
A cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que ficou conhecida como a mulher que pichou com batom a frase "perdeu, mané" na estátua da Justiça, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), disse em depoimento que à época desconhecia a importância da escultura e que foi induzida por outra pessoa que começou a escrever.
Segundo o depoimento dela, essa outra pessoa pediu que a cabeleireira continuasse "porque sua letra era mais bonita". Ela classificou o próprio gesto como "ilegal", disse que "feriu" o Estado Democrático de Direito e pediu perdão.
Ela foi ouvida pela Polícia Federal em novembro de 2024. Na quarta-feira (26), o STF levantou o sigilo da ação penal a que Débora responde. Com isso, as peças e o depoimento em vídeo da cabeleireira foram liberados. Débora foi presa em março de 2023, após participar dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
Depoimento
No depoimento, a mulher disse que foi induzida a pichar a frase "perdeu, mané" na estátua, que é uma referência à resposta que o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, deu a um bolsonarista que o abordou em Nova York contestando a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2022.
— Eu queria dizer que não foi premeditado. Sou cidadã de bem. Quando eu me deparei lá em Brasília, no movimento, eu não fazia a ideia do bem financeiro e do bem simbólico daquela estátua. Quando eu estava lá já tinha uma pessoa fazendo a pichação. Faltou talvez um pouco de malícia da minha parte. Porque ele começou a escrita e falou assim: 'Eu tenho a letra muito feia, moça, você pode me ajudar a escrever?' E aí eu continuei fazendo a escrita da frase dita pelo ministro Barroso — disse Débora.
Ela disse que não participou da destruição dos prédios públicos:
— Só fiquei na praça, estava tirando fotos. Achei os prédios muito bonitos. Apareceu esse indivíduo, que nunca vi na vida, falando pra mim e eu caí — afirmou Débora, que ainda diz que o calor do momento "alterou a faculdade mental" dela.
— Eu queria pedir perdão para o Estado Democrático de Direito. Estar aqui me fez refletir muita coisa. O país depende de hierarquias que precisam ser respeitadas. O Estado foi ferido com meu ato. Foi isolado, não pretendo repetir — completa
Débora dos Santos não está sendo julgada apenas por pichar a estátua. Ela responde na Justiça por cinco crimes:
- abolição violenta do Estado Democrático de Direito
- golpe de Estado
- dano qualificado
- deterioração do patrimônio tombado
- associação criminosa armada
Julgamento em plenário virtual
A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) foi aceita pela primeira turma do STF em agosto de 2024, e o julgamento em plenário virtual começou na última sexta (21).
Na semana passada, a Primeira Turma do Supremo começou a julgar se Débora vai ser condenada ou absolvida.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, votou para condená-la a 14 anos de prisão — 12 anos e seis meses em regime fechado e um ano e seis meses em regime semiaberto ou aberto. O voto foi acompanhado pelo ministro Flávio Dino.
Em seu voto, Moraes afirmou que a denunciada “concorreu para a prática dos crimes, somando sua conduta, em comunhão de esforços com os demais autores, objetivando a prática das figuras típicas imputadas” e que “apagou e ocultou provas de sua intensa participação nos atos golpistas”.
Segundo a PGR ela também apagou mensagens de seu celular entre dezembro de 2022 e fevereiro de 2023 – o que a Polícia Federal considera uma tentativa de destruir provas.
Entre as outras provas apontadas pela PGR está a declaração da própria Débora de que se instalou no acampamento em frente ao QG do Exército, em Brasília, na véspera dos atos golpistas. De acordo com a denúncia, o acampamento era composto de pessoas mobilizadas para pedir intervenção militar.
O ministro Luiz Fux pediu vista (mais tempo para análise). Por isso, o julgamento da cabeleireira foi suspenso. Não há data para a retomada da votação.
Contraponto
Em nota à imprensa, a defesa da cabeleireira disse que o STF promove um julgamento "político e emocional" e conclamou que os ministros da Corte revejam as penas impostas a todos os réus pelos atos de 8 de Janeiro.
"Diante disso, exigimos que o Supremo Tribunal Federal reveja urgentemente as condenações desproporcionais e que se respeite o princípio da proporcionalidade das penas, evitando decisões arbitrárias que ferem os direitos e garantias individuais, não somente de Débora, mas de todos os réus do 8 de Janeiro", concluiu a nota da defesa.
*Produção: Camila Mendes