Ambientalistas criticam a prefeitura de Porto Alegre pelo descaso em relação a um curso d'água escondido em meio à vegetação do Parque Marinha do Brasil, no bairro Praia de Belas. Trata-se de dois córregos unificados por um canal nas imediações do canhão.
A bióloga Lara Lutzenberger, que possui imagens onde se vê como era o canal e compara com fotos atuais, critica a falta de manejo das plantas aquáticas por parte da prefeitura (veja as imagens acima).
— O que chama atenção, acima de tudo, é o absoluto desleixo no manejo ecológico e paisagístico desse espaço tão nobre do Parque Marinha do Brasil — afirma a presidente da Fundação Gaia, salientando que o canal está assoreado, o que a prefeitura discorda (leia mais abaixo).
Em um trecho situado na parte sul do parque há um banhado, que abriga fauna de aves, anfíbios e pequenos peixes. Um cano verte água em um ponto localizado mais na parte norte.
— Vi uma jaçanã com dois filhotes — compartilha Lara, em relação ao banhado.
Conforme a filha do ambientalista José Lutzenberger, a existência de “um curso d'água sinuoso com espelho e margens bonitas agrega biodiversidade, vida e encanto ao parque”.
E explica o que significa deixar as coisas como estão:
— Ao contrário, deixá-lo abandonado dessa forma, desperdiça seu potencial paisagístico, elimina nichos de vida, gera riscos de acidentes e acumula poluição e contaminação — reflete, acrescentando uma crítica direta à prefeitura:
— Evidentemente, o cuidado com o Parque Marinha do Brasil se limita às roçadas e à coleta grosseira do lixo.
A reportagem de GZH esteve no local, durante a tarde de quarta-feira (11), para ver a situação do canal, que está encoberto por mato, galhos e aparenta estar seco na parte mais central. Apenas uma placa foi encontrada com alerta sobre os riscos em função da presença do terreno alagadiço.
— Sabia que existia esse canal, porque a minha cadela Brigite caiu nele e conseguiu nadar para sair. De longe, nem parece ser um curso d'água — conta a estudante Bruna Moreira, 23 anos, que passeava com a pet, além do cão Bruce.
O que me chama atenção, acima de tudo, é o absoluto desleixo no manejo ecológico e paisagístico desse espaço tão nobre do Parque Marinha do Brasil
LARA LUTZENBERGER
Bióloga e ambientalista
Frequentadora do Parque Marinha do Brasil, Bruna tem uma sugestão para a prefeitura:
— Deveriam colocar gradeamento no entorno, avisos e realizarem a manutenção.
A publicitária Stephanie Beuren, 27, passa pouco pelo local. Porém, alerta para os cuidados necessários enquanto leva seu animal de estimação para passear pelo parque.
— É importante que tenha avisos sobre a presença do canal para as pessoas — observa, citando a necessidade da manutenção até pelas exigências sanitárias envolvidas.
De onde vem a água?
O geólogo e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Rualdo Menegat, responsável pelo Atlas Ambiental de Porto Alegre, explica de onde vem e contextualiza a história do curso d’água do Parque Marinha do Brasil.
Segundo relata, o canal é originário da microbacia Santa Tereza. Tratam-se de dois pequenos córregos que nascem entre o morro Menino Deus e o Santa Tereza, que teriam sido desviados para as imediações do Parque Marinha do Brasil durante o aterro realizado no bairro Praia de Belas nas décadas de 1960 e 1970.
— São dois pequenos córregos unificados por meio de um canal, que atualmente corre por ali. Antigamente, eles descendiam das encostas dos dois morros e corriam diretamente para a enseada Praia de Belas.
Menegat chama a atenção sobre a importância desses canais para o ecossistema da Capital.
— O Parque Marinha do Brasil deveria recuperar essa função ecossistêmica. Porque os parques, hoje, cumprem, bem ou mal, o papel de conectores ecológicos da margem do Guaíba — conclui.
O que diz a prefeitura
A reportagem de GZH questionou a prefeitura sobre a situação do curso d'água, sua manutenção e futuro. A Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb) respondeu, por nota, o que segue abaixo e na íntegra:
“A Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSUrb) informa que o lago que cruza o Parque Marinha é sem pavimentação, o que significa que é natural o crescimento de vegetação aquática. O lago em questão não está assoreado, e sim, com excesso de plantas.
Hoje a manutenção do parque é realizada por funcionários do quadro da prefeitura. Apenas a capina e a roçada são feitas pela terceirizada Cootravipa. A empresa informada já prestou serviços de manutenção de praças e calçadas na Capital, porém hoje não possui contrato vigente com a SMSUrb e não atuou em limpeza de lagos.
A remoção do excesso de plantas é necessária, porém, não a eliminação, já que são importantes para a fauna do local, desde insetos, anfíbios, quelônios, alguns peixes e aves aquáticas que fazem parte do ecossistema.
Os parques de Porto Alegre possuem características diversas, como lagos naturais, artificiais, pavimentados ou não, com chafarizes e presença de fauna. A prefeitura hoje não dispõe de funcionários no quadro e maquinário especializados para a execução deste tipo de serviço que é complexo e exige especificidades técnicas para segurança do ambiente e dos colaboradores. Em razão disto, a SMSUrb, Dmae (Departamento Municipal de Água e Esgotos) e Smamus (Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade) deverão se reunir para elaboração de um Termo de Referência a fim de contratar empresa terceirizada para prestar o serviço deste tipo de limpeza, como lagos e chafarizes.”