Enquanto o movimento era intenso, com as pessoas homenageando a memória de familiares mortos, lá no fundo do Cemitério Municipal de Gravataí, no bairro Rincão da Madalena, Juliana Santos, 30 anos, desesperava-se. Cercada por pelo menos 50 pessoas, ela estava diante da cova, ainda aberta, onde o pequeno caixão era colocado e um pastor dirigia palavras de consolo aos parentes, no começo da tarde desta quinta-feira (02). O menino Vilivaldo Ezequiel Rodrigues Machado, 11 anos, repetiu, de maneira assustadoramente precoce, o que virou triste rotina da cidade. Foi mais uma vítima de morte violenta. A suspeita da polícia é de que engrosse a estatística de assassinatos causados por grupos criminosos em conflito na cidade.
Ele havia saído de casa, no próprio bairro Rincão da Madalena, na última sexta-feira, ainda durante o dia. Disse à mãe que dormiria na casa de um amigo, e Juliana não se preocupou. Era comum que o filho circulasse pelas ruas da região e até dormisse na casa deste amigo. Voltava para casa e seguia pelas redondezas, conversando com um ou outro. Mas desta vez, o menino não voltou o final de semana inteiro, e a família ainda passou a segunda-feira sem notícias de Vilivaldo. Só na terça, depois de percorrer toda a região e perguntar aos amigos do filho sem uma resposta convincente, a mãe registrou a ocorrência do desaparecimento na delegacia de Polícia Civil. E aí o fato se esclareceu. Primeiro, por uma foto postada no Facebook, com o corpo de um menino baleado.
Era Vilivaldo o menino encontrado morto com tiros na cabeça e no peito, às 22h30min da última sexta, em um matagal da Rua Lino Estácio dos Santos, no bairro onde a família morava, a poucos metros do cemitério. Mesmo morando no Rincão da Madalena a não mais do que 500 metros de onde o corpo foi encontrado, a família não soube o que ocorrera na sexta. Na quarta, o Departamento Medico Legal (DML) confirmou a identificação da criança. As circunstâncias do crime, de acordo com o delegado Felipe Borba, da Delegacia de Homicídios de Gravataí, ainda são obscuras.
— Estamos iniciando a investigação. Em um primeiro momento, estamos apurando os últimos passos do menino. Queremos encontrar testemunhas que tenham presenciado os momentos da vítima na sexta —diz o delegado.
Para a família, não há explicação para o assassinato, exceto o fato da violência que virou rotina no bairro. O local, segundo a polícia, é um dos principais focos de confrontos na guerra aberta entre facções rivais que cruza Gravataí. Dois grupos disputam o controle do tráfico naquela área e, conforme a investigação policial, partiram dali os atiradores que fizeram o atentado contra uma festa no bairro Morada do Vale II há duas semanas, deixando dois mortos e 33 feridos. Desde então, há o temor de que aconteça um revide.
— O Ezequiel nunca fez mal a ninguém, conhecia todo mundo. Acredito que era um menino de espírito livre, por isso gostava tanto da rua e andava com todos por aqui — conta a tia, Patrícia Santos, 31 anos.
Fazia alguns meses que ele havia se mudado para o Rincão da Madalena com a mãe. Era o filho mais velho de Juliana, irmão de uma menina de cinco anos. A mãe está grávida de gêmeos. Diante do caixão, amparada, ela ainda teve forças de gritar:
— Eu quero justiça para o meu menino. Ele nunca fez nada de errado, não merecia isso!
Com esse crime, Gravataí chega a 147 assassinatos em 2017. À Juliana restará, toda a vez que sair de casa, saber que na tarde deste 2 de novembro, sepultou o filho ali, do outro lado da rua onde mora.