparência quando não se explicitam os critérios objetivos da eleição das localidades e ações beneficiadas e, portanto, afasta-se da noção de política pública".
Na sequência, Luis Roberto Barroso fez coro a Fachin e Rosa Weber e votou favoravelmente às ações pela inconstitucionalidade das emendas do relator. Destacou como aspectos inconstitucionais a falta de transparência na distribuição das emendas e uma "burla à iniciativa do presidente da República" de encaminhar a proposta orçamentária:
— Numa República não existe alocação de recurso público sem a clara indicação de onde provém a proposta, de onde chega o dinheiro e a verificação se chega o dinheiro.
Luiz Fux deu andamento ao julgamento, declarando seu voto "em integral concordância" com o voto da relatora.
— Isso (o orçamento) não pode ser secreto. Tem de ser, ao contrário, publicizado, como exige a própria Constituição Federal — destacou. — À sociedade é devido explicações quanto às prioridades e à probidade adotada durante a gestão da coisa pública e do orçamento nacional" — acrescentou o ministro.
Dias Toffolli foi o oitavo ministro a votar e se manifestou pela constitucionalidade da prática das emendas do relator, voltando a empatar o placar em 4 a 4. O ministro sugeriu uma série de critérios, a serem regulamentados em até 90 dias, para que as emendas possam ser consideradas constitucionais. Entre eles, a alocação dos recursos de acordo com prioridades estratégicas do país:
— Entendo que é necessário e se impõe regulamentação específica, que são a cargo dos poderes Legislativo e Executivo, para que as emendas de relator atendam aos preceitos e comandos impositivos da nossa constituição.
A ministra Cármen Lúcia também acompanhou o voto de Rosa, e assim, o placar foi ampliado em 5 a 4. A magistrada disse que não é possível tratar uma emenda parlamentar como "barriga de aluguel". Também chegou a afirmar que o Brasil é uma república e "não uma entidade estatal com o nome segredo".
— As coisas do estado do povo tem que ser de conhecimento do povo — ressaltou.
Interrupção faltando dois votos
Foi então que os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes pediram mais tempo para análise, e a decisão do STF sobre o orçamento secreto foi adiada para a próxima sessão, na segunda-feira (19).
Ao pedir a retomada da votação na semana que vem, Lewandowski elogiou a resolução do Congresso que tenta mudar as regras do orçamento secreto enquanto a Corte analisa o tema. Já Mendes foi além e disse que os ministros precisam refletir sobre o tema por ser determinante para a relação entre os Poderes.
O ministro alertou que dois presidentes foram alvo de impeachment por perder apoio no Congresso:
— Em jogo está a governabilidade.