É com a mesma naturalidade da menina de 12 anos que pediu de presente de aniversário uma vaca vermelha, cores do seu time do coração, que a pecuarista Mariana Tellechea, da Cabanha Basca, de Uruguaiana, vê sua chegada à presidência da Associação Brasileira de Angus. Ser a primeira mulher no cargo em 60 anos de história é encarado como consequência da trajetória. O pioneirismo também vem de casa: o pai, Flávio Bastos Tellechea, foi o primeiro dirigente da entidade.
O que representa ser a primeira mulher a assumir a presidência da Associação Brasileira de Angus (ABA)?
Eu vim de uma vida inteira com a angus, me sinto super bem acolhida, em casa. Já participei de duas diretorias anteriormente, então, realmente, me sinto muito honrada. Vou ser a primeira mulher no comando, mas já tivemos várias em cargos de gestão, como presidente do Conselho Técnico, criadoras importantes, mulheres dentro da história da angus. Hoje em dia a gente leva muito em consideração a capacidade, a meritocracia das pessoas. Acho que essa realidade já chegou no mercado agropecuário.
Muda algo na forma de conduzir o cargo?
Acho que temos uma habilidade para relacionamentos, uma vontade grande de aprender, se interessar pelos desafios da nova função, pelo contato. Mas isso também é uma coisa pessoal, acho que o importante vai ser a dedicação, a energia e a maneira que a gente vai tentar, me colocar a par de todas as responsabilidades, os objetivos que estão sendo desenvolvidos pela associação. Fizemos a primeira reunião de diretoria, foi excelente. Este ano é muito importante, porque são 60 anos da fundação da Associação Brasileira de Angus e 20 anos do Programa Carne Angus, mais antigo programa de carne do Brasil. Temos realmente uma agenda muito importante em termos também de desenvolvimento de tecnologia, genética.
Você aponta como uma das metas expandir o selo de sustentabilidade criado pela raça. Por que isso é importante?
A associação criou com a Embrapa e o Ministério da Agricultura o selo de sustentabilidade. No ano passado, foi apresentado na Expointer um manual para obter a certificação. São exigências como registro de funcionários, bem-estar animal, rastreabilidade, vários itens que nós, da diretoria, temos certeza de que serão exigidos pelo mercado. E acho que o agropecuarista já tem isso dentro da sua propriedade. Então, seria muito bom na compra de uma carne angus, além dos selos que já existem, ter esse que dá a origem da carne, sabendo que é uma propriedade dentro dessas regras. É um primeiro passo, mas será muito importante daqui para frente, precisamos formar uma cultura entre os produtores.
Qual o papel da pecuária na sustentabilidade, no controle de emissões?
Com a recuperação e o incentivo à produção de pastagens, terá uma repercussão muito grande, cada vez mais. Começamos no ano passado a identificar linhagens que produzem mais gases e outras menos. Nessa primeiro reunião da diretoria já foi aprovado um teste de eficiência, que selecionará animais que comem menos e conseguem produzir mais carne, e também a questão da emissão de gás metano. Vai ser junto com a Embrapa Sul, em Bagé. E deve começar em março ou abril. Então, continuamos sempre tentando evoluir na pesquisa. A genômica também é uma coisa que vai nos ajudar bastante para cada vez mais conseguir produzir animais mais produtivos.
Como avalia o cenário atual da pecuária de corte?
Tivemos realmente um pouco mais de queda nos preços, na arroba do boi, mas tudo isso aconteceu também em outros setores. Não foi só na pecuária. Acredito que vá ser retomado. Tivemos uma ótima notícia de que a Indonésia já habilitou 11 plantas frigoríficas no Brasil para importar carne. Então, realmente terão outros mercados vindo, a China está firme, comprando também do Brasil. Acredito que o ano será bom, o que tinha que ser precificado, caído, já aconteceu. A gente está acreditando em uma retomada. Uma demanda mais estável.
Li em uma entrevista que no seu aniversário de 12 anos você pediu uma vaca. Foi ali que começou a paixão pela pecuária?
Meu aniversário caía muito seguido próximo do dia do remate da Paineira (cabanha da família). Um foi no dia do remate, e o pai não tinha visto nenhum presente. E me perguntou: “O que tu queres, minha filha?”. E eu disse: “Uma vaca, mas quero uma vermelha porque eu sou do Inter e eu acho a vermelha mais bonita do que a preta”. E aí finalmente ganhei a minha primeira vaca. Depois, a gente começou a registrar, ele vendia os machos, deixava as fêmeas e todos os anos eu via as minhas vacas, escolhia os nomes. Foi um gosto que foi desenvolvido desde criança. Sempre gostei muito de animais, sempre quis ser veterinária. Nunca tive dúvida da minha profissão. Adoro trabalhar no campo, com criação de gado, cavalo, cachorros, eu sou dos animais. Sou muito feliz com o meu trabalho, acho que foi a escolha certa. E tive também a sorte de ter nascido num meio que eu gosto tanto.