Fabio Lavinsky (*) e Jacó Lavinsky (**)
O glaucoma é uma neuropatia óptica crônica que gera danos típicos na estrutura do nervo óptico com repercussão no campo visual, gerando perda progressiva da visão. A pressão intraocular é um fator de risco importante para o desenvolvimento e o avanço do glaucoma. Também é o principal fator modificável com o tratamento.
O impacto desta doença na população é profundo. O glaucoma é a primeira causa de cegueira irreversível no mundo e, entre as doenças oculares curáveis, é a segunda causa de cegueira.
Estima-se que, mundialmente, mais de 111 milhões de pessoas serão portadoras de glaucoma primário de ângulo aberto (GPAA) em 2040. O continente africano apresenta a maior prevalência de GPAA (4,0%), já a Ásia tem a maior prevalência em glaucoma primário de ângulo fechado (1,09%).
Quais são os tipos de glaucoma?
O glaucoma pode ser classificado de acordo com o ângulo: aberto e fechado. O ângulo (seio camerular) é uma estrutura onde ocorre a maior parte do escoamento do humor aquoso (fluido transparente) do olho para a manutenção de uma pressão intraocular normal.
O glaucoma pode ser congênito ou adquirido e ainda é dividido em primário e secundário, quando há alguma causa para o aumento da pressão intraocular, como inflamações, trauma e retinopatia diabética avançada. Existe ainda a condição de hipertensão ocular, que ocorre quando a pressão intraocular é alta, porém ainda não há dano por glaucoma.
Quais são as consequências?
O glaucoma pode ter um impacto muito negativo na qualidade de vida. Estudos tem mostrado maior prevalência de ansiedade e/ou depressão em pessoas com glaucoma. O dano por glaucoma pode gerar diminuição na performance de atividades corriqueiras como leitura, locomoção e direção de veículos. O principal objetivo da detecção e do tratamento do glaucoma é evitar a sua progressão para que se consiga manter a função visual e a qualidade de vida dos pacientes sem impacto nas suas atividades cotidianas e afastando-os da perda visual profunda e da cegueira.
Quais são os principais fatores de risco?
Além da pressão intraocular, a idade é um dos principais fatores de risco para GPAA. História familiar positiva eleva o risco de desenvolver glaucoma. Em indivíduos afrodescendentes, a prevalência de GPAA é maior, e o curso clínico tende a ser mais grave. No entanto, um dos principais fatores que contribuem para a cegueira do glaucoma é o desconhecimento da presença da doença, pois esta pode se dar de forma silenciosa, e apenas o exame oftalmológico será capaz de detectar.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico precoce do glaucoma é fundamental e é realizado pelo oftalmologista, que utiliza propedêutica de consultório e exames complementares oftalmológicos com o objetivo de detectar e monitorar a progressão da doença. Alguns dos principais exames realizados são:
Tonometria: a aferição da pressão intraocular, que é o principal fator de risco modificável do GPAA;
Paquimetria: medida da espessura da córnea;
Gonioscopia: avaliação do seio camerular (ângulo), vendo se ele encontra-se aberto ou fechado e suas características adicionais;
Exame do fundo de olho e retinografia: avaliação e documentação do nervo óptico e das estruturas adjacentes;
Tomografia de coerência óptica (OCT): exame que documenta de forma quantitativa a espessura da camada de fibras nervosas da retina, da camada de células ganglionares e da camada plexiforme interna e parâmetros de nervo óptico que podem estar alterados em decorrência do glaucoma. Estes parâmetros podem ser acompanhados com o tempo para detectar e monitorar a progressão. Além disso, pode se avaliar as estruturas do segmento anterior do olho com o OCT;
Avaliação funcional por campimetria: detecta áreas de diminuição da função visual de forma automatizada e quantitativa. Também é útil para detecção e monitoramento da progressão.
É muito importante correlacionar o dano da estrutura detectado com o OCT e a retinografia com o dano funcional visto no campo visual. Essa miríade de parâmetros quantitativos obtidos com exames de alta tecnologia está permitindo o estudo de aplicações muito promissoras da inteligência artificial na área do glaucoma.
Quais são os tratamentos?
O tratamento do GPAA se dá pela redução da pressão intraocular, que reduz o risco de progressão adicional. A maioria dos pacientes é tratada com terapia tópica (colírios) e, caso o tratamento clínico não atinja o sucesso necessário, deve ser realizado tratamento cirúrgico e a laser. Atualmente, a trabeculoplastia seletiva a laser (SLT) pode ser considerada como tratamento inicial para hipertensão ocular e GPAA leve a moderado. Existem outras estratégias terapêuticas que eventualmente podem ser empregadas para as outras formas de glaucoma distintas do GPAA.
(*) Professor de Oftalmologia da Unisinos e diretor da Unidade Diagnóstica da Clínica Lavinsky-Oftalmologia.
(**) Professor titular de Oftalmologia da UFRGS e fundador da Clínica Lavinsky-Oftalmologia.
Fonte: 4º Consenso de Glaucoma Primário de Ângulo de Aberto da Sociedade Brasileira de Glaucoma (edição de Jair Giampani Jr., 2022).
Parceria com a Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina
Este artigo faz parte da parceria firmada entre ZH e a Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina (ASRM). A estreia foi em março, com a reportagem “Câncer: do diagnóstico ao tratamento”. Em abril, publicamos artigo sobre depressão e bipolaridade. Uma vez por mês, até dezembro, o caderno vai publicar conteúdos produzidos (ou feitos em colaboração) por médicos integrantes da entidade, que completou 30 anos em 2020 e atualmente conta com cerca de 90 membros e é presidida pelo otorrinolaringologista Luiz Lavinsky. De diversas especialidades - oncologia, psiquiatria, oftalmologia, endocrinologia etc -, esses profissionais fazem parte do Programa Novos Talentos da ASRM, que tem coordenação de Rogério Sarmento Leite e no qual são acompanhados por um tutor com larga experiência na área.