Bernardo Boldrini e Rafael Winques aparecem sorridentes, juntos, num retrato cuidadosamente colocado num jazigo no cemitério de Planalto, cidade do extremo norte do Rio Grande do Sul. É uma homenagem silenciosa aos dois meninos, que não se conheceram em vida, mas foram submetidos a um martírio que em tudo se assemelha.
Os dois tinham a mesma idade, foram assassinados a poucos quilômetros de distância um do outro e por quem deveria cuidar deles. Eu e os colegas Eduardo Matos, Letícia Mendes e Lauro Alves visitamos a tumba de Rafael, na qual alguém fez uma montagem da foto do menino junto com a de Bernardo. Comentamos ali, no cemitério, as impressionantes semelhanças entre os casos:
- Bernardo e Rafael foram mortos aos 11 anos. O primeiro, pela madrasta. O segundo, pela própria mãe, Alexandra (conforme a investigação e a confissão dela mesma, que inclusive levou os policiais até o local onde escondeu o corpo do filho). Depois ela voltou atrás e disse que o autor do assassinato é o pai do menino.
- As acusadas pelos crimes alegaram a mesma motivação para matar os meninos: que eles eram muito agitados e rebeldes.
- As duas crianças foram dopadas durante o assassinato. Os dois tiveram as cabeças embaladas em sacos, após a morte.
- Os dois assassinatos aconteceram em locais próximos. Apesar de morar em Três Passos, no noroeste do Estado, Bernardo foi levado de carro até a estrada que liga Frederico Westphalen a Planalto. Foi assassinado lá. À beira da rodovia há uma placa, onde se lê: “Local onde foi encontrado o corpo do anjo Bernardo”. Já Rafael foi morto na cidade de Planalto, na própria casa. Menos de 30 quilômetros separam os locais da morte dos dois meninos.
- Nos dois casos, o advogado Jean Severo atuou na defesa de acusadas. No Caso Bernardo, defendeu Edelvânia Wirganovicz, amiga da madrasta do menino, que ajudou a dopá-lo e cavou a cova onde ele foi enterrado, ainda agonizante. No Caso Rafael, Severo defende a mãe do garoto, Alexandra Dougokenski.
No Caso Bernardo, Severo foi derrotado. Edelvânia foi sentenciada a 22 anos e 10 meses de prisão. No Caso Rafael, Severo quer evitar condenação. Contrapõe a maioria dos indícios e defende, agora, que a ré não cometeu o crime (mesmo após ela confessar duas vezes a autoria). Num gesto extremo, o advogado abandonou o júri, provocando o adiamento da definição do caso e frustrando familiares da vítima, acusadores, integrantes do Judiciário e parte da comunidade, que se preparou para o julgamento.
Bernardo teve justiça, mesmo que tardia. Rafael ainda aguarda. Fosse místico, apostaria que os dois se comunicam. Talvez essa seja a intenção de quem colou as fotos deles, irmanados, naquela tumba no norte do Rio Grande do Sul.