
A Primeira Turma do STF decidiu, nesta quarta-feira (26), receber a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por cinco crimes, entre eles tentativa de golpe de Estado, contra Jair Bolsonaro e sete aliados. A decisão foi oficialmente anunciada por volta das 13h, ao fim da sessão que teve início às 9h50min.
O entendimento por receber a denúncia se deu de forma unânime. Além do relator Alexandre de Moraes, os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, nesta ordem, também votaram a favor do recebimento.
Agora, o ex-presidente e os outros sete membros do chamado "núcleo crucial" se tornam oficialmente réus de uma ação penal que irá decidir se eles são culpados ou não das acusações criminais apontadas pela PGR. A expectativa é que esse julgamento ocorra ainda em 2025.
Moraes apresenta seu voto
O primeiro ministro a apresentar seu voto foi o relator do caso, Alexandre de Moraes. A explanação de Moraes apresentando sua posição durou cerca de uma hora e 45 minutos.
Ao comentar a gravidade dos fatos narrados na denúncia da PGR, Moraes classificou como "gravíssimos" os ocorridos em 8 de janeiro de 2023, lembrando também que o mérito das ações ainda não está sendo debatido.
— Os crimes praticados no dia 8 de Janeiro, em relação à sua materialidade, não estamos falando em autoria ainda, foram gravíssimos — afirmou Moraes, que também exibiu cenas dos atos violentos de invasão e depredação dos prédios públicos dos três poderes durante a sua fala.
Moraes também comentou o conhecimento de Jair Bolsonaro sobre a chamada "minuta do golpe".
— Não há nenhuma dúvida que o denunciado Jair Messias Bolsonaro conhecia, manuseava e discutia a minuta do golpe. Isso não há dúvida. A interpretação do fato vai ocorrer durante a instrução processual penal. Se ele analisou e não quis, ou se analisou e quis, será no juízo de culpabilidade. Mas, não há dúvidas que ele tinha conhecimento da minuta do golpe apreendida — observou.
Por fim, Alexandre de Moraes declarou votar a favor do recebimento da denúncia contra o ex-presidente e os outros sete membros do "núcleo crucial".
— Além das provas independentes e autônomas, além dos depoimentos do colaborador (Mauro Cid), há comprovação dessas afirmações feitas pelo colaborador. Então, nesse momento de cognição, presentes os elementos necessários do artigo 41 do Código de Processo Penal e a justa causa para instauração da ação penal, eu voto no sentido do recebimento da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República em face de Alexandre Ramagem, Almir Garnier Santos, Anderson Torres, Augusto Heleno, Jair Messias Bolsonaro, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e Walter Souza Braga Netto — proferiu Moraes.
Demais ministros seguem o relator
Após o voto do relator, Flávio Dino foi o segundo ministro a proferir seu voto. Dino acompanhou a posição de Moraes.
— Golpe de Estado é coisa séria. É falsa a ideia de que um golpe de Estado, ou uma tentativa, porque não resultou em mortes naquele dia, é uma infração penal de menor potencial ofensivo — destacou o ministro durante sua manifestação.
Em seguida, quem apresentou seu voto foi o ministro Luiz Fux. Com o voto dele, a Primeira Turma atingiu a maioria necessária para tornar réus os oito denunciados.
— Queria acompanhar integralmente o relator, parabenizando por essa, eu sei que esse momento não é de parabéns, mas, assim, uma referência ao seu trabalho, que conseguiu fazer, digamos assim, abreviar a nossa tarefa. Porque muitos imaginavam "ah, todos vão pedir vista, a denúncia é muito grande". O ministro Alexandre, vamos dizer assim, em uma linguagem coloquial, não deixou pedra sobre pedra — comentou Fux ao acompanhar o voto de Moraes.
A ministra Cármen Lúcia proferiu seu voto após a manifestação de Fux. A decana da Primeira Turma ressaltou o compromisso do tribunal em receber a denúncia para se aprofundar na investigação dos fatos narrados.
