O Rio Grande do Sul foi o sexto Estado brasileiro com mais internações de bebês com desnutrição em 2022, segundo dados de um levantamento do Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância), realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O trabalho identificou que o RS teve 159 atendimentos de crianças menores de um ano no período. Em 2021, foram 175, o que representa queda de 9,1% na comparação entre um ano e outro.
Para a Saúde da Secretaria Estadual da Saúde (SES), levantamento deve ser analisado com cuidado, pois utilizam números absolutos e não levam tamanho da população em consideração.
O estudo mostra que 75 municípios gaúchos tiveram casos de desnutrição em bebês em 2022. Bagé, na Campanha, lidera o ranking, com 14 registros; Porto Alegre teve nove internações (confira as informações de cada município no mapa abaixo).
Na análise de longo prazo, as internações de bebês por desnutrição têm caído no RS. No início da série histórica, em 1998, foram computados 418 casos, o que significa queda de quase 62%. O pico nas hospitalizações ocorreu em 2003, com 422 registros, conforme os dados:
A queda nos casos também ocorreu no cenário nacional: de 2.946 em 2021 para 2.754, em 2022. A Bahia foi o Estado brasileiro com mais episódios de desnutrição no país em 2022, com 480, segundo o levantamento.
SES alega problemas no levantamento
Segundo Marilise Fraga de Souza, diretora-adjunta do Departamento de Atenção Primária e Políticas de Saúde da Secretaria Estadual da Saúde (SES), o levantamento que colocou o RS como sexto com mais casos no país precisa ser considerado com cuidado. Ela afirma que o estudo usa números absolutos, o que prejudica a avaliação dos episódios de desnutrição em bebês com menos de um ano de vida no Estado.
— O número de internações será maior nos estados mais populosos: não podemos comparar São Paulo com o Acre. Quando vemos pelo número absoluto, não conseguimos fazer a ponderação em relação à população de cada Estado. O ideal seria que os dados fossem apresentados por um índice populacional, internações por habitantes — comenta.
Marilise cita que há outros dois problemas no levantamento do Observa Infância: o primeiro é que os dados utilizados não são considerados fechados, ou seja, a atualização das informações da saúde no país em 2022 ainda é parcial, o que causa distorções nos registros. O segundo ponto é que o próprio número de casos pode significar eficiência no diagnóstico e tratamento da doença no Estado.
— Olhar a internação por si só pode demonstrar o melhor acesso à rede hospitalar. Estados que têm mais leitos de pediatria podem apresentar maior número de internações do que Estados que não têm essa rede. Precisamos considerar outras questões, como a série histórica, o atendimento na atenção primária, condições de saúde. É preciso olhar por vários aspectos — diz.
Segundo a Secretaria de Saúde, o combate à desnutrição tem uma estrutura pronta e permanente no Rio Grande do Sul, e o trabalho é feito em conjunto com o governo federal e os municípios. Entram na abordagem da pasta o monitoramento das condições nutricionais, orientação às secretarias municipais e treinamento de profissionais das unidades básicas de saúde.
Segundo Ana Costa, secretária-adjunta da SES, os casos de desnutrição de bebês podem ser evitados com a amamentação correta e cuidados preventivos com as crianças.
— É importante que as famílias levem os bebês às consultas mensais nos postos de saúde, para acompanhamento do peso, da altura. O acompanhamento que a atenção básica faz ajuda na prevenção. As unidades também são próximas de centros de assistência social, para direcionar a família para orientação quanto à amamentação ou a benefícios sociais — pontua.
Desnutrição pode afetar desenvolvimento
O Ministério da Saúde (MS) define a desnutrição como “uma doença de natureza clínico-social multifatorial, cujas raízes se encontram na pobreza”. A condição ocorre devido à nutrição inadequada da criança e pode causar prejuízos permanentes no paciente, explica Marcia Puñales, endocrinologista pediátrica do Hospital da Criança Conceição (HCC):
— A desnutrição pode afetar tanto o peso quanto o crescimento. Se o bebê não recupera isso nos dois primeiros anos de vida, pode haver um prejuízo na estatura final. A criança desnutrida tem a imunidade mais baixa, o que causa mais riscos no desenvolvimento de doenças mais graves que podem levar à morte.
A alimentação inadequada pode ter origem na falta de acesso a alimento por parte dos pais, pontua a especialista, mas há outros fatores capazes de explicar os registros no país: falta de informação sobre a amamentação e inexperiência por parte de mães mais novas, principalmente adolescentes.
— Temos de incentivar a amamentação e as mães que estão amamentando precisam estar bem nutridas. Viemos de uma pandemia em que muitas pessoas perderam emprego, e isso pode ser um dos fatores. É importante ressaltarmos que medidas governamentais e socioeducativas são importantes para chamar atenção para o problema. É um assunto que não era falado há anos — comenta.
A orientação do Ministério da Saúde é que a amamentação seja exclusiva até os seis meses de vida da criança e continuada até os dois anos de idade ou mais, a depender de cada caso. O desmame precoce é apontado como um dos fatores que pode causar desnutrição em crianças, em especial nos primeiros meses de vida.
— O leite materno tem os nutrientes que a criança precisa, e também fornece o aconchego, vínculo, estímulo. Até o sexto mês, o bebê não precisa de mais nada, nem água, chá ou outro tipo de leite — afirma Vera Lucia Bosa, professora do curso de Nutrição da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e chefe do serviço de nutrição do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
A nutricionista diz que, além da alimentação materna, outros fatores devem ser considerados para reduzir os casos de desnutrição em crianças no país:
— É importante dar condições para a mulher amamentar até o sexto mês e que ela tenha onde deixar a criança com segurança, em uma pré-escola. Destaco também o estímulo e a promoção do aleitamento materno por parte da comunidade e das unidades de saúde.
O tratamento para desnutrição infantil deve ser orientado por profissionais, como pediatras e nutricionistas, conforme a necessidade do pacientes.