Após três dias de júri, chegou ao fim na madrugada deste sábado (25), no Fórum de Charqueadas, o julgamento de três réus acusados pela morte de Ronei Wilson Jurkfitz Faleiro Júnior, morto em 2015, aos 17 anos. O Tribunal do Júri votou pela condenação dos três. A sessão foi encerrada às 00h56min.
Peterson Patric Silveira Oliveira foi condenado a 35 anos e quatro meses de prisão. Vinicius Adonai Carvalho da Silva foi condenado a 38 anos e 10 meses e 20 dias. Já Leonardo Macedo da Cunha foi condenado 35 anos e quatro meses de reclusão.
Os acusados foram condenados pelos crimes de homicídio qualificado, três tentativas de homicídio qualificado, associação criminosa e corrupção de menores.
O juiz Jonathan Cassou dos Santos estendeu os efeitos do habeas corpus preventivo concedido aos réus Peterson Patric Silveira Oliveira e Leonardo Macedo da Cunha ao réu Vinicius Adonai Carvalho da Silva. Por essa razão, nenhum dos condenados foi preso por esse crime ao final do julgamento - Vinicius, porém, segue preso por envolvimento em outro caso.
Por volta de 20h30min, os sete jurados começaram a responder um questionário com mais de cem quesitos, divididos em cinco séries para cada um dos três réus, na sala secreta. A sentença começou a ser lida pelo juiz Jonathan Cassou dos Santos por volta de 00h20min.
Este é o primeiro de três júris previstos para ocorrer ainda neste ano. Os julgamentos de outros seis acusados estão previstos para os dias 4 e 7 de julho.
Ronei foi agredido, inclusive com garrafadas, após a saída de uma festa em Charqueadas, em 1º de agosto de 2015, e morreu horas depois. O adolescente saía da festa que ajudou a organizar para arrecadar fundos para a formatura no Ensino Médio. Ele estava junto da colega de escola, Francielle Wienke e do namorado dela na época, Richard Saraiva de Almeida.
Os dois também foram agredidos e teriam sido vítimas de tentativa de homicídio, conforme o Ministério Público. O pai do jovem, Ronei Wilson Jurkfitz Faleiro, também sofreu agressões. Ele foi ao local buscar os adolescentes após a festa.
Habeas Corpus
Dois réus, Leonardo e Peterson, conseguiram um habeas corpus preventivo durante o julgamento desta sexta-feira (24). As duas decisões foram concedidas pelo desembargador Jayme Weingartner Neto, do Tribunal de Justiça do RS. A medida garante aos réus que, caso sejam condenados pelo Tribunal do Júri, com pena superior a 15 anos de prisão, eles não serão presos ao final do julgamento.
De acordo com o desembargador, configura constrangimento ilegal ao direito de locomoção do paciente a execução provisória apenas com base no quantum de pena aplicado, "razão pela qual defiro em parte a liminar, para que o Juiz Presidente se abstenha de decretar a prisão com base neste fundamento, ressalvada a possibilidade de decretação de segregação cautelar, a partir de fundamentação concreta”.
O promotor Eugênio Paes Amorim, que atuou na acusação, afirma que será feita avaliação junto à Procuradoria de Recursos do Ministério Público, grupo que se reporta aos tribunais superiores, sobre a conveniência de ingressar com apelação solicitando a cassação do habeas corpus em favor dos condenados e posterior prisão.
Amorim entende que a prisão deve ser executada porque há previsão legal para isso quando o júri se encerra com condenação superior a 15 anos. Caso o MP decida entrar com apelação, ele diz confiar em uma reversão de resultado. No júri da boate Kiss, em dezembro de 2021, os quatro réus não foram presos imediatamente por conta de um habeas corpus, o qual foi derrubado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux.
— Não concordamos que se utilize a via do habeas corpus para deixar de cumprir o que está na lei. Caso nossas instâncias superiores decidam buscar uma contra-liminar nos tribunais superiores, sou otimista exatamente pelo precedente da Kiss — avalia Amorim.
O promotor diz que, sem a cassação do habeas corpus, os três condenados poderão esgotar os recursos em liberdade, chegando ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao STF.
Pai prestou depoimento
Em um depoimento bastante emocionado, com pausas de choro, o pai da vítima, Ronei Wilson Jurkfitz Faleiro, contou como foi o dia do crime. O engenheiro também consta no processo como uma das vítimas de tentativa de homicídio. Ele lembrou que foi ao local a fim de dar carona para dois amigos do filho, Ronei Júnior, quando os agressores partiram para cima deles, vindos de trás. Disse que seu primeiro movimento foi tentar sair de carro, mas as portas eram forçadas e garrafas eram lançadas. Ele contou que conseguiu descer do veículo, mas não interromper as agressões, que seguiram até que ele conseguiu partir do local com o filho e os dois amigos direto ao hospital.
Emocionado, Ronei Faleiro lembrou das últimas palavras do filho, que teria perguntado se o pai estava machucado.
— Meu filho foi julgado, sentenciado e executado na calçada — disse, aos prantos.
Para o Ministério Público, o crime foi premeditado. Um vídeo de uma câmera de segurança que registrou a briga que resultou na morte foi mostrado pelos promotores. As imagens mostram que o fato foi rápido, durando 2min30seg. Pessoas aparecem cercando o carro onde as vítimas entraram, batendo no veículo e nas vítimas e jogando garrafas.
Conforme a denúncia, o confronto teve origem em uma rixa entre grupos de Charqueadas e São Jerônimo - cidade onde morava Richard na oportunidade.
Depoimentos
Ao longo dos três dias do julgamento, foram ouvidas testemunhas do caso, de acusação e de defesa, além dos três réus. O único dos acusados que admitiu ter atingido Ronei foi Peterson Patric Silveira Oliveira, 26 anos. O réu afirmou em depoimento ter dado garrafadas na cabeça do jovem na madrugada de 1º de agosto de 2015.
Em um interrogatório que durou cerca de 45 minutos, ele descreveu como foram as agressões contra o adolescente. Peterson contou que não chegou a entrar na festa onde estavam Ronei Junior e os colegas de escola, mas disse que se envolveu na briga em razão de um amigo.
— Quando atravessei a rua, já estava a briga acontecendo. A minha participação foi rápida e infelizmente decisiva — relatou.
Peterson disse que viu Ronei Júnior dentro do veículo, que estava com a porta aberta, e que avançou para cima dele com uma garrafa:
— Tinha duas ou três brigas ocorrendo ao mesmo tempo. Dei duas ou três garrafadas nele. Vi que a briga estava tomando proporção descomunal. Saí correndo e joguei a garrafa.
— Onde o senhor o golpeou? — questionou o magistrado.
— Na cabeça. Umas duas ou três vezes. Acho que foram três — respondeu o réu.
Nesse momento, Tatiane Faleiro, 46 anos, mãe de Ronei, precisou deixar o local. Do lado de fora, ela precisou receber atendimento médico.
Questionado mais de uma vez se já tinha algum desentendimento anterior com as vítimas, Peterson garantiu que não, e afirmou que só se envolveu na briga para defender um amigo. No interrogatório, admitiu que estava bêbado na madrugada do crime e que nem sequer chegou a ingressar no local da festa. Relatou que antes desse caso já tinha se envolvido em outras brigas na cidade. Ao fim do interrogatório, pediu perdão aos familiares da vítima.
— Sei que não mereço e nunca vou... Se eu pudesse ter perdão da família. Me envergonho do meu ato. Infelizmente, eu estraguei a vida de uma família. É difícil isso. Tirar o bem mais precioso. Eu fui ter noção do que eu fiz dentro da cadeia — disse o réu, que permaneceu seis anos e 10 meses preso até receber liberdade em abril deste ano.
Logo depois dele, foi ouvido o réu Vinicius Adonai Carvalho da Silva. Num interrogatório de menos de 30 minutos, o réu negou ter se envolvido na briga e disse que não agrediu ninguém em nenhum momento. Admitiu somente ter ajudado outro réu, Leonardo Macedo da Cunha, a se erguer do chão e também, assim como os outros acusados, contou que estava alcoolizado.
— Em ninguém, nenhum soco — disse quando foi questionado se agrediu alguém.
Mais cedo, foi ouvido Leonardo Macedo da Cunha, também réu no caso, que admitiu ter dado um chute no pai de Ronei Júnior, o engenheiro Ronei Wilson Jurkfitz Faleiro, 55 anos, que foi até o local buscar o filho de carro. O réu negou que tenha agredido outras pessoas.
Leonardo alegou que entrou na briga porque alguém teria dito que o amigo Jhonata Paulino da Silva Hammes, também acusado, havia se envolvido em uma confusão. Repetidas vezes, o réu afirmou que o pai de Ronei Júnior estava com uma garrafa na mão.
— O Jonatha está caído no chão, o pai está com uma garrafa na mão e vai em direção ao Jonatha. Eu dei o chute nele. Ele estava de frente. Eu caí no chão. Eu estava muito bêbado –narrou.
Inicialmente, o Ministério Público apontou sete na acusação: a quatro deles foi aplicada, em setembro de 2015, medida socioeducativa de internação por três anos, prazo máximo estabelecido no Estatuto da Criança e do Adolescente. Os outros três foram absolvidos.
No total, há nove réus, três deles julgados nesta semana. Os demais júris estão marcados para 4 de julho (réus Alisson Barbosa Cavalheiro, Geovani Silva de Souza e Volnei Pereira de Araújo) e 11 de julho (réus Matheus Simão Alves, Cristian Silveira Sampaio e Jhonata Paulino da Silva Hammes), ambos também com previsão de duração de três dias. Há, ainda, um décimo réu, que foi acusado posteriormente e responde por homicídio em processo separado.
Repercussões
O promotor Eugênio Paes Amorim, que atuou em conjunto com outros três membros do Ministério Público, considerou o resultado do júri positivo, com a condenação dos três réus com penas entre 35 e 38 anos de prisão.
— Todas as respostas dos jurados aos quesitos foram em favor da acusação, os réus foram condenados por todos os crimes. O júri foi nota 10 — avalia o promotor, experiente nesse modelo de julgamento.
A Defensoria Pública do Estado, que atuou na defesa de Leonardo Macedo da Cunha, comentou o resultado em nota: "Foram três dias muito exaustivos, onde apresentamos aos jurados, respeitando, obviamente, a dor dos familiares, a comoção da comunidade, uma defesa técnica, qualificada, com a convicção de que o Ronei Jr morreu porque não foi tratado adequadamente quando chegou no hospital aqui. Isso é muito triste! Nunca ninguém vai tirar a dor da mãe, do pai, dos familiares. Nesses casos, o júri é soberano. Ouve todos os lados, todas as versões, analisa e decide. Nossa sensação é de dever cumprido. A defesa foi feita da melhor forma possível visando um processo justo e leal. A partir de agora, vamos recorrer no que julgarmos necessário, nos autos do processo", diz o comunicado, assinado pela defensora pública Tatiana Boeira.
Os advogados de Peterson Patric Silveira Oliveira comentaram o resultado em nota: "A defesa respeita a decisão tomada pelo conselho de sentença formado para este júri em Charqueadas. Analisaremos a sentença e ingressaremos com as medidas cabíveis".
A defesa de Vinicius Adonai Carvalho da Silva não foi localizada neste sábado (25) para avaliar o desfecho.