Praxe entre novos presidentes, Jair Bolsonaro propôs uma nova agenda política ao chegar ao Palácio do Planalto, em 1º de janeiro. Visando uma guinada conservadora nos costumes e liberal na economia, assinou medidas provisórias, projetos e decretos, priorizando a pauta de costumes e mudanças nas aposentadorias. No entanto, passados sete meses, a velocidade das discussões não agrada ao governo. Entre as 40 principais propostas enviadas pelo Executivo, apenas seis foram aprovadas e, parte delas, com o carimbo do parlamento.
Enquanto a pauta favorável ao mercado foi abraçada pelos parlamentares, a pauta ideológica do Executivo não prosperou. A maior liberalidade em relação ao porte de armas, inicialmente definida por decreto, acabou sendo proposta em um projeto de lei pelo Executivo após críticas à iniciativa do presidente.
Em 2003, quando houve uma guinada à esquerda no país com a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência, a situação foi diferente. Entre 35 medidas prioritárias apresentadas pelo petista nos primeiros sete meses de governo, 25 foram avalizadas pelo Congresso.
Ex-presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS) afirma que a relação entre Executivo e Legislativo à época era positiva, segundo ele, pela experiência política e carisma de Lula. Questionado sobre a influência de casos que vieram à tona nas investigações do mensalão (pagamentos em troca de apoio) e da Operação Lava-Jato, o ex-parlamentar nega que o apoio tenha sido baseado em irregularidades.
— Quando estourou o mensalão eu nunca tinha ouvido falar de nenhum pagamento em troca de votações e (no caso da Lava-Jato) o governante não pode ser responsabilizado pelo que fizeram pessoas indicadas por ele — diz Maia.
Críticos dos governos petistas, aliados de Bolsonaro afirmam que a principal ação do presidente foi mudar a forma de relacionamento com o Congresso, sem o chamado "toma lá dá cá". Vice-líder do governo na Câmara, Coronel Armando (PSL-SC), opina que a atuação do Planalto frente às propostas encaminhadas ao Congresso faz parte de uma nova forma de fazer política.
— O papel do presidente é iniciar o processo. Se ele falar toda hora, pode dar a impressão de que está pressionando — sustenta.
Balanço
Propostas aprovadas (seis, ao todo)
Reforma da Previdência (PEC 6/2019)
Aprovada em primeiro turno pela Câmara, em julho, por 379 votos a 131. O início da votação do segundo turno está previsto para terça-feira, dia 6. Após, o texto seguirá para o Senado, onde passará por duas votações. O governo espera concluir a análise no Congresso até o final de setembro.
Reforma administrativa (MP 870/2019)
Foi a primeira medida provisória (MP) editada pelo governo, que reduziu o número de 29 para 22 ministérios. Aprovada por Câmara e Senado após acordo entre parlamentares e Planalto, no qual retirou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça e o devolveu ao Ministério da Economia.
MP Antifraude do INSS (MP 871/2019)
Aprovada por Câmara e Senado após acordo do governo com a oposição para mudanças na proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência.
Gratificação a servidores requisitados pela AGU (MP 872/2019)
Aprovada pela Câmara e pelo Senado.
Crédito extraordinário (PLN 4/2019)
Aprovado em sessão do Congresso, o projeto libera R$ 248,9 bilhões para pagamento de benefícios sociais e aposentadorias. Caso o governo honrasse os compromissos sem a autorização, o presidente poderia responder por improbidade administrativa, crime que levou ao impeachment de Dilma Rousseff.
Antecipação de honorários de peritos em ações do INSS (PL 2999/2019)
Aprovado pela Câmara, aguarda análise do Senado.
Principais propostas em tramitação
MP da Liberdade Econômica (MP 881/2019)
Texto que facilita a abertura e o fechamento de empresas no país, entre outras questões que alteram a relação de trabalho entre trabalhador e empregador. Precisa ser votada até 27 de agosto por Câmara e Senado para não perder validade.
Saques do FGTS e do PIS (MP 879)
Autoriza o saque de R$ 500 de contas ativas e inativas do FGTS e liberação do PIS. Ainda estabelece que contribuintes poderão sacar valores de contas ativas no mês de aniversário. Começou a tramitar no final de julho (na foto, Bolsonaro no ato da assinatura da MP no último dia 24).
Demarcação de terras indígenas (MP 886/2019)
Desloca a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura. No entanto, como o Congresso já havia derrubado a regra em outra MP, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou a mudança, mantendo a iniciativa com a Funai.
Pacote anticrime (PLs 881, 882/2019 e PLP 38/2019)
Apresentado em fevereiro pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro (foto), tem o objetivo de combater crimes violentos, de colarinho branco e corrupção. Houve críticas por ter sido desmembrado, deixando a proposta que criminaliza o caixa 2 em texto separado. Deverá ser alterado na Câmara. Propostas idênticas tramitam no Senado.
Porte e posse de armas (PL 3723/2019)
Encaminhado pelo governo depois que o Senado derrubou decreto que flexibiliza o porte de armas — a Câmara não chegou a apreciar o texto, pois Bolsonaro decidiu revogá-lo, ao sentir que seria derrotado, e apresentar nova proposta (na foto, festejo no ato da assinatura do decreto em maio). Sem previsão de análise.
Previdência dos militares (PL 1645/2019)
Traz novas regras para que os militares passem à reserva. Por criar novos benefícios, sofreu críticas pela disparidade da reforma da Previdência dos contribuintes civis. Previsão de votação no segundo semestre (na foto, entrega da proposta em março por Bolsonaro ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia).
Mudanças no Código de Trânsito (PL 3627/2019)
Proposta exclui multa para motorista que transportar criança sem cadeirinha (na foto, entrega do projeto a Maia). A suspensão do direito de dirigir só ocorreria aos 40 pontos na carteira nacional de habilitação (CNH) — hoje é 20 — e a renovação seria a cada 10 anos — atualmente, é cinco. Além disso, exclui o exame toxicológico de motoristas profissionais das categorias C, D e E. Sem previsão de análise.
Socorro a Estados (PLP 149/2019)
Oferece auxílio a Estados com grau de endividamento C, desde que governadores façam ajustes nas contas. O Rio Grande do Sul não seria contemplado, já que tem grau D, o pior na classificação do Tesouro Nacional, mas ainda poderá aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Previsão de votação no segundo semestre.
Autonomia do Banco Central (PLP 112/2019)
Tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Sem previsão de votação.
Limita a criação de conselhos e reduz obrigação de adesão de profissionais (PEC 108/2019)
Assim como a reforma da Previdência, a proposta precisa ser aprovada em dois turnos na Câmara e no Senado. Enfrenta resistência de entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Sem previsão de votação.
Principais MPs que caducaram
Contribuição sindical (MP 873/2019)
Sem acordo, a regra para que pagamentos de contribuição sindical fossem feitos somente por boleto acabou perdendo a validade.
Desburocratização (MP 876/2019)
Facilita a abertura e encerramento de pequenas e microempresas. Trecho acabou sendo incluído no MP da Liberdade Econômica.