Sancionado em 1974, o plano de carreira do magistério estadual nunca foi atualizado. A decisão do governador Eduardo Leite de propor a reformulação das regras — que será apresentada na tarde desta quarta-feira (9) ao Cpers, sindicato que representa a categoria — será a quarta tentativa de mudança.
Todas as vezes em que governantes tentaram modificar o documento — isso ocorreu nas gestões de Alceu Collares (PDT), Antônio Britto (então PMDB) e Yeda Crusius (PSDB) —, o Cpers resistiu às alterações (veja mais detalhes no quadro abaixo). Para o sindicato, o plano é um patrimônio, não apenas por garantir a progressão profissional, mas por assegurar direitos e estimular a qualificação.
Quando o texto entrou em vigor, 61% dos educadores da rede estadual careciam de formação superior. Passados 45 anos, 90% têm graduação e pós. Ou seja, o plano funcionou.
A questão é que, desde 2008, com a aprovação da lei do piso nacional da categoria, a estrutura da carreira é apontada como obstáculo ao cumprimento da norma federal. Isso porque o plano estabelece a remuneração básica como referência para todas as etapas da vida docente (que se divide em seis classes, com seis níveis cada). Sempre que o valor básico é reajustado, a alta repercute na totalidade da folha, inclusive em aposentadorias, vantagens e gratificações. Como a categoria é numerosa, o impacto é bilionário.
Para que ninguém ganhe menos do que o piso, a solução encontrada foi pagar uma parcela extra mensal, chamada de "completivo". A medida começou a ser adotada em 2012, por Tarso Genro (PT), e segue valendo até hoje, sob a justificativa de que não há dinheiro para a aplicação da regra de outra forma. O problema é que a verba adicional não incide no básico e isso originou uma enxurrada de processos — até fevereiro, havia 130 mil processos na Justiça.
Segundo estimativas oficiais, o passivo pelo descumprimento da lei já passa de R$ 34 bilhões. Com as modificações previstas, Leite planeja sustar o avanço dessa dívida e pagar o piso conforme manda a legislação. O desafio do governador será convencer o Cpers, na reunião desta quarta — prevista para as 14h, no Centro Administrativo do Estado —, de que não haverá mais prejuízos do que ganhos para os professores.
As três tentativas frustradas
1. Governo Alceu Collares (PDT)
Em 1994, a então secretária estadual de Educação, Neuza Canabarro, propôs um anteprojeto de lei que estabelecia, entre outras medidas, a extinção do nível 4 da carreira do magistério (composta por seis etapas). A iniciativa não foi bem recebida pelo Cpers.
Diante da polêmica com o sindicato, Neuza decidiu fazer um plebiscito entre os professores, nas escolas. Foi até para a TV defender sua proposta. Não deu certo. A consulta foi realizada em 5 de março daquele ano. Segundo dados oficiais, 58,5% dos educadores participaram do pleito e mais da metade rejeitou a alteração, que acabou ficando pelo caminho.
2. Governo Antônio Britto (então PMDB)
Em 1998, a Assembleia Legislativa aprovou, por 31 votos a 21, o projeto de um novo plano de carreira do magistério — que nunca sairia do papel. A ideia era reduzir os níveis da carreira (de seis para quatro) e a diferença entre os vencimentos no início e no fim da trajetória docente. Para convencer os mestres, a intenção do governo era dobrar o valor inicial, mas isso dependeria de lei complementar, que nunca se concretizou.
No ano seguinte, Olívio Dutra (PT) assumiu o Palácio Piratini e chamou Lúcia Camini, até então presidente do Cpers, para chefiar a Secretaria da Educação. Em novembro de 1999, a modificação sancionada pelo governo anterior foi revogada.
3. Governo Yeda Crusius (PSDB)
A mais recente tentativa de modificação do plano ocorreu em 2008. Secretária de Educação à época, Mariza Abreu enfrentou a revolta do Cpers ao propor transformações radicais — incluindo avaliação por desempenho, com provas de conhecimento como critério para promoção.
Mariza pretendia diminuir os níveis da carreira, mantendo três e transformando os demais em etapas em extinção, e pagar valores iniciais mais altos aos professores. Bateu de frente com o sindicato, que considerou a proposta prejudicial, e não conseguiu levar as ideias adiante. Sem o apoio público de Yeda, fragilizada por uma crise política, Mariza deixou o cargo em 2009.