Em uma escalada de reações, integrante do poder Judiciário e o presidente da República, Jair Bolsonaro, vêm fazendo referências um ao outro cada vez mais fortes nos últimos dias.
Em um dos desdobramentos mais fortes, o presidente afirmou, na quarta-feira (4), que seria obrigado a "jogar fora das quatro linhas definidas pela Constituição" caso chegue a ele algo "fora dos limites" definidos pela Carta Magna.
A ameaça ocorreu depois que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autorizou a abertura de inquérito para investigar se os ataques de Bolsonaro à urna eletrônica constituem infração e do Supremo Tribunal Federal (STF) ter aceito incluir o presidente como na investigação sobre o disparo de fake news.
O contraponto veio nesta quinta-feira (5), quando o presidente do STF, Luiz Fux, cancelou a reunião que havia sido adiada entre os chefes dos poderes.
Abaixo, confira a escalada da tensão entre os poderes Executivo e Judiciário
Bolsonaro faz acusações sem provas em live
Em uma live exibida nas redes sociais em 29 de julho, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que iria apresentar "indícios" de fraude em eleições com uso da urna eletrônica. Sem provas, mostrou vídeos que apontavam supostos problemas nas teclas da urna e criticou a suposta exclusividade do Brasil no uso do sistema. Em vários momentos, Bolsonaro disse que a apuração dos votos será feita "pelos mesmos que tornaram o ex-presidente Lula (PT) elegível e que o tiraram da cadeia".
Na mesma noite, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou diversas checagens rebatendo pontos do discurso. Em redes sociais, a corte eleitoral também publicou desmentidos sobre as alegações de Bolsonaro. Um dos casos tratava de uma suposta fraude nas urnas em 2008 na cidade de Caxias (MA). Segundo o TSE, a Polícia Federal periciou as 10 urnas e não encontrou irregularidades.
Manifestantes vão às ruas
Em algumas cidades do país, ocorreram atos a favor do voto impresso no domingo (1º). Em locais como Brasília, São Paulo e Porto Alegre, um áudio de Bolsonaro foi transmitido por carros de som. O presidente voltou a criticar o STF e a dizer que "sem voto impresso não haverá eleições", o que já havia sido rechaçado por autoridades de outros poderes.
Fux reage a ataques
No discurso de reabertura das atividades do Judiciário, na segunda-feira (2), o presidente do STF, Luiz Fux, reagiu aos ataques dos últimos dias desferidos pelo presidente e, em tom contundente, disse que "os juízes precisam vislumbrar o momento adequado para erguer a voz diante de eventuais ameaças". Fux não citou o nome de Bolsonaro, mas o recado foi claro quando ele cobrou respeito às instituições e afirmou que a manutenção da democracia exige permanente vigilância.
Na mesma noite, o TSE abriu inquérito administrativo para apurar os ataques à legitimidade das eleições e solicitou ao STF a inclusão de Bolsonaro como investigado na apuração sobre a disseminação de fake news.
Moraes aceita pedido
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes atendeu o pedido, aprovado por unanimidade, de integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e determinou, na quarta, que o presidente Bolsonaro passe a ser investigado no inquérito que apura divulgação de informações falsas.
Os ataques, sem provas, feitos pelo presidente às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral do país são o alvo da investigação. Moraes é relator do inquérito das fake news, aberto em março de 2019 para investigar notícias fraudulentas, ofensas e ameaças a ministros da Corte.
Fora das quatro linhas
Após a decisão de Moraes, Bolsonaro disse, em entrevista ao programa Pingo nos Is, da Jovem Pan, que o inquérito sobre o disparo de notícias fraudulentas nasce sem qualquer embasamento jurídico.
— (A abertura) Está dentro das quatro linhas da Constituição? Não está. Então o antídoto para isso também não está dentro das quatro linhas. Aqui ninguém é mais macho que ninguém — disse.
Bolsonaro também acusou o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, de ter candidato para as eleições do próximo ano, bem como distorceu votos do ministro para atribuir a ele a defesa das drogas, do "direito das amantes" e da pedofilia.
— Tudo o que ele (Barroso) defende não se adequa a sociedade brasileira — disse Bolsonaro.
Reunião cancelada
Fux anunciou nesta quinta-feira (5) o cancelamento da reunião entre os líderes dos três poderes, inicialmente prevista para ocorrer nesta semana.
Em um duro e breve pronunciamento, o magistrado afirmou que "diálogo eficiente pressupõe compromisso permanente com as próprias palavras", em referência à conversa que teve com Bolsonaro, no dia 12 de julho, na qual o chefe do Executivo se comprometeu em moderar o discurso belicoso em relação aos ministros que integram a Corte, bem como cessar os ataques ao sistema eleitoral.