O debate sobre aumento ou manutenção do preço da passagem de ônibus em Porto Alegre, cuja revisão tradicionalmente acontece nos meses de fevereiro, deve esquentar com a aprovação, pela Câmara de Vereadores, da Frente Parlamentar em Defesa da Tarifa Zero. A proposta obteve 21 votos favoráveis, 10 contrários e teve cinco abstenções, em sessão ocorrida na última quarta-feira (14). Em ano de escolhas para a sucessão no Paço e no parlamento municipais, a discussão é considerada oportunista pela liderança de governo, enquanto é apontada como necessária por forças políticas divergentes.
— O PSOL é especialista em oferecer utopias em ano eleitoral. Não tem finança que resista ao financiamento total da tarifa do transporte coletivo — dispara o líder do governo na Câmara, vereador Idenir Cecchim (MDB). Ele indica que a tese mantida pela gestão do prefeito Sebastião Melo (MDB) é de destinar recurso público às empresas concessionárias para manter a roleta girando por R$ 4,80 ou permitir o menor aumento possível.
A tese, entretanto, é refutada por parlamentares de outras vertentes. Proponente para a criação da Frente, a vereadora Karen Santos (PSOL) sustenta que não basta mais manter o preço congelado, em um cenário de prestação do serviço essencial para cidadania e economia, apontado por ela como "precário e ineficiente".
— Porto Alegre tem um serviço caro, que impacta na renda das famílias, e que não é confiável. São ônibus mal conservados, que estragam, atrasam, não têm climatização e nem acessibilidade — critica. A vereadora acredita que a isenção favorece o desenvolvimento, gerando oportunidades, e poderia ser financiada por recursos de um fundo municipal próprio, das multas de trânsito e receitas com estacionamento em espaço público.
A frente recém constituída deverá fomentar as reflexão em torno do assunto, propiciando atividades como seminários, mesas de debate e palestras com estudiosos da matéria. Representante de força independente na Câmara, a vereadora Mari Pimentel (Novo) afirma considerar que a discussão é pertinente e oportuna.
— Não vejo a tarifa zero como a solução para a mobilidade urbana. Porém, o debate é prioritário e deve estar na pauta de um parlamento que vota mais moções do que temas reais da cidade. Votei pela redução da gratuidade para estudantes de acordo com o enquadramento de renda familiar, mas não sei quanto isso impactou na evasão escolar. A campanha eleitoral é o momento adequado para que se diga à população como será o seu transporte público — avalia vereadora.
Prefeitura confirma análises
O estudo sobre o preço da passagem dos ônibus está na pauta da Administração. Além do Gabinete do Prefeito, secretarias da Fazenda e de Mobilidade Urbana trabalham sobre informações técnicas e dados econômicos. Contudo, o tema é tratado com reserva. Em resposta a pedido de entrevista, a Pasta da Mobilidade Urbana resumiu seu posicionamento e breve nota:
"A prefeitura está dedicada ao processo de cálculos sobre a passagem, e a tarifa de 2024 será informada até o final do mês", resumiu o texto. Questionado acerca do assunto, o líder do governo assegurou que a pauta é tratada como uma das atuais prioridades no centro do governo Melo.
— O próprio prefeito está diretamente envolvido nas análises — confirmou o vereador Cecchim. Hipóteses, segundo ele, levam em consideração a gradativa redução na quantidade de cobradores e a recente efetivação da privatização da Carris.
Cecchim não promete redução no valor, mas destaca viabilidade para melhorias no sistema. O último reajuste sobre a tarifa ocorreu em 2021, quando saiu dos R$ 4,55 para o preço atual. Em 2022 e 2023, o subsídio público manteve o congelamento. No ano passado, foram aplicados R$ 124 milhões em recursos públicos para sustentar o passe em R$ 4,80.
Ainda em sua nota, a Secretaria de Mobilidade Urbana indicou o posicionamento acerca da criação da Frente Parlamentar em Defesa da Tarifa Zero:
"Não nos manifestamos a respeito de projetos do legislativo", citou.
No RS, Parobé e Pedro Osório implementaram tarifa zero
Estudo de doutorado que serve como uma das bases teóricas para a constituição da Frente Parlamentar em Defesa da Tarifa Zero em Porto Alegre demonstra que 105 municípios brasileiros implementaram políticas de isenção universal sobre a tarifa de transporte coletivo. No Rio Grande do Sul, Pedro Osório (103ª posição, com 7.484 habitantes) e Parobé (26ª colocação, com 52.058 habitantes) praticam tal política pública.
Em Parobé, a iniciativa provocou mudança na relação entre o poder público e a empresa prestadora de serviço. Ao invés de licitar e conceder o serviço, a prefeitura passou a contratar o quilômetro rodado, podendo interferir no manejo de linhas e horários da frota no intuito de qualificar o atendimento à demanda populacional.
— A gestão ficou na mão da gente e o custo não aumentou. O impacto é positivo para a economia, pois o recurso que fica no bolso do cidadão acaba sendo aplicado no comércio e nos serviços da cidade. Quando uma família economiza R$ 500 por mês em transporte, este dinheiro se distribui, gera riqueza e empregos. É uma receita sustentável sob qualquer ótica de receita e investimento, seja qual for o tamanho da cidade — argumenta Diego "Picucha" da Luz, prefeito de Parobé.
A listagem tem como maior representante o município de Caucaia, no Ceará, com seus 355.679, seguido por Luziânia, em Goiás, com 209.129 habitantes; e Maricá, no Rio de Janeiro, com 197.300 habitantes. O menor município é Santana do Deserto, em Minas Gerais, com seus 3.747 habitantes.