Os embates que marcaram os primeiros meses da relação entre governo e Congresso impactaram no avanço da agenda de Jair Bolsonaro entre os parlamentares. Com o fim do recesso da Câmara e do Senado nesta terça-feira e a retomada da análise da reforma da Previdência, a expectativa recai sobre a relação entre os poderes. Nos últimos dias, o presidente apostou em declarações controversas e foi criticado até por aliados. Em resposta, manteve o clima bélico e voltou a mencionar a possibilidade de concorrer à reeleição.
Apesar do desafio de pavimentar um caminho para negociação, destravando a discussão de bandeiras de campanha, Bolsonaro não dá mostras de que irá mudar. Nesta semana, em entrevista ao jornal O Globo, justificou as atitudes extremadas com uma afirmação: “Sou assim mesmo”. Ainda sustentou que não baseia seu comportamento em uma estratégia e que se “estivesse preocupado” em se reeleger, não entraria em polêmicas.
A postura não é bem recebida no parlamento. Entre deputados, o entendimento é de que o sucesso das propostas do governo no Congresso andaram apesar da relação com o Planalto, tendo os parlamentares como fiadores.
Líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA) critica, indiretamente, a verborragia do presidente da República, exaltando o papel da Câmara na conclusão da votação da reforma da Previdência e ao propor o debate para o segundo semestre.
— A Câmara retoma seu protagonismo ao evitar as polêmicas e trabalhar pelo que realmente importa. Acredito que nenhum ruído vá atrapalhar as votações, pois sabemos do nosso papel no processo de recondução do País ao rumo do crescimento e dele não nos desviaremos.
A estratégia do Legislativo de liderar a agenda nacional tem no presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o principal fiador. Partiu dele a articulação para que o projeto de reforma tributária, prometido pela equipe econômica do governo, fosse apresentado antes pelo deputado Baleia Rossi (SP), líder do MDB na Casa.
— O governo tem pautas que a gente respeita, mas não são as pautas da maioria do Congresso. E a mesma eleição que elegeu o presidente, elegeu o parlamento — frisa o líder do Cidadania na Câmara, Daniel Coelho (PE).
Em outros episódios, parlamentares dificultaram a aprovação de temas vitais para o funcionamento da máquina governista. O centrão — grupo liderado por PP, DEM, PRB, PL e SD, que conta com cerca de 150 deputados — dificultou, por exemplo, a aprovação de crédito extraordinário para o pagamento de benefícios, como o Bolsa Família. Caso o Executivo realizasse o desembolso sem o aval, Bolsonaro poderia ser enquadrado em improbidade administrativa, mesma situação que levou ao impeachment de Dilma Rousseff.
Onyx acredita que relação será mais tranquila nos próximos meses
O chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, reconhece dificuldades na relação entre os poderes no primeiro semestre. No entanto, projeta maior tranquilidade na relação política nos próximos meses, mesmo que Bolsonaro não baixe o tom de suas declarações.
— O presidente é assim. A população gosta do jeitão dele. Todos amadurecemos de janeiro para cá. Foram erros e acertos. Hoje há relação de confiança e entendimento (com o parlamento) — destaca Onyx.
Apesar de ver projetos como o pacote anticrime, a flexibilização do porte de armas e as mudanças no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) patinarem na Câmara, o chefe da Casa Civil sustenta que o governo obteve as vitórias que precisava nos sete primeiros meses do ano. Para o segundo semestre, acredita que a proposta que revê o pacto federativo, reivindicação antiga de estados e municípios que ainda será apresentada, terá tramitação célere.
Outra pedra no caminho governista é a cobrança por explicações sobre vazamentos de conversas entre o ministro da Justiça, Sergio Moro, e procuradores da Operação Lava-Jato. Nos bastidores, há o entendimento que o fato fragilizou o ex-juiz.
Apesar do otimismo governista, deputados que defendem propostas do Executivo demonstram preocupação. O deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) acredita que as opiniões polêmicas do presidente atrapalham o próprio governo. O parlamentar é relator da medida provisória (MP) da Liberdade Econômica, que prevê a desburocratização na abertura e fechamento de empresas, além de mudanças em questões trabalhistas.
— Se o Bolsonaro parasse de atrapalhar, de brigar com a oposição, e deixasse as coisas andar, ele faria o melhor governo no Brasil. Mas ele insiste em manter a oposição viva, prefere ficar brigando com o PT.
Indicação para embaixada promete disputa ferrenha
Além dos temas que atendem ao eleitorado mais radical do presidente, uma outra iniciativa promete discussões ferrenhas no Senado. A indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para a embaixada brasileira nos Estados Unidos. Alvo de críticas ferrenhas da oposição e até de aliados, nos bastidores da Casa a aprovação é vista como uma tendência por senadores próximos a Bolsonaro.
Porém, integrantes do Executivo perceberam, com a reforma da Previdência, que o convencimento nem sempre fica limitado ao debate. Para evitar que as mudanças nas aposentadorias fossem avaliadas somente após o recesso, o governo prometeu a liberação de emendas e cargos aos parlamentares, expediente que deverá ser repetido em votações polêmicas.
Um dos vice-líderes do governo, Darcísio Perondi (MDB-RS) vê um ambiente mais favorável na relação do Planalto com o Congresso e destaca que os acordos feitos com os deputados estão sendo cumpridos.
— O clima está muito melhor. O governo está honrando todos os compromissos. As emendas estão sendo pagas e são raros os cargos que não foram cobertos — afirma o vice-líder do governo Darcísio Perondi (MDB-RS).