Um grupo de militantes, políticos de esquerda e ex-perseguidos pela ditadura militar (1964 a 1985) participou de protesto contra o golpe de 31 de março, na manhã deste domingo (31), em Porto Alegre.
O primeiro ato foi diante do memorial em homenagem a vítimas da ditadura no Parque Marinha do Brasil. Ele contou com a presença de deputados estaduais e federais, representantes de partidos de esquerda, do Partido Comunista do Chile, de movimentos dos direitos humanos do Estado e do Uruguai. No local, foram depositadas flores e lembrados nomes de mortos e desaparecidos.
A advogada Marília Benevenuto participou para exaltar a memória do pai, o médico Alberto Benevenuto, morto aos 50 anos, em 1978, militando do antigo PCB e que, entre 1964 e 1966, viveu exilado com a família no Uruguai
— Ele sofreu um atentado na BR-101, quando dirigia o carro. Perdeu o controle do veