Importante para garantir a saúde dos ossos, a vitamina D é produzida, em sua maior parte, a partir da exposição solar. Em porções menores, é encontrada em alimentos como peixes gordurosos e ovos, por exemplo. Para além disso, a vitamina D parece exercer um papel importante no sistema imunológico humano e, conforme sugerem alguns estudos, teria algum efeito protetor sobre o sistema respiratório. A partir daí, pesquisadores passaram a investigar uma possível associação dos níveis médios da substância com a mortalidade da covid-19.
Abaixo, reunimos algumas informações importantes sobre a vitamina, problemas causados pela sua deficiência e o que se sabe até agora sobre a relação que tem com a infecção por coronavírus. Confira:
O que é a vitamina D?
A endocrinologista Luciana Schreiner, professora da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), explica que a vitamina D atua quase como um hormônio:
— Ela regula o metabolismo de cálcio no organismo. Estão tentando comprovar questões ligadas à imunidade, como papel de impedir a proliferação de vírus e bactérias.
Flavio Luz, dermatologista da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), completa:
— Apesar de algumas evidências de efeito positivo no sistema imunológico, isso está longe de ter comprovação. O que temos como certo é que ela é fundamental para a mineralização dos ossos, o que significa evitar o raquitismo nas crianças e osteoporose nos adultos.
Como ela é produzida?
A vitamina D pode ser encontrada em alguns alimentos como salmão, por exemplo, no entanto, a quantidade é bem pequena, diz Luciana. Portanto, a maneira mais recomendada para metabolizá-la é pela exposição aos raios ultravioleta B.
Embora o assunto gere controvérsias, o dermatologista garante que a exposição deve ser feita com filtro solar.
— O uso de protetor de maneira habitual não reduz a síntese de vitamina D, e a carência dela não deve ser um obstáculo para o uso do produto — afirma, acrescentando que um estudo publicado nos anais da SBD mostrou que a síntese é igual em indivíduos com e sem filtro.
Luz destaca que, através do sol, a síntese é limitada pela inflamação que possa ser causada pelos raios UVB, ou seja, "torrar" no sol não vai aumentar a produção da vitamina. Pelo contrário, vai degradá-la.
E, para garantir os níveis adequados dessa vitamina, bastam poucos minutos ao sol. De 10 a 15 minutos diários são suficientes, inclusive neste período de distanciamento social.
— Pode-se ficar um pouco no sol ao levar o lixo na rua — sugere Luciana.
Outros fatores importantes que podem afetar a síntese da vitamina são o abuso de bebidas alcoólicas, sedentarismo e excesso de massa corporal. Isto é, não adianta manter uma exposição solar regular e estar acima do peso, ilustra o dermatologista.
Se a pessoa está em isolamento, precisa de suplemento?
De acordo com o dermatologista Flavio Luz, ainda não há estudos que indiquem o tempo recomendado de sol para cada indivíduo a fim de sintetizar a vitamina. O que se sabe é que crianças e idosos têm maior necessidade da vitamina. Os pequenos em razão do crescimento e os idosos por causa da osteoporose e de fraturas ósseas.
Atualmente, com o isolamento e a pouca exposição ao sol, algumas pessoas podem sofrer queda nos níveis da vitamina. Mas isso não significa que se deva usar suplementação por conta própria. A recomendação é procurar um médico para solicitar um exame de sangue com a dosagem de vitamina D. Ainda assim, Luciana lembra que é preciso ir além dos valores apontados pelos testes:
— É preciso ter cuidado na análise no exame: coletar dados do paciente e sintomatologia para avaliar uma possível deficiência antes de sair suplementando. Muitas vezes atletas, que se expõem ao sol, têm índices muito abaixo do normal. Muito provavelmente por que os ensaios não são bem adequados.
Apesar de ser vendida nas farmácias como suplemento, a vitamina D precisa, obrigatoriamente, ser receitada por um médico, pois o excesso dela pode acarretar prejuízos à saúde, como o hiperparatireoidismo, que é o aumento excessivo da produção do hormônio que regula o cálcio.
— E muito cálcio, esse excesso não-fisiológico, pode levar a arritmia, parada cardíaca e cálculos renais — afirma Luciana.
A deficiência tem sintoma?
Conforme a docente da PUCRS, os sinais da ausência de vitamina D são inespecíficos, salvo quando já se trata de um quadro crônico.
— Basicamente, a pessoa pode sentir cansaço, diminuição da memória e fraqueza muscular — enumera.
O que dizem os estudos sobre coronavírus?
Em março, dois professores da Universidade de Turim, na Itália, assinaram um documento no qual sugerem que a suplementação de vitamina D, quando em níveis baixos, pode ser uma ferramenta de prevenção ao coronavírus. As evidências apontadas pela dupla são: o papel ativo que a substância tem na modulação do sistema imunológico, redução no risco de infecções respiratórias de origem viral e capacidade da vitamina D de neutralizar danos nos pulmões causados pela inflamação provocada pela ação do sars-cov-2. Além disso, acrescentaram, eles observaram que dados de pacientes de Turim indicaram que aqueles que testaram positivo para o coronavírus também apresentaram hipovitaminose D.
O mesmo estudo italiano menciona um trabalho pre-print (sem revisão por pares) intitulado "A suplementação de vitamina D pode prevenir e tratar infecções por influenza, coronavírus e pneumonia". Após revisão, esse trabalho foi publicado em abril, dessa vez com novo título: "Evidência de que a suplementação de vitamina D poderia reduzir o risco de influenza e infecções por covid-19 e mortes". O artigo defende que, através de vários mecanismos, a vitamina D pode reduzir o risco de infecções por meio da diminuição da replicação viral e também da concentração de citocinas, que provocam a inflamação aguda que afeta os pulmões. O texto conclui que a suplementação é recomendada para reduzir o risco de infecção e também deve ser administrada em pessoas com o diagnóstico de covid-19. Ainda assim, os pesquisadores indicam a necessidade de estudos clínicos randomizados para avaliar tais recomendações.
Em maio, um artigo publicado no periódico BMJ Nutrition, Prevention and Health foi enfático ao defender a importância da vitamina D para a saúde global. No entanto, destacou que "não há evidências científicas robustas que mostrem que a ingestão de altas doses de vitamina D vá beneficiar prevenindo ou tratando covid-19".
A correlação com a mortalidade por covid-19
Ainda em maio, outro artigo publicado no Aging Clinical and Experimental Research apontou uma correlação entre níveis de vitamina D e a mortalidade por covid-19. Entretanto, na edição de julho do periódico outros pesquisadores contestaram os resultados: eles afirmam que a conclusão do texto não tem suporte pela análise de dados e que outros estudos devem se debruçar sobre o tema. "Atualmente, entretanto, não há evidência de nenhum efeito da vitamina D na redução do impacto da covid-19 no número de casos ou de mortes", escreveram.
Em meio a tantas informações, a única afirmação que realmente deve ser considerada, diz o dermatologista Flavio Luz, é que um organismo saudável é menos suscetível a infecções. E para mantê-lo saudável, é necessário ter níveis de vitamina D adequados.
— Não há estudo com metodologia forte que possa correlacionar de alguma maneira a infecção por coronavírus ou a gravidade do quadro com os níveis de vitamina D. Aparentemente, não tem relação. Existem muitos rumores e pessoas querendo espaço na mídia fazendo publicações e levantando teorias que não têm fundamentação científica adequada. Todavia, um organismo saudável, no geral, é mais resistente à infecção. E um organismo saudável inclui ter níveis adequados de vitamina D — sublinha o dermatologista da SBD.