A ausência do governo brasileiro Brasil na posse do novo presidente da Argentina, Alberto Fernández, na terça-feira (10), reforça a deterioração da imagem do Brasil no mundo diplomático e, por extensão, dos negócios internacionais. O motivo especulado para o cancelamento do envio de um representante, uma vez que o presidente Jair Bolsonaro já havia anunciado que não compareceria, só piora essa percepção.
Conforme interlocutores do Palácio do Planalto, Bolsonaro teria se incomodado com a visita do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) à Argentina, que incluiu uma visita a Fernández exatamente no dia em que ocorria, em Bento Gonçalves, a esvaziada reunião de cúpula do Mercosul.
Quem tinha todos os motivos para lamentar a eleição de Fernández, o atual – por mais um dia – presidente Maurício Macri, fez o que a democracia recomenda diante de uma derrota: cumprimentou o vencedor, reuniu-se com ele para fazer a transição menos dramática possível e avisou que fará "oposição responsável". Não tem apenas o opositor no foco, mas seu país, seus eleitores e as pessoas que, embora pensem como ele, terão de conviver com outro estilo de governo.
Pode ser frustrante, pode ser preocupante, mas é democrático. Ao deixar a representação do Brasil ao embaixador local, ou seja, relegá-la a um ato protocolar a cargo do diplomata que teria de comparecer de qualquer forma, Bolsonaro reforça o discurso de quem teme a relação do atual governo brasileiro com os mecanismos de freios e contrapesos típicos desse regime de governo. Contraria seu próprio pronunciamento na recente cúpula do Mercosul.
Desrespeita não apenas Fernández, mas os argentinos que o elegeram, os brasileiros que têm grandes interesses no país vizinho, de negócios a outras formas de integração e até as empresas brasileiras que mantêm unidades lá, respondendo a uma estratégia de Estado. A crise argentina ainda vai se aprofundar antes de avançar para a suavização. Martin Guzmán, ministro da Economia escolhido pelo novo presidente, é defensor da moratória total da dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o que significa que haverá turbulência forte à frente.
Mas a história dos segmentos mais impactados pela integração, como o calçadista, é testemunha de que os interesses de longo prazo sobreviveram aos inúmeros solavancos da relação. Neste momento, as exportações de sapatos para a Argentina desabam. Mas o país ainda é o quarto maior cliente do Brasil – terceiro se foram desconsideradas vendas pro forma de equipamentos navais à Holanda. Só por isso, exigia um esforço pela manutenção das boas relações possíveis neste momento.