Após vistoria na manhã desta quinta-feira (6) no canteiro de obras do Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, o Harmonia, a promotora Annelise Steigleder, do Ministério Público Estadual, considerou “desnecessária” a hipótese de apresentar ao Poder Judiciário um requerimento de suspensão das intervenções.
Ganharam corpo nos últimos dias as críticas de vereadores de Porto Alegre e de organizações ambientais à condução dos trabalhos, com denúncias quanto a remoção e mutilação de árvores, além da retirada de zonas de gramado que, no momento, viraram áreas de terra e barro. A descaracterização do local, antes de verde predominante, é outro aspecto apontado. Munidos de vídeos e fotos do que consideraram ser um trabalho descuidado, os críticos chegaram a protocolar o pedido de paralisação.
Annelise, da Promotoria do Meio Ambiente de Porto Alegre, após reunião e caminhada pelo local, declarou ter ficado “apaziguada” e “tranquila” com os esclarecimentos da concessionária GAM3 Parks, que venceu a licitação para administrar conjuntamente o Harmonia e o trecho 1 da orla do Guaíba por 35 anos.
O Harmonia tinha, antes da concessão, 1.253 árvores, entre nativas e exóticas. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) emitiu, em 19 de dezembro de 2022, uma autorização especial para a extração de 432. Até agora, foram efetivamente retiradas 103, sendo 38 delas em situação fitossanitária considerada debilitada.
Arquiteta responsável e diretora Administrativa da GAM3 Parks, Carla Deboni, afirmou que já foi removida a maioria das árvores necessárias para a construção do empreendimento. Ela diz que, a partir de agora, novas supressões não devem passar de 30 unidades, com manejo pontual. Caso esse cenário se confirme, a concessionária utilizará menos da metade da autorização da Smamus para a extração de 432 vegetais.
O projeto prevê que a gestora privada terá de fazer o plantio de 1.906 mudas no parque, com preferência para espécies nativas, como forma de compensação.
Com auxílio de imagem por satélite, Carla assegurou que as remoções foram sazonais, de forma que não houve nenhuma área de mata fechada que tenha sido amplamente derrubada. A diretora ainda destacou que a faixa verde conhecida como “reservinha”, de arborização cerrada às margens da Avenida Edvaldo Pereira Paiva, será preservada e reforçada com o plantio de mais mudas.
Cuidado com plantas não cortadas
A promotora reforçou preocupação com o alerta feito pelo Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) quanto às árvores remanescentes do parque, que estariam sofrendo mutilações acidentais, sobretudo pelo trânsito de máquinas. Isso foi registrado em imagens. Outro ponto destacado foram vegetais cujas raízes estavam soterradas por entulho de obra.
— A questão é a maneira do impacto. Vai haver monitoramento detalhado dos vegetais não cortados, mas que podem estar sendo impactados por dano ou mutilação. É muito importante que possamos identificar e proteger para que não sucumbam. Algumas raízes foram impactadas por movimentação (de terra) e brita — afirmou a promotora Annelise.
Fiscal da Smamus que acompanha a intervenção, Gabriela Moura afirmou, na reunião, ter tomado conhecimento de apenas uma árvore que sofreu “injúria mecânica”, um dano causado por máquina.
— Não verifiquei nada que desabone do ponto de vista ambiental. A vegetação do parque, em 10 anos, estará melhor em sua qualidade — afirmou Gabriela.
A GAM3 Parks e a Smamus se comprometeram a elaborar relatórios e a adotar cuidados com a vegetação remanescente, com instalação de circunferências protetivas em torno dos espécimes e fortificação com adubo.
— Vamos reforçar os cuidados de manejo para que não tenha nenhum tipo de problema — disse a diretora da GAM3 Parks, Carla Deboni.
