A disponibilidade é um dos atributos mais reveladores da nossa personalidade. Na relação humana, se equipara à gratidão, como reveladora de virtudes que inevitavelmente identificarão uma índole solidária ou traços de caráter que delatarão a inutilidade do egoísta ensimesmado.
Em todas as profissões, a disponibilidade é festejada, porque, independentemente da situação, conforta a quem busca alguma ajuda a percepção de que encontrou alguém cujo interesse espontâneo dá significado e importância ao seu pedido.
O que pouca gente percebe é a complexidade das exigências na construção de um disponível. A minha impressão é que, quando festejamos a feliz casualidade de ter encontrado este tipo, parecemos ignorar quantos ingredientes são indispensáveis na produção desse modelo de profissional.
O primeiro diferencial é que esse profissional precisa gostar de gente, e, através dessa porta de entrada, ter descoberto o inigualável encanto de ajudar. E aqui há uma barreira inicial: não se consegue ensinar ninguém a gostar de gente.
O primeiro diferencial é que ele precisa gostar de gente, e, através dessa porta de entrada, ter descoberto o inigualável encanto de ajudar. E aqui há uma barreira inicial: não se consegue ensinar ninguém a gostar de gente.
Em segundo lugar, esta pessoa deve ter uma grande capacidade de adaptação e tolerância para conviver, sem perder a cordialidade, com os desencantos da sua própria vida, que não interessam a ninguém, mas modificam o ânimo do funcionário mais dedicado. E, muito importante, ainda tem que sobrar paciência para interagir com os chatos inevitáveis, esses que querem para si a atenção e a gentileza que nunca emprestaram a ninguém.
Como a disponibilidade é um dom pessoal, é ingenuidade crer que todos os bem remunerados devam ser gentis, e os sub-remunerados tem razões de sobra para um azedume básico. Não é o que se vê na vida real, com atitudes frequentemente invertidas a mostrar que o prazer de servir e o bálsamo da gratidão do ajudado não têm preço.
A medicina, por envolver, como poucas profissões, a rotina da busca ansiosa por ajuda, traz na sua concepção esta sentença: se você se chateia ao ser solicitado numa contingência não programada, evite ser médico, ou pelo menos, sendo, não se exponha às especialidades associadas ao medo da morte. E com esta sábia providência, poupe-se da deprimente sensação de inutilidade e previna-se de rótulos capazes de detonar a autoestima dos prepotentes mais soberbos.
Com a progressiva evolução da medicina para uma atividade multidisciplinar, tornou-se inevitável, especialmente na alta complexidade, o surgimento espontâneo de um consultor em cada especialidade. Selecionados naturalmente, por competência técnica, mas ungidos pela disponibilidade.
Na minha lista, esta seleção natural nasceu fortalecida pela descoberta de que não há nada mais irritante do que alguém que se sabe o quanto ele sabe, mas que nunca está no lugar, justo quando mais precisamos dele.