Cancelado após 11 minutos de duração, o julgamento de Alexandra Salete Dougokenski, 34 anos, pela morte do filho caçula Rafael Winques, aos 11 anos, deixou uma série de dúvidas sobre as consequências do abandono do júri por parte dos advogados de defesa.
Os defensores deixaram o plenário após a juíza Marilene Campagnolo ter negado a realização de uma perícia em um áudio atribuído ao menino. Representante de Alexandra, o advogado Jean Severo afirma que vai recorrer ao Tribunal de Justiça na próxima semana para garantir que o material seja analisado.
Uma das principais dúvidas é para quando será remarcado o julgamento em Planalto, no norte do Estado, onde o crime foi cometido. A acusação entende que a juíza já poderia determinar uma nova data, mas Severo confirma que deverá entrar com um recurso para forçar a perícia no áudio.
— Vamos entrar com um recurso junto ao Tribunal de Justiça na próxima semana — diz o defensor.
O advogado diz ainda não se arrepender de ter deixado o plenário e provocado o cancelamento da sessão — o que, segundo a Justiça, teria provocado a perda de cerca de R$ 160 mil em recursos públicos. A Justiça poderá impor uma multa à banca de defesa, e a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) analisa um pedido de ressarcimento dos gastos, medida ainda em análise.
— Fizemos o que tínhamos de fazer. É só realizar uma perícia simples. Não sei por que o Ministério Público não queria. Tinha de ter feito aquilo. Não me arrependo — garante Severo.
O impasse ocorreu porque a defesa de Alexandra apresentou um áudio, extraído do celular do pai de Rafael, atribuído ao menino com data de 15 de maio de 2020. Como, segundo as investigações, ele teria morrido na véspera, os advogados de Alexandra queriam que o material fosse analisado. A acusação argumentou que o material estava anexado ao processo desde o início e o pedido era uma estratégia para postergar o julgamento.
— Em todos os meus anos de trabalho, nunca vi algo parecido. Da nossa parte, entendemos que a juíza poderia marcar uma nova data a qualquer momento — afirma um dos advogados de acusação, Daniel Tonetto.
A seguir, tire dúvidas sobre os desdobramentos dessa reviravolta.
Como fica o Caso Rafael
Após o cancelamento da sessão de julgamento na segunda-feira (21), qual o próximo passo do processo no Judiciário?
Conforme informações do Tribunal de Justiça, a primeira medida, agora, será a juíza intimar a ré, Alexandra Salete Dougokenski, e seus defensores para confirmar se a atual banca de advogados a seguirá representando ou se serão constituídos novos advogados de defesa. Até o momento, o advogado Jean Severo sustenta que segue no caso e vai entrar com recurso junto ao Tribunal de Justiça na próxima semana solicitando a perícia do áudio atribuído a Rafael.
Quando e como será o novo julgamento?
Uma nova data ainda será marcada. Se os defensores não deixarem o caso (hipótese negada até o momento) ou a ré decidir ser representada por outras pessoas, a mesma banca de defesa poderá atuar – ainda que esteja sujeita a sanções como cobrança de multa por ter deixado o júri (leia mais em uma questão específica sobre isso mais abaixo). Há possibilidade de os jurados serem substituídos, em razão de uma eventual influência provocada pela suspensão do julgamento.
Como fica a situação envolvendo a perícia solicitada pela defesa, motivo do abandono do plenário ao ser negada?
A acusação entende que uma nova data já poderia ser marcada para o julgamento. Mas, se a defesa recorrer ao Tribunal de Justiça, o que está previsto para ocorrer na próxima semana, e for eventualmente determinada a realização da perícia no áudio, o que demanda tempo, o júri poderia ser adiado por meses.
A juíza do caso, Marilene Campagna, pode ser substituída?
Em razão do cancelamento do julgamento, não. Somente se ela mudar de comarca, por exemplo, ou se houvesse um desaforamento do processo – quando é transferido de uma circunscrição judiciária para outra por alguma razão jurídica. Não há previsão de que isso ocorra, até o momento.
Pode haver cobrança dos cerca de R$ 160 mil que foram gastos em dinheiro público para organizar o julgamento que não ocorreu? De quem esse valor seria cobrado?
É possível. Conforme o TJ, pode ser determinado o ressarcimento dos gastos aos cofres públicos. A assessoria de comunicação do tribunal informou que a decisão sobre de quem esses recursos seriam cobrados caberia à Procuradoria-Geral do Estado (PGE). Procurada por GZH, a PGE comunicou por meio de nota que “analisa, a pedido do TJ, as medidas cabíveis para a responsabilização daqueles que deram causa ao cancelamento do júri, diante dos gastos públicos que foram realizados”.
Além de eventual ressarcimento, pode haver imposição de multa pelo cancelamento do julgamento?
De acordo com o TJ, sim. A assessoria de comunicação do tribunal informa que a juíza responsável pelo processo poderia determinar a aplicação de uma multa à banca de defesa por ter abandonado o júri. O valor seria definido pela juíza.
O que diz o advogado de defesa, Jean Severo, sobre as possíveis sanções por ter deixado o plenário?
Em contato com GZH, Severo afirmou que “a juíza pode aplicar (cobrança), mas nós vamos recorrer se isso acontecer. Mas eu espero que não. É uma juíza muito sensata, justa, humana. E nós fizemos o que tínhamos de fazer. Não havia outra coisa a fazer. É só realizar uma perícia simples. Não sei por que o Ministério Público não queria. Tinha de ter feito aquilo (deixar o plenário), não me arrependo”.
Há alguma forma de impedir que a defesa deixe novamente o júri e volte a cancelar o julgamento?
Na avaliação do professor de Direito Penal e advogado da acusação no caso, Daniel Tonetto, embora extremamente rara, uma possibilidade seria deixar um advogado dativo (nomeado pela Justiça) com prévio conhecimento sobre o caso de prontidão, caso necessário, em um próximo julgamento. Na ausência dos defensores titulares, sejam quem forem, os substitutos poderiam assumir os trabalhos imediatamente.