Desde a tarde de quarta-feira (1º), chama a atenção de quem circula sob o Viaduto Otávio Rocha, no Centro, a mudança no cenário: não se vê mais nem sinais dos sem-teto que dormiam sob a estrutura. Uma ação do 9º Batalhão de Polícia Militar (BPM) realizada sem o conhecimento da prefeitura retirou colchões, barracas e demais objetos, dispersando as pessoas que lá se instalavam.
— Isso foi uma ação nossa, da Brigada. Se é traficante, usuário, ladrão, não tenho que ter contato com secretaria da prefeitura. Eu pessoalmente acionei o DMLU para fazer a limpeza. Não tinha pessoa nenhuma dormindo. Tinha usuário, traficante e marginal, é isso que tinha embaixo do viaduto. Uns estavam tão chapados que nem sabiam o que estava acontecendo — disse o comandante do 9º BPM, Rodrigo Mohr Picon.
De acordo com ele, a retirada dos objetos foi um desdobramento de ações que têm sido realizadas desde que assumiu o 9º BPM, há cerca de quatro meses. Foi quando a BM começou a monitorar a região, com policiamento fixo, e manter contato via whatsapp com parte dos comerciantes, que informavam das ocorrências de assaltos e de tráfico de drogas no local — que, segundo o comandante, tornou-se uma cracolândia.
A ação contrasta com o plano da prefeitura para o viaduto. Em maio, o Executivo lançou o Plano Municipal de Superação da Situação de Rua, que prevê uma série de ações conjugadas para abordar pessoas sem-teto — antes disso, no ano passado, o prefeito Nelson Marchezan proibiu uma ação pontual no local por falta de planejamento. No último ano, o tráfico de drogas tornou-se frequente, aumentando a sensação de insegurança, mas ainda havia moradores de rua instalados, além de usuários de drogas. A reportagem aguarda pelo posicionamento da prefeitura sobre a ação.
Segundo a Secretaria de Saúde, abordagens conjuntas já estão sendo realizadas por equipes que incluem assistente social, educador social, psicólogo, médico, enfermeiro e técnico em enfermagem. Desde que o plano foi lançado até agora, ações ocorreram praças no Centro e nas proximidades do Hospital de Pronto Socorro. O objetivo das abordagens, segundo a pasta, é estabelecer vínculo para promover a inserção das pessoas nas políticas públicas de moradia e saúde, ou promover o retorno às suas cidades de origem — duas pessoas já retornaram para casa com as passagens disponibilizadas pela prefeitura.
Passeio livre causou estranhamento e dúvida: para onde foram os sem-teto?
Na manhã desta quinta-feira (2), apenas uma mulher dormia no chão, perto de uma parada de ônibus quase na esquina com a Rua Jerônimo Coelho. Uma dupla de brigadianos circulava sob a estrutura. Comerciantes e pedestres mostravam-se divididos sobre a nova cara de um dos pontos mais emblemáticos do Centro Histórico. Enquanto todos estranharam o passeio livre pela primeira vez em anos, e muitos mostravam-se satisfeitos com a desocupação, várias pessoas questionaram para onde teriam sido encaminhados os moradores de rua.
— Me preocupa a questão social: para onde foi esse pessoal? O que foi feito com eles? Faz tempo que estavam aqui — disse o aposentado Valdemar de Jesus da Silva, que aguardava por um ônibus sob a estrutura.
Dono de uma lanchonete próxima ao ponto de táxi do viaduto, Benisio Rodrigues de Assis aprovou o novo aspecto, mas também mostrou preocupação com os antigos moradores. Segundo ele, a sensação de insegurança relatada por quem circulava pelo local nos últimos anos devia-se a pessoas "de fora".
— Não cheguei a ver (a ação). Sei que tiraram as coisas deles, tinham aqueles laranjinhas (funcionários da Cootravipa). As pessoas se espalharam, uma para cada lado. Mas no fim ficou bonito. A gente até estranha, né. Tinha bastante gente, bastante casinhas, mas o problema não era quem dormia, era quem vinha de fora. Sexta, sábado, já começavam a aparecer uns rostos estranhos, aí ficava perigoso — diz.