A Polícia Rodoviária Federal (PRF) adiou por mais 60 dias o término da investigação contra três agentes que realizaram o atendimento da colisão que resultou na morte da adolescente Bárbara Andrielli Mendes de Moraes, de 15 anos, na Freeway, no trecho de Santo Antônio da Patrulha. É o terceiro adiamento consecutivo da investigação. Com isso, a apuração pode levar nove meses para chegar ao fim.
Os três policiais rodoviários são investigados por demora de 85 horas para registrar o fato na Polícia Civil, como revelou a reportagem de GaúchaZH. A colisão da BMW X5 com a motocicleta onde a menina andava na carona aconteceu na madrugada de 3 de março. O registro pelos policias na delegacia foi só às 16h54min do dia 6, enquanto a reportagem já procurava por documentos do ocorrido.
À época, a reportagem também confirmou que não foi feito o teste do bafômetro no motorista, o médico Leandro Toledo de Oliveira. Ele dirigia com a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) suspensa por embriaguez ao volante e, segundo a Polícia Civil, voltava de uma festa embrigado e sob efeito de drogas. O médico sequer chegou a ser levado para uma delegacia.
Oficialmente, a PRF diz que todo o atendimento feito pelos agentes naquele dia é apurado.
A corporação defende que precisa de mais tempo para ouvir uma testemunha considerada chave no processo administrativo disciplinar. O atendimento feito pelos policiais teria sido presenciado por um gaúcho que mora no Rio de Janeiro. A PRF disse que preparou uma série de perguntas e está ajustando uma data com a superintendência do Rio de Janeiro para que o depoimento possa ser feito.
O processo administrativo disciplinar é feito por três policiais rodoviários, considerados de conduta isenta. A PRF declara que já foram ouvidas pelo menos 10 testemunhas. Algumas apontaram novas pessoas a serem ouvidas, o que teria causado uma duração mais longa do processo interno. Também declara que garante a ampla defesa aos servidores, o que acarreta em mais tempo.
O Ministério Público Federal (MPF) acompanha a investigação e aguarda o entendimento da comissão para tomar providências.
O processo administrativo disciplinar pode resultar até na exclusão dos policiais. Em caso de a comissão entender que a necessária punição seja suspensão acima de 30 dias, a decisão passa a ser do Ministério da Justiça e Segurança Pública, sob responsabilidade do ministro Sergio Moro.
Em maio, o que antes era uma sindicância interna ganhou o status de processo administrativo. Na oportunidade, o corregedor da PRF no Rio Grande do Sul, Leandro Wacholtz, declarou que a sindicância apontou para "possível erro de conduta" de todos os policiais que estiveram no local do acidente e o responsável pela equipe, que estava em uma base da PRF. Mesmo entendendo haver "fatos obscuros e que precisam ser explicados", o corregedor da corporação entendeu que não havia a necessidade de afastar os policiais.
Médico virou réu
Em 19 de junho, a Justiça de Santo Antônio da Patrulha tornou réu o médico por homicídio doloso eventual — quando se assume o risco de matar — duplamente qualificado e outras três tentativas de homicídio. Segundo a denúncia, "bêbado e em alta velocidade", o acusado atingiu duas motocicletas na BR-290, a freeway, no dia 3 de março de 2019, causando a morte de Bárbara Andrielli Mendes de Moraes, 15 anos.
O processo ainda está em fase inicial e não foi realizada nenhuma audiência.
A batida do carro do médico com as duas motos também feriu o pai, a mãe e um amigo da família da adolescente, que viajavam juntos e foram arremessados com a força da colisão. A mãe da vítima tem recuperação demorada por ter quebrado os ossos de uma das pernas e até hoje não conseguiu voltar ao trabalho.
O médico responde em liberdade. GaúchaZH tenta contato com o advogado do réu , que trocou de defensor durante o processo.
O fórum de Santo Antônio da Patrulha também entendeu melhor repassar o caso dos policiais à Justiça Federal. Dois deles foram indiciados pela Polícia Civil por prevaricação — quando um funcionário público não realiza sua função para satisfazer interesse pessoal.
Linha do tempo
3/3/2019 – Batida na freeway mata Bárbara e fere seu pai, mãe e amigo. Testemunhas dizem que o motorista apresentava sinais de embriaguez. Médico, com CNH suspensa, declara ter crise de asma, é levado para hospital e liberado sem sequer comparecer em uma delegacia ou passar por bafômetro.
6/3/2019 – Enquanto GaúchaZH procurava informações sobre o acidente com autoridades, o caso é registrado pela PRF na Polícia Civil, 85 horas depois. Nem sequer a assessoria de comunicação da corporação no Rio Grande do Sul sabia do ocorrido. A reportagem tem acesso ao documento e percebe que o médico não foi submetido ao teste do bafômetro. A PRF diz que vai abrir sindicância para apurar os fatos.
7/3/2019 – Procurado pela reportagem, o delegado responsável pela investigação, Valdernei Tonete, afirma que o caso não será prioridade e será apurado "na medida do possível".
8/3/2019 – Após a entrevista, a chefe da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, Nadine Anflor, determina que a delegacia priorize a investigação, diz que o delegado se enganou e oferece agentes para reforçar a equipe.
14/3/2019 – Os três policiais rodoviários que atenderam o acidente prestam depoimento em sindicância interna para esclarecer o motivo na demora para registrar a ocorrência e de não submeter o motorista ao bafômetro.
22/3/2019 – Mãe de adolescente recebe alta do hospital. Em junho, ela ainda apresenta dificuldades de locomoção.
9/4/2019 – Médico é indiciado pela Polícia Civil, um mês e seis dias depois do acidente. Apesar de constatar embriaguez, polícia entende que o caso é um homicídio culposo – sem intenção de matar. Policial rodoviário é indiciado por prevaricação.
12/4/2019 – Quatro dias após indiciamento, reportagem de GaúchaZH tem acesso ao inquérito. Até então, delegado não havia detalhado a investigação para a imprensa. Documento aponta que médico voltava de festa, supostamente embriagado e em alta velocidade.
8/5/2019 – PRF entende que houve "possível erro de conduta" de agentes e abre processo que pode resultar em demissão de policiais. O prazo da apuração termina em julho.
19/6/2019 – Justiça torna réu motorista por homicídio qualificado com dolo eventual e três tentativas de homicídio.
06/11/2019 - Investigação contra policiais por demora de 85 horas para registro de acidente com morte é novamente adiada