O governo Bolsonaro luta contra a lei da oferta e da demanda em um caso de vida e morte, o da vacinação contra a covid-19. Assim como pretende que fornecedores hiperdemandados batam à sua porta para vender vacinas, imagina que os preços de outro insumo cujo consumo explodiu, as seringas, mantenham valores anteriores aos da pandemia.
Nesta quinta-feira (6), o presidente informou, por rede social, que a compra de seringas está suspensa "até que os preços voltem à normalidade". Se for levado ao pé da letra, a compra vai ocorrer lá por 2023, supondo que a pandemia seja domada até lá.
Na licitação do Ministério da Saúde para a compra de 331 milhões de seringas que resultado na compra de cerca de 7 milhões (menos de 3%), ficou claro que havia problema de preço. A coluna já havia perguntado ao presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde (Abimed), Fernando Silveira Filho, se havia cobrança abusiva. Ele afirmou que a entidade não se envolve nesse assunto – como repetiu Paulo Henrique Fraccaro, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo) na manhã desta quinta-feira (6) à GloboNews. Mas Silveira Filho, depois de algum insistência da coluna, admitiu que os fabricantes foram "obrigados" a repassar aumentos nas matérias-primas, especialmente plástico, que dispararam com a alta do dólar em 2020.
– São insumos e matérias-primas que tiveram preços alterados pelo câmbio, e isso foi repassado. O governo ofereceu preço fora da realidade – disse Silveira Filho, lembrando que agulhas são feitas de aço, cujo preço quase dobrou em 2020.
Fraccaro, porém, disse à GloboNews que a diferença foi "pequena". De qualquer forma, é bom lembrar que um dos motivos da disparada ao redor de 40% do dólar em 2020 foi a estratégia "juro baixo, dólar alto" do ministro da Economia, Paulo Guedes. Depois da licitação fracassada, o governo restringiu a exportação e zerou o imposto de importação de seringas e agulhas.
Na conversa com Silveira Neto, diante da afirmação de que não havia condições de assegurar a quantidade necessária para a vacinação nacional, a coluna cogitou da hipótese de trazer do Exterior. O executivo lembrou que mais de 40 países já estão vacinando, outros tantos se preparando para iniciar a imunização, portanto há excesso de demanda global. Ou seja, preços e capacidade de produção estão pressionados.
A volta de Guedes das férias foi atribuída à necessidade de conversar sobre a infeliz – equivocada – frase de Bolsonaro sobre o Brasil estar "quebrado". O mais provável é que a principal missão do ministro, que conhece bem os mecanismos de mercado, seja socorrer o governo diante da falta de planejamento e da noção de formação de preços. Com certeza, poderá ajudar. Tomara que consiga.