Envolver-se com um impeachment às vésperas da campanha eleitoral não é uma situação inédita para o prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan (PSDB). A diferença é que desta vez o tucano é alvo do processo de deposição, enquanto em 2016 ele foi um dos algozes da então presidente Dilma Rousseff.
À época, Marchezan estava no segundo mandato de deputado federal e militava na oposição ao PT na Câmara. O voto dele na histórica sessão de 17 de abril daquele ano, na qual os deputados aprovaram a admissibilidade do processo, foi o 25º dos 367 contra a então presidente.
— Para corresponder, presidente, às expectativas dos meus eleitores, dos brasileiros, às expectativas de um Brasil melhor, para combater a corrupção, para que a gente possa olhar para a frente, para um Brasil diferente e separar o que é legal e ilegal, e pela nossa Constituição, o meu voto só poderia ser e será sim ao impeachment da presidente Dilma — justificou, com uma faixa verde e amarela pendendo dos ombros.
Seis meses antes, porém, o tucano já defendia a instauração de um processo de afastamento. Em entrevista à Ulbra TV, em 13 de outubro de 2015, ele comentou sobre os mais de 20 pedidos de impeachment que se acumulavam na Câmara. Marchezan reclamava da postura do então presidente da Casa, Eduardo Cunha (MDB), que postergava uma decisão, e chamava de fulminante a denúncia apresentada pelo jurista Miguel Reale Jr e pelo advogado Hélio Bicudo. Para ele, Dilma havia transgredido a lei ao usar R$ 40 bilhões de recursos de empresas públicas para cobrir gastos sociais, na manobra contábil que ficou conhecida como "pedaladas fiscais".
— Não foram R$ 500 mil , não foram R$ 500 milhões, não foram R$ 5 bilhões, foram R$ 40 bilhões que ela pegou para exercer suas políticas públicas. A presidente Dilma descumpriu a lei — acusou.
Marchezan esteve em quase todos os protestos contra o governo. Ele se aproximou de organizações como o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra Rua, que convocavam as manifestações, e era presença assídua no alto dos carros de som instalados na Redenção ou no Parque Moinhos de Vento. Nas redes sociais, publicava vídeos, fotos e cards pedindo a saída da presidente.
Em 16 de março de 2016, dia em que Dilma anunciou a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil, se juntou a manifestantes em protesto em frente ao Palácio do Planalto.
— As pessoas não querem Lula ministro, querem Lula na Papuda (penitenciária de Brasília). E a Dilma fora da presidência — falou em vídeo divulgado no seu Twitter.
No mês seguinte, a cinco dias da votação na Câmara, disse em entrevista a uma emissora de rádio que, mesmo sem impeachment, Dilma não chegaria ao fim do mandato. Em maio, com o processo remetido ao Senado e aguardando decisão de um iminente afastamento temporário da petista, voltou a se manifestar, salientando que o país tinha pressa e não poderia esperar.
Sacramentado o afastamento em 12 de maio, duas semanas depois, Marchezan subiu à tribuna da Câmara para dizer que estava "quase arrependido" pelo voto favorável ao impeachment. Com o governo entregue provisoriamente a Michel Temer e o país em grave crise econômica, ele reclamou da disposição da Câmara em aprovar um aumento salarial a servidores do Judiciário e do Ministério Público.
— Eu hoje quase me arrependo. Não fosse esse governo tão ruim e tão criminoso, eu estaria arrependido de ter votado a favor do impeachment nesse momento. Por que a crise não chegou na vida dos senhores e nem daqueles que cercam os senhores e influenciam o voto. Por que o povo não influencia no voto de vossas excelências. Quem influencia são os capas-pretas que vem aqui. E não estão aqui representando o Judiciário, não estão aqui representando o Ministério Público, estão aqui representando o seu bolso, única e exclusivamente — bradava.