Dos 1.217 municípios brasileiros que seriam extintos com base em pacote econômico do governo federal, 18,73% estão no Rio Grande do Sul. O Estado lidera o ranking, com 228 cidades, seguido por Minas Gerais (223) e São Paulo (135), segundo levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Os dados da CNM são parecidos com os da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), que estima 226 municípios gaúchos fora do mapa, caso o projeto do Ministério da Economia saia do papel.
Conforme o texto, apresentado na semana passada, municípios com até 5 mil habitantes e arrecadação própria inferior a 10% da receita total serão incorporados a cidades vizinhas.
Para calcular a receita própria, a CNM usa o critério exposto no projeto do governo, levando em conta apenas IPTU e impostos sobre a transmissão de bens e de serviços. A Famurs fez o cálculo computando junto a esses tributos taxas e contribuições de melhoria — quando uma obra pública provoca valorização imobiliária.
Professor da Escola de Administração Pública da UFRGS, Aragon Érico Dasso Júnior diz que colocar esse projeto em prática sem ouvir as populações dos municípios atingidos é temerário, pois tira do debate os principais afetados pela medida. Dasso Júnior afirma que a reforma tributária é um fator que poderia melhorar a arrecadação das pequenas cidades, portanto, deveria ser tratada antes de discutir a extinção dessas localidades:
— Uma reforma tributária que desse mais autonomia aos municípios, que tivesse uma carga tributária maior aos municípios, me parece uma questão preliminar antes de a gente discutir qual a população adequada em relação a tamanho de um município no Brasil.
O presidente da Famurs, Eduardo Freire, afirma que a proposta traz impacto negativo, pois extingue municípios que “se sustentam e geram riqueza para o Estado como um todo”. No entendimento de Freire, o critério do governo federal para medir a sustentabilidade das cidades não é o mais adequado:
— Por exemplo, essas receitas próprias, IPTU, ITBI, ISS, são receitas irrisórias para esses municípios, com comunidades pequenas. Agora, se fosse considerada a questão do ICMS, do imposto de renda e outras receitas, a realidade demonstra que esses municípios se sustentam e ainda geram riqueza para o Estado e para a União.
Na avaliação de Freire, essa proposta dificilmente será aprovada no Congresso. A Famurs e outras entidades que representam prefeituras devem buscar diálogo com o governo para tentar barrar a medida.
Terceiro Estado com mais municípios no país
O Rio Grande do Sul é o terceiro Estado com o maior número de municípios, segundo dados da CNM. Com 497, só fica atrás de Minas Gerais (853) e São Paulo (645). Uma das explosões de emancipações no RS foi registrada no início da década de 1990. De 1992 a 1996, 164 municípios foram criados, de acordo com dados do Atlas Socioeconômico do Estado.
Além da Constituição de 1988, que facilitou o processo de emancipações, professor Dasso Júnior cita questões culturais para explicar o avanço no número de municípios no Estado ao longo dos anos.
— A gente tem, em relação aos pequenos municípios, dois grandes momentos. Um é o momento de colonização, notadamente europeia, que afeta sobretudo a Região Nordeste. Um estudo mais apurado poderia dizer quantos municípios advém dessa região. Também tem o processo de emancipação que se deu a partir da Constituição de 1988 — pontua.
O professor de Economia Adelar Fochezatto, da Escola de Negócios da PUCRS, diz que é difícil cravar se a medida prevista pelo governo é boa ou ruim, pois trata-se de um tema complexo. Como resultado positivo, Fochezatto cita a melhor alocação de recursos:
— Olhando estritamente sob o ponto de vista da gestão, como se fosse uma empresa, seria bom. Melhoraria a alocação de recursos, porque esses recursos que vão para esses municípios seriam usados de maneira mais eficiente.
Por outro lado, segundo o professor, o fim dessas pequenas cidades também pode ser desfavorável se for levada em conta a questão da equidade. A extinção acabaria encerrando a principal fonte de emprego dessas localidades, de acordo com o especialista:
— Imagina o setor público como uma indústria. Você estaria acabando com a principal indústria desses municípios, que é a que mais emprega nesses lugares. Se o município é distante de uma cidade maior, como é que fica? Não é só o tamanho do município que deve ser pensado. Tem de pensar também na localização dele — pondera Fochezatto.
O que prevê a proposta
- Municípios de até cinco mil habitantes terão de comprovar até o dia 30 de junho
- de 2023 sua sustentabilidade financeira.
- A sustentabilidade financeira do município será comprovado por meio de arrecadação própria de no mínimo 10% da receita total.
- Cidades com arrecadação inferior serão incorporados a algum dos municípios limítrofes, a partir de 1º de janeiro de 2025.
- O município com melhor índice de sustentabilidade financeira será o incorporador.
- Poderão ser incorporados até três municípios por um único município incorporador.
- O número de habitantes será apurado exclusivamente com base nos dados do censo populacional do ano de 2020.
Fonte: Ministério da Economia
Veja a evolução do número de cidades do RS ao longo dos últimos 210 anos: