Com currículo extenso, Maicon Donizete Pires dos Santos, o Red Nose, 32 anos, ocupa o pódio dos homens mais procurados do Rio Grande do Sul. Investigado por envolvimento em diferentes tipos de crimes, de homicídios a lavagem de dinheiro, ele é figura conhecida em distintos departamentos das forças de segurança do Estado. Conforme a Polícia Civil, Red seria responsável por ordenar mortes registradas, principalmente, na zona norte de Porto Alegre nos últimos meses, e por envolvimento com tráfico de drogas e lavagem de dinheiro.
Nesta quarta-feira (20), uma operação de combate a lavagem de dinheiro teve como objetivo tomar parte do patrimônio construído por Red Nose por meio de crimes e dinheiro ilícito. Conforme a polícia, ao longo dos anos, o homem investe o dinheiro sujo em empresas, abertas, normalmente, em nome de familiares e laranjas. Assim, injeta recursos, obtidos com o tráfico de drogas, em estabelecimentos que funcionam regularmente, para dar aparência lícita ao lucro.
Segundo a investigação, o grupo comandado por Red movimenta cerca de R$ 1 milhão por semana com a venda de drogas. Nesse sentido, o tráfico de drogas "é a torneira que verte dinheiro" a Red e seus comparsas, delito que "antecede a lavagem de dinheiro", de onde vem o lucro, diz a polícia.
Para a ação, o Poder Judiciário concedeu afastamento de sigilos bancário, fiscal e bursátil (referente a Bolsa de Valores) de 31 pessoas investigadas e de 13 empresas. O valor total sequestrado pela polícia será contabilizado nos próximos dias.
A ação desta manhã também sequestrou 79 veículos, que ficam impedidos de circular e de serem vendidos. Destes 79 veículos, 22 tinham mandado para apreensão, em locais na Capital e Viamão. Desses, cinco foram localizados, em Porto Alegre, e levados ao depósito da polícia. Os demais seguem com as restrições. Outros 19 mandados de busca e apreensão também foram cumpridos.
A ação, intitulada Alerta Vermelho, contou com 135 policiais civis e foi coordenada pela Delegacia de Repressão à Lavagem de Dinheiro (DCCOR), do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).
Segundo o Deic, Red Nose se encontra foragido deste outubro, por suposto envolvimento no mando de um homicídio.
De acordo com o delegado Filipe Bringhenti, que comandou a ação, o objetivo do trabalho foi evitar que o grupo criminoso siga usufruindo do dinheiro obtido com delitos praticados. Além disso, a ação também busca descapitalizar os grupos organizados, que usam os valores para se fortalecer e aparelhar, comprando armas, munições, veículos e imóveis. Bringhenti afirma que foram apreendidos aparelhos celulares de familiares de Red, o que deve ajudar a avançar na investigação:
— Obtivemos os aparelhos de pessoas ligadas a ele, que devem confirmar nossas suspeitas de que ele usava familiares para criar empresas e ocultar bens. Também conseguimos o sequestro do veículos, evitando que consigam usá-los como moeda de troca para obter dinheiro. Com esse trabalho, conseguimos evitar que, ao menos legalmente, ele consiga seguir usando esse patrimônio como um ativo para manter o esquema de tráfico de drogas e as disputas territoriais que resultam em mortes registradas especialmente na Zona Norte — explica Bringhenti.
No case deste criminoso, a operação também teve como objetivo tornar mais difícil a logística usada por ele para se manter foragido, de acordo com o delegado Cassiano Cabral, da Divisão Estadual de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (DRLD), do Deic.
— Nosso objetivo foi atacar todo o patrimônio das pessoas que ele utiliza como laranja, para secar esse dinheiro e dificultar a logística que o permite estar foragido. Não temos dúvidas de que o trabalho desta manhã o enfraqueceu. Primeiro, porque conseguimos fazer com que a fonte de recursos dele seja estancada: a partir do momento que as contas bancárias são bloqueadas, ele não consegue mais fazer movimentação de quantias. E em relação aos carros sequestrados, se forem flagrados circulando, seja pelo cercamento eletrônico ou por algum agente na rua, serão apreendidos. O grupo também não poderá mais vender nada da frota, que é um recurso muito usado na lavagem de dinheiro. É um produto que vende rápido, especialmente se você baixa um pouco o valor, e confere um dinheiro de forma ágil ao criminoso, mas agora essa não será mais opção. Em resumo, dificultamos a possibilidade de ele se mexer de um local para outro, de se manter foragido e de obter valores — pontua Cabral.
Trajetória no crime
Antes de se tornar liderança junto ao tráfico, Red era responsável por lavar dinheiro de uma facção que tem berço no bairro Bom Jesus, na Capital, de acordo com o delegado Cabral.
— Era o braço direito, quem fazia a lavagem de dinheiro para esse grupo criminoso, e atuava nesta função já há algum tempo. A nossa investigação e a operação desta quarta servem para que possamos sufocá-lo financeiramente, e diminuir a chance de ele seguir foragido — pontua Cabral.
"Criminoso articulado"
A atuação de Red é definida como a de um criminoso "articulado", segundo a DRLD. Segundo a delegacia, a investigação verificou que o homem criou um esquema em que praticamente todos seus familiares, incluindo ex-companheiras, registraram propriedade em pelo menos uma pessoa jurídica.
É nessas empresas que ele injeta o dinheiro, "para mesclar e dissimular capital, permitindo a abertura de contas bancárias para movimentar dinheiro proveniente do tráfico de drogas", segundo a polícia. Assim, as "receitas criminosas" são disfarçadas de patrimônio.
— Verificamos que ele criou um sistema familiar, envolveu todas as pessoas ao redor dele, mãe, sogra, tios, irmãos, ex-companheiras, enteados. Fez com que eles constituíssem empresas para que, por meio de contas bancárias, houvesse movimentação de dinheiro e fluxo de capital — explica o delegado Cabral.
"Fiquei milionário"
Ao longo da investigação, policiais verificaram uma mensagem atribuída a Red Nose, em que ele fala dos lucros obtidos com o tráfico. O conteúdo foi encontrado em um celular apreendido durante revista geral realizada na penitenciária de Sapucaia do Sul, neste ano.
"A caminhada agora é minha, cupincha. O bagulho é que eu fiquei milionário. Os cara me levaram no bico ali, sempre querendo fazer queda de braço aqui com o cara, aquela panelinha, não tem mais nada, entendeu?", diz a transcrição da mensagem, feita pela Polícia Civil.
Diretora do Deic, a delegada Vanessa Pitrez ressalta que, ao longo do ano, o departamento focou esforços para identificar e responsabilizar criminosos ligados a lavagem de dinheiro, envolvidos na movimentação de grandes quantias. O objetivo é enfraquecer os grupos.
Segundo ela, a operação desta quarta é a sétima grande ação da Delegacia de Repressão à Lavagem de Dinheiro neste ano. No total, as ofensivas indisponibilizaram bens e valores que somam mais de R$ 119 milhões, quantia que estava na mão de organizações criminosas investigadas.
— Neste ano, o Deic teve como uma de suas prioridades conduzir grandes investigações sobre lavagem de dinheiro, como forma de descapitalizar e asfixiar financeiramente as organizações criminosas atuantes do Estado. Tivemos um resultado bastante significativo na desestruturação financeira destes grupos, o que reduz sua capacidade criminosa. No caso do alvo de hoje, acreditamos que este baque financeiro irá dificultar sua ocultação — pontua a diretora.
O secretário-adjunto da pasta da Segurança Pública do Estado, coronel Mário Ikeda, comemorou as "grandes operações" de combate ao crime de lavagem de dinheiro realizadas ao longo do ano:
— O resultado desta operação realça a força e comprometimento das forças policiais que seguem trabalhando diuturnamente, o ano inteiro, para fortalecer o combate à criminalidade em todo Estado. A realização de grandes operações com enfoque no combate o este tipo de crime é fundamental para descapitalizar e asfixiar o crime organizado — diz Ikeda.
Investigado deu "golpe de Estado" em facção
Conforme o Deic, Red Nose integrava a facção nascida no bairro Bom Jesus, na Capital, e atuava junto à lavagem de dinheiro para o grupo. Quando o homem apontado como líder dessa organização, José Dalvani Nunes Rodrigues, vulgo Minhoca, foi transferido para uma prisão federal, fora do RS, Red o sucedeu e assumiu a liderança junto ao tráfico de drogas, especialmente no bairro Mario Quintana, segundo a investigação.
A polícia afirma que Red, neste período, arquitetou um plano para destituir o comparsa.
— Quando assumiu essa liderança, começou a montar um plano para crescer dentro do grupo, isolando o Minhoca. Em determinado momento, no entanto, ele se aliou a outras facções e deixou o grupo nascido no Bom Jesus. Por ter feito essa troca, as duas facções passaram a disputar pontos de tráfico e a ordenar mortes, entre agosto e setembro — pontua o delegado Cabral.
Os homicídios foram registrados principalmente na Zona Norte, onde atuam os grupos, entre os bairros Mario Quintana e Costa e Silva e na região do Timbaúva.
A investigação apontou que pelo menos sete homicídios registrados naquele período tiveram ligação direta com o conflito na Zona Norte, área que atualmente registra o maior índice de mortes em Porto Alegre. Para frear o confronto, a polícia desencadeou a operação Golpe de Estado, em que Red era alvo principal. O nome da ação é uma referência ao rompimento dele com comparsas. O trabalho envolveu mais de 200 policiais e resultou na captura de 14 envolvidos nos homicídios. Red, no entanto, não foi localizado.