A Polícia Civil aguarda o resultado do laudo toxicológico que deve ajudar a esclarecer a causa da morte de Kerollyn Souza Ferreira, nove anos. A menina teve o corpo encontrado dentro de um contêiner de lixo no bairro Cohab Santa Rita, em Guaíba, na Região Metropolitana, na última sexta-feira (9). A mãe dela, Carla Carolina Abreu Souza, 29 anos, está presa de forma temporária e é investigada por suspeita de homicídio.
O laudo produzido pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) deve confirmar a causa da morte da criança. Isso porque não havia lesões externas de violência, que possam ter levado ao óbito. Uma das possibilidades apuradas pela polícia é a de que Kerollyn tenha morrido em razão da ingestão de um sedativo.
A mãe admitiu em depoimento ter administrado meio comprimido de clonazepam na filha, na noite anterior à localização do corpo. A análise pericial já descartou outras possibilidades, como morte violenta ou hipotermia.
O contêiner onde o corpo de Kerollyn foi encontrado está localizado na frente de uma escola, onde há câmeras de vigilância. A polícia vem analisando as imagens, em busca de pistas. No entanto, o equipamento não teria registrado o ponto onde estava a lixeira. A câmera flagrou somente a menina passando pelo local, segurando uma vela, por volta 19h30min de quinta-feira (8).
Segundo relatos de vizinhos, na noite anterior, Kerollyn teria percorrido diversas casas pedindo uma vela ou uma lanterna, com intuito de procurar algo que havia perdido. A criança não relatou o que seria o objeto que buscava.
Medicamentos e agressões
Ainda na quarta-feira (14), a Polícia Civil divulgou novos detalhes da investigação. Entre eles, a confirmação de que a mãe administrou dois remédios em Kerollyn por volta das 21h e da meia-noite: um antipsicótico, para o qual havia prescrição médica, e uma grama do sedativo clonazepam, esse sem prescrição.
A investigação apontou também que Kerollyn sofria múltiplas violências, era negligenciada, pedia comida na vizinhança e pegava alimentos no mesmo contêiner onde foi encontrada. Além disso, indica que a menina andava mal agasalhada, tinha piolhos e sofria agressões físicas.
A polícia também informou sobre um caso em que a menina foi levada ao hospital por uma pancada na cabeça, que teria ocorrido devido a uma queda de bicicleta, mas que, na verdade, teria sido causada pela mãe com uma escumadeira de cozinha.
Nesta quinta (15), Zero Hora esteve novamente na Delegacia de Polícia de Guaíba. Responsável pela investigação do caso, a delegada Karoline Calegari não quis falar, em razão de orientação da Associação dos Delegados de Polícia do Rio Grande do Sul (Asdep) para que a categoria mantenha silêncio, como forma de pressionar o governo do Estado por reajuste salarial.
Professores ouvidos pela polícia
Kerollyn estudava na Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Rita de Cassia, e estava no 3° ano. Um relatório foi encaminhado pela instituição à Polícia Civil, com registros envolvendo a menina. No entanto, nenhuma dessas ocorrências teria sido comunicada ao Conselho Tutelar, enquanto ela estava viva.
Educadores da escola também foram ouvidos pela polícia, para apurar como era a conduta de Kerollyn. Zero Hora teve acesso ao depoimento da vice-diretora da instituição. À polícia, ela disse que "passou a observar mais de perto o comportamento da criança desde 16 de julho".
Em outro trecho, ela cita que a direção foi procurada pela mãe de um aluno, relatando que Kerollyn tinha comportamento agressivo com o garoto. No mesmo depoimento, a vice-diretora afirma que a mãe do menino dizia que "não adiantava acionar o Conselho Tutelar porque moradores do bairro já teriam acionado, mas não adiantava".
O Conselho Tutelar garante que nunca recebeu denúncias de maus-tratos sobre Kerollyn, mas que havia relatos de que a menina perambulava sozinha pela rua. Segundo uma das conselheiras responsáveis pelo caso, todas essas situações foram verificadas e nada anormal foi verificado.
Kerollyn foi transferida para a Escola Santa Rita em março do ano passado. Antes disso, foi aluna de outra instituição, a Escola Estadual de Ensino Médio (EEEM) Otero Paiva Guimarães. Nesse período, residia no bairro São Francisco. Na Escola Otero Paiva ninguém quis se manifestar sobre o caso.
Zero Hora questionou a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) se havia conhecimento sobre a situação da menina ou alguma ocorrência dentro do ambiente escolar, mas até a publicação desta reportagem, não havia recebido resposta.
Na Santa Rita de Cassia, a reportagem não foi recebida pelos educadores. A Secretaria Municipal de Educação de Guaíba também não quis se manifestar sobre o caso.
Contraponto
A Defensoria Pública do Estado informou que representou a mãe durante a audiência de custódia. Cabe à investigada definir se seguirá sendo representada pela instituição. Caso siga na defesa, a Defensoria Pública só se manifestará nos autos do processo.