A expectativa de vida da população de um determinado país tem sido usada como um critério de diferenciação social. O que é considerado coerente, porque afinal não se constrói longevidade sem alimentação suficiente, meio ambiente preservado, condições de moradia adequada e medicina qualificada, tanto terapêutica quanto preventiva.
Definido que vamos viver mais, duas perguntas deviam ser obrigatórias: para quê? E com que utilidade?
Em países mais desenvolvidos, como os escandinavos e o Japão, existem há algum tempo programas de reabilitação dos idosos, visando mantê-los produtivos e integrados à sociedade.
Uma política mais proativa não apenas qualifica a sociedade, pelo respeito que demonstra aos seus veteranos, mas também empresta ao idoso a chance de sentir-se útil, reconhecido como o melhor antídoto à tristeza e à depressão.
E a questão não é exclusivamente continuarem participando da preservação econômica do país, que afeta a todos; é também conservar intacta a autoestima dos nossos velhinhos, que de outra maneira estarão submetidos à sensação deprimente de hóspedes desesperançosos da sala de espera da morte. Uma política mais proativa não apenas qualifica a sociedade, pelo respeito que demonstra aos seus veteranos, mas também empresta ao idoso a chance de sentir-se útil, reconhecido como o melhor antídoto à tristeza e à depressão.
Antecipar a inutilidade em nome da aposentadoria pretensamente merecida só faz sentido àqueles portadores de limitações e dependências. Essas que, aliás, virão sempre com ares de injustiça, porque nos comportamos como se fôssemos viver para sempre. E nos surpreendemos ao descobrir que há um imenso descompasso entre o tanto que a medicina progrediu para aumentar a nossa expectativa de vida e o quanto a ciência tem patinado na busca de dignidade para esse adicional ganho com a protelação da morte. Sem avaliar consequências, alardeamos com euforia a previsão de que nos tornaremos centenários e mais adiante descobriremos, constrangidos, que o nosso corpo não foi programado para esses exageros. Na verdade, por otimismo exagerado, fingimos surpresa ao descobrir como é raro que, aos 70 anos, todos nossos órgãos e tecidos ainda funcionem a contento. E ficamos mais aflitos do que eufóricos com a promessa de três décadas adicionais, sem nenhuma garantia de que valerá a pena.
E mais devemos nos preocupar com o número crescente de idosos que dependem de assistência para os cuidados básicos. Alguns, ainda lúcidos o suficiente para atinarem que representam um peso insustentável para suas famílias, requerem suicídio assistido, como uma resposta desesperada ao sofrimento sem redenção. Outros, neurologicamente sequelados, representam um desafio para seus descendentes.
Os filhos bem-amados, com a plena consciência da responsabilidade de retribuir o cuidado de quem um dia os cuidou, se desdobram em desvelo até o fim, zelando por essa meia vida que se desencontrou da morte completa.
Mas até existe quem, por razões que desconhecemos, se expõe à execração pública ao colocar seu velhinho indefeso numa cadeira de rodas e abandoná-lo na calçada em frente à casa de um irmão, que, segundo se noticiou, se negava a compartilhar a tarefa.
A discussão das razões alegadas não vêm ao caso. Triste, muito triste, é que ninguém o queria.