Existem episódios de perda de memória que são corriqueiros. Por exemplo: você sai de casa para ir ao supermercado sabendo que precisa de determinado produto e, ao circular entre corredores e prateleiras fazendo as compras, não consegue se lembrar do que motivou a ida até lá. O lapso também é normal quando a pessoa é capaz de percebê-lo: "Sei que guardei a nota fiscal mas não recordo onde". Não significa que há um problema de saúde ou, uma das piores hipóteses, a presença de uma demência começando a se manifestar.
À medida em que envelhecemos, essas ocorrências se tornam mais frequentes. Alex Machado Baêta, médico neurologista da BP — A Beneficência Portuguesa de São Paulo, explica que pequenos esquecimentos acontecem em função da morte neuronal.
— O cérebro de um indivíduo de 30 anos tem peso e população neuronal maior do que o cérebro de um idoso de 65 anos. A gente vai perdendo neurônios ao longo da vida — diz Baêta.
A perda de memória se trata de um problema que demanda atenção quando o indivíduo cogita outra possibilidade que não o seu próprio esquecimento para certos "sumiços" — depois de ter guardado um objeto e ser incapaz de encontrá-lo, pensa que pode ter sido roubado. Ou se esses eventos se tornam muito frequentes. Ou, ainda, quando ele não se dá conta dessa perda de memória. Quem explica é a psiquiatra e psicogeriatra Tânia Ferraz Alves, coordenadora do Departamento de Psicogeriatria da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
— A pessoa pode ter uma perda de memória, mas isso não impactar no dia a dia dela. Ela não deixa de cozinhar, não deixa de pagar as contas. A primeira coisa a fazer é descartar causas tratáveis — orienta Tânia.
Há diversas possibilidades a serem consideradas. Entre elas, estão doenças clínicas diversas, depressão, ansiedade, carência de vitamina B12, uso prolongado ou inadequado de determinados medicamentos. Na conversa com o paciente, o médico levanta uma série de informações. Exames com imagens do cérebro, como tomografia e ressonância magnética, também são recursos úteis.
— A investigação do déficit de memória é bem extensa, com muita conversa. Às vezes, tiramos todos os remédios. Tratamos a doença, tratamos a depressão. E temos a melhora da memória — relata Tânia. — Quando não melhora, vamos pesquisar quadros demenciais — complementa a médica.
A doença de Alzheimer é a mais comum entre as demências. Além da memória, afeta a cognição e o comportamento, entre outros aspectos.
— Vai tendo impacto em como a pessoa funciona no seu dia a dia. Ela começa a dirigir pior, batendo o carro. Erra mais as receitas na cozinha. Passa a esquecer de pagar as contas. Perde a noção do valor do dinheiro. Ela não vai perceber. Quem vai contar isso é a família. Ela dirige como antes, cozinha, mexe com dinheiro como antes? A gente sempre pede para o familiar comparar com relação há cinco anos, 10 anos — diz a psicogeriatra da ABP.
Baêta recorda um caso recente que ilustra a importância do diagnóstico e do acompanhamento corretos. Uma paciente que chegou a seu consultório vinha sendo tratada para Alzheimer. Vegana, a idosa estava, na verdade, com hipovitaminose grave por carência da vitamina B12. Sem ingerir alimentos de origem animal, ela precisou dar início a um processo de suplementação desse elemento.
— A B12 é importante para o cérebro. Se você corrigir o nível, a memória melhora — garante o neurologista.
O momento de buscar ajuda especializada é quando a perda de memória começa a ter maior impacto nas atividades cotidianas, segundo Tânia. Um episódio isolado não é preocupante — um idoso pode esquecer algo, sem que isso prejudique suas tarefas ou relações.
— Se você percebe prejuízo mais rápido, piora mais rápida ou se ficou na dúvida, procure um profissional, que vai avaliar os remédios, o estilo de vida. Na pandemia, teve muita gente com queixa de memória devido ao isolamento social. As pessoas não tinham mais estímulos, não encontravam outras pessoas, não saíam de casa. Se houver dúvida, o profissional saberá avaliar onde está a causa — comenta a psiquiatra.
A observação dos familiares é essencial para perceber que algo não vai bem.
— Às vezes, o paciente já está há um ano, dois anos com problemas. Teve um quadro inicial, passou desapercebido pelos familiares. Quando o familiar traz o paciente, ele já está em uma fase em que, com certeza, não é só um distúrbio de memória ligado à idade — afirma Baêta.
Prováveis causas
- Estresse
- Ansiedade
- Depressão
- Medicamentos (benzodiazepínicos, ansiolíticos, antidepressivos, anticolinérgicos)
- Insônia
- Doenças neurológicas
- Carência de vitaminas
- Apneia do sono
- Consumo de álcool
- Quadros demenciais
Estimule a memória
- Pratique atividade física regularmente
- Alimente-se de maneira saudável
- Mantenha diabetes, hipertensão e outras doenças crônicas sob controle
- Durma bem
- Estimule a cognição (ler, sair, conversar, interagir, aprender)
- Tome apenas os remédios necessários e na dose correta, sob prescrição médica