Para a esmagadora maioria das infecções virais, não existe tratamento específico. A ideia de uma pílula para tratar uma infecção ficou popularizada pelo uso dos antibióticos. Quando Fleming publicou, em 1928, que uma substância do fungo Penicillium havia matado suas culturas de bactérias, isso deu início a um paradigma ao qual muitos se prendem até hoje – indústrias farmacêuticas, mesmo quem trabalha com saúde.
Hoje, contudo, sabemos que só antibióticos não curam todas as infecções bacterianas. Inclusive, eles têm efeitos colaterais que podem diminuir a imunidade e selecionar bactérias mais resistentes. Por isso, seu uso está controlado. Então, uma pílula para tratar algo é na verdade uma ideia errada, que se propagou por muito tempo por falta de informação. Na maioria das doenças, tratamos os sintomas. A pesquisa básica necessária para curar uma doença leva tempo, é cara e, convenhamos, não interessava à maioria das pessoas até um mês atrás. Por isso, o investimento nesse tipo de pesquisa ficava restrito a empresas farmacêuticas, que, quando obtêm um resultado, cobram o que quiserem – e compra quem puder pagar.
Os vírus foram descobertos no fim dos anos 1800 em plantas. O primeiro em humanos foi o da febre amarela, no início do século 20. Ao longo dos últimos 120 anos, entendemos que recuperar-se de uma infecção viral depende intrinsecamente da resposta imune que o hospedeiro monta. Mesmo quando há algum tratamento mais específico para um mecanismo de virulência que descobrimos, o controle do vírus depende da imunidade. Assim, usamos os anticorpos que o hospedeiro cria contra o vírus para diagnóstico. Esses anticorpos podem persistir no sangue por muitos anos no hospedeiro, indicando seu contato com o vírus: é a chamada soroconversão.
O teste rápido que vem sendo usado para a covid-19 mede isso. Contudo, mesmo quando o hospedeiro cria anticorpos contra o vírus, algo que normalmente podemos ver em uma ou duas semanas, não sabemos quanto tempo eles duram. Isso é estudado constantemente, para todas as infecções virais. Além disso, a existência desses anticorpos nunca significa que o individuo está protegido. Por exemplo, indivíduos com HIV criam anticorpos contra o vírus, mas isso não os protege. Só alguns indivíduos conseguem criá-los – e daí, não se infectam. E alguns indivíduos não conseguem fazer anticorpos detectáveis.
Outros tipos de respostas imunes, que não anticorpos, podem estar protegendo. Ao desenharmos vacinas, tentamos estimular os mecanismos protetores e criar os melhores testes diagnósticos. O Sars-CoV-2 é muito parecido com o vírus da primeira sars. Hoje sabemos que alguns dos anticorpos contra aquele vírus podem proteger, ao menos parcialmente, do atual. Se as vacinas que foram desenhadas e inicialmente testadas naquele momento tivessem sido aperfeiçoadas e tornadas obrigatórias, hoje o que estamos vivenciando seria menos arrasador.
A economia sofre hoje porque não planejamos para algo que sabíamos que iria acontecer. Gestores, governantes, legisladores: precisamos entender de ciência. Todos queremos voltar ao trabalho. Mas não poderemos, jamais, voltar ao velho normal.