Drenagem
Nos últimos dias, causaram polêmica em redes sociais imagens feitas com drone que mostraram grandes lamaçais em zonas antes ocupadas por vegetação gramínea e árvores. A própria diretora da GAM3 Parks mencionou uma “sensação de devastação”, mas caiu no choro ao lamentar o pico de críticas em momento de intervenção no solo e após a passagem de um ciclone pelo Rio Grande do Sul, cujas consequências atingiram Porto Alegre.
Os técnicos da concessionária e da prefeitura lembraram que o Harmonia fica em região de aterro e tem histórico de alagamentos. Para resolver a drenagem, afirmaram, foi necessário fazer terraplenagem para corrigir o solo acidentado.
Mais intervenções foram realizadas para cavar o que serão três bacias de amortecimento. Hoje, ainda inconclusas, elas parecem lagos artificiais, mas a finalidade deste equipamento é outra. As bacias ficarão no subterrâneo e irão receber a água escoada das áreas de circulação, para evitar alagamentos.
Na superfície, 60% do solo será permeável. Ou seja, penetrável pela água. Parte do passeio será em blocos de piso intertravado e pó de brita, que, para leigos, pode parecer semelhante ao asfalto. Esses pavimentos porosos são destinados, em parte, aos acessos do parque e atendimento a normas de acessibilidade.
Uma terceira parte, afirma a GAM3 Parks, será de gramados replantados. A promessa é de que haverá recuperação de verde no solo, logo após o término da fase crítica de movimentação de terra.
— Estamos com obras em andamento. Não tenho como fazer toda a rede subterrânea sem mexer. Tivemos de fazer escavações e isso retirou a grama. Depois, no paisagismo, a grama irá voltar — afirmou Carla.
Quando o sistema de drenagem estiver pronto, o plano é que a água da chuva, ao tocar o solo, penetre as estruturas porosas e escoe por encanamentos até as três bacias de amortecimento ou a rede pluvial da cidade, dependendo da localização.
Documentação
Na Comissão de Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da Câmara de Vereadores, foram levantadas dúvidas, na terça-feira (4), quanto à hipotética mudança do que estava previsto no Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU). O vereador Aldacir Oliboni (PT) chegou a manifestar que, se tivesse ocorrido alteração no EVU para ampliar a autorização de remoção de árvores, seria necessário atualizar o documento e aprovar no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA).
A GAM3 Parks diz que a única mudança foi em relação à altura da roda gigante prevista para ser instalada no local. O titular da Smamus, Germano Bremm, acrescentou que os ajustes foram pequenos, sem necessidade de revisão do planejamento.
O EVU é uma etapa de discussão de critérios mais amplos, macro-urbanísticos, e foi aprovado na CMDUA em 7 de outubro de 2022. Aspectos mais detalhados foram chancelados posteriormente, em projetos encaminhados a órgãos como a Smamus e o Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae). A remoção das árvores, por exemplo, teve liberação posterior ao EVU, no final de dezembro de 2022.
Obra será interrompida para o Acampamento Farroupilha
A previsão é de que o empreendimento em construção no Parque Harmonia esteja concluído até o final de 2027. A GAM3 Parks informou que, até o momento, foram investidos R$ 20 milhões. Ao final da concessão de 35 anos, os recursos aplicados têm previsão de alcançar R$ 281 milhões. Em troca, a concessionária terá o direito de explorar comercialmente o espaço para a realização de grandes eventos, com estacionamento e área construída em até 20% do terreno.
Embora esteja em obras, o tradicional Acampamento Farroupilha será realizado em setembro no Harmonia, cuja área soma 175 mil metros quadrados. Haverá paralisação temporária nos trabalhos para a realização do evento.
As árvores
- A Smamus autorizou a remoção de 432 árvores no Harmonia
- Até o momento. 103 foram efetivamente extraídas
- Dentre as retiradas, 38 tinham condição fitossanitária precária e 35 estavam debilitadas por eventos climáticos
- Espécies nativas: salgueiro, chal-chal, aroeira-vermelha e maricá
- Espécies exóticas: tipuana, amoreira, jambolão e jacarandá