Uma investigação da Polícia Civil busca apontar o impacto do repasse de informações por parte de uma estagiária do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ) – atualmente removida do cargo – a traficantes em Porto Alegre. A ex-estagiária de 26 anos foi presa de forma preventiva há uma semana, durante a Operação Heres, da Polícia Civil. Além dela, cinco suspeitos de integrarem uma facção criminosa foram detidos. Outra mulher, apontada como uma das lideranças do grupo, está foragida após escapar da polícia no Rio de Janeiro.
A investigada atuou como estagiária do TJ por cerca de um ano e não tinha antecedentes criminais. O nome dela não foi divulgado pela Polícia Civil. A suspeita é de que a mulher tenha sido paga por uma facção – que explora o tráfico no Condomínio Princesa Isabel, no bairro Azenha – para fazer consultas em processos e repassar informações privilegiadas aos criminosos. O contato entre a então estagiária e os investigados teria acontecido numa casa de religião, já que eles frequentavam o mesmo local.
Após ser presa na semana passada, a mulher depôs e confessou o crime aos policiais. A Polícia Civil, no entanto, não divulga detalhes sobre o que foi relatado pela investigada. Segundo a delegada Laura Lopes, da 19ª Delegacia de Polícia, a ex-estagiária vem sofrendo ameaças por parte da facção criminosa.
— Já vinha sendo (ameaçada), mas agora piorou. Com as prisões dos gerentes, as ameaças se intensificaram — diz a delegada.
A suspeita é de que fossem pagos R$ 200 a cada consulta ao sistema. Os acessos teriam ocorrido de forma frequente, conforme o que foi apurado até o momento, mas ainda não se sabe quanto a investigada teria recebido com isso. Enquanto estagiária, ela conseguia consultar, por exemplo, prisões cautelares que estavam em sigilo. Isso poderia permitir frustrar, inclusive, ofensivas policiais.
— Ela tinha amplo acesso, a processos sigilosos — explica a delegada.
Neste momento, os policiais analisam provas coletadas durante a operação. Uma auditoria realizada pelo TJ deverá indicar quais consultas foram realizadas pela então estagiária nesse período. Somente depois disso, a polícia conseguirá apontar o impacto do repasse das informações. A mulher é investigada por associação ao tráfico de drogas e quebra do sigilo funcional. Caso seja confirmado que ela recebia pagamentos para fazer as consultas, deverá responder também por corrupção passiva. Os suspeitos de terem sido beneficiados com o vazamento de informações podem responder por corrupção ativa.
Fuga no Rio de Janeiro
Apontada como uma das lideranças do tráfico de drogas no Condomínio Princesa Isabel, em Porto Alegre, outra mulher também foi alvo de mandado de prisão na semana passada. Segundo a Polícia Civil gaúcha, agentes do Rio de Janeiro tentaram prender a investigada, mas ela conseguiu escapar, após arremessar o veículo contra os policiais, que haviam descido da viatura para tentar abordá-la. GZH apurou que se trata de Jurema Cristina Marques Perez, a Tina, que continua foragida.
Conforme a investigação, a mulher vive num condomínio de alto padrão na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde também é proprietária de empresas. Mesmo distante, ela ainda seria responsável por coordenar o tráfico no condomínio em Porto Alegre, por meio de familiares. Uma filha dela foi presa na mesma operação da semana passada, num condomínio de alto padrão em Gravataí, na Região Metropolitana.
O genro dela também foi preso no aeroporto de Campinas, em São Paulo, enquanto se preparava para embarcar para Paris, na França. Segundo a polícia, o homem residia com a mulher em Gravataí, na Região Metropolitana. Ele e a companheira são apontados como gerentes do tráfico. Seis pessoas foram presas durante a operação no dia 14 de novembro. Eles são investigados por tráfico de drogas e associação criminosa.
— Todos tinham alguma espécie de gerência no tráfico — diz a delegada.
A mulher foragida é ex-companheira de Renato Fao Gambini, encontrado morto com sinais de infarto na Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan) em novembro do ano passado, onde cumpria pena. O preso era considerado sucessor do traficante Alexandre Goulart Madeira, o Xandi, executado a tiros de fuzil em 2015, enquanto fazia churrasco em uma casa alugada a uma quadra da orla de Tramandaí, no Litoral Norte. Após a morte do companheiro, conforme a investigação, ela teria se tornado uma das lideranças do tráfico no residencial.
Contraponto
Após a operação, o TJ se manifestou pro meio de nota. Nesta terça-feira, GZH entrou em contato com a instituição que manteve o posicionamento. Confira:
"O Tribunal de Justiça do RS não se manifestará a respeito da prisão. No entanto, salientamos que o Judiciário tem colaborado com as investigações. Demais informações a respeito do caso devem ser direcionadas à polícia, responsável pela apuração do caso".
GZH busca contato com a defesa de Jurema Cristina Marques Perez. A mulher continuava foragida até a tarde desta terça-feira (21).