— O compromisso nosso é de, tendo um fato, cumprir o dever que é do Poder Judiciário, nesse caso, o Supremo Tribunal Federal, de receber a peça, e verificar, a partir da instrução que será feita, com todo direito ao devido processo legal, ampla defesa, e todos os recursos a ela inerentes. Tudo isso será feito, no tempo certo e na fase certa. Aqui, o Estado juiz cumpre o dever, que não é subjetivo, que não é discricionário, de receber e permitir que isso seja investigado e esclarecido — reforçou a ministra durante sua manifestação.
Por fim, apresentou seu voto o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin. O ministro também acompanhou o voto de Moraes e confirmou a unanimidade da decisão.
— Existem inúmeros documentos que mostram, em tese, a participação dos denunciados em atos que podem ter culminado no dia 8 de Janeiro. Se esses documentos, se esses depoimentos, são verdadeiros ou não, é o que se vai discutir ao longo da instrução, mas, nesse momento, eu também considero que há materialidade, indício de autoria, a ensejar o recebimento integral da denúncia, tal como exposto pelo voto do eminente relator — declarou.
Bolsonaro não compareceu à sessão nesta quarta
Na terça-feira, Jair Bolsonaro acompanhou presencialmente as deliberações da Primeira Turma. Ele esteve ao lado dos advogados e de aliados, como os deputados federais Mario Frias (PL-RJ) e Coronel Zucco (PL-RS).
Na chegada a Brasília, ainda na terça, Bolsonaro havia afirmado esperar por justiça, mas reclamou da condução das investigações.
— Nada se fundamenta nas acusações feitas de forma parcial pela Polícia Federal. Vou estar acompanhando com os advogados agora e, depois, a gente decide o que vai fazer — afirmou.
Nesta quarta-feira, o ex-presidente optou por não acompanhar in loco as atividades. Bolsonaro se dirigiu ao Senado, onde assistiu a sessão da Primeira Turma pela TV, ao lado do filho, Flávio Bolsonaro, e outros apoiadores. Após a decisão de aceitar a denúncia, Bolsonaro se manifestou em uma rede social.
"Estão com pressa. Muita pressa. O processo contra mim avança a uma velocidade 14 vezes maior que o do Mensalão e pelo menos 10 vezes mais rápida que o de Lula na Lava Jato", escreveu em seu perfil no X.
Depois, fez longo pronunciamento voltado à imprensa, em que disse que as acusações contra ele são "muito graves" e "infundadas".
Os oito réus
Neste primeiro momento, foram analisadas denúncias contra oito investigados, que agora se tornaram oficialmente réus da ação penal. Para a PGR, os membros deste grupo formam o "núcleo crucial" da trama golpista investigada. São eles:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente
- Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa);
- Anderson Torres (ex-ministro da Justiça);
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa);
- Augusto Heleno (ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional);
- Ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos;
- Ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, atual deputado federal;
- Tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, que fechou acordo de delação premiada.
Os crimes
A denúncia da PGR aponta que Bolsonaro e seus aliados teriam cometido cinco crimes:
- Tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito
- Golpe de Estado
- Organização criminosa armada
- Dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima
- Deterioração de patrimônio tombado
Os próximos passos
O recebimento da denúncia dá início à tramitação da ação penal contra os acusados. Agora, passa a ser analisado o mérito das acusações criminais, ou seja, se os réus serão declarados culpados ou não das imputações feitas pela PGR.
Com a citação dos réus, se inicia a fase de instrução da ação penal. Nesse período, as duas partes — acusação e defesas — iniciam a chamada produção de provas, como o arrolamento de testemunhas.
Na sequência, os próprios réus prestarão seus depoimentos. Por fim, há ainda a apresentação, por escrito, das alegações finais das duas partes, e então a Primeira Turma do STF proferirá a sentença.
A esta decisão poderá ser apresentado um recurso. Este recurso, então, seria analisado pelo plenário do STF, que poderá manter ou reformar a decisão da Primeira Turma. No plenário, formado pelos 11 ministros, também prevalece a maioria simples para definir o julgamento.
Não há uma previsão exata de quando a decisão final do julgamento de mérito das acusações deve ocorrer. Segundo se especula em Brasília, o STF deve julgar a ação até o final de 2025, antes do início do ano eleitoral em 2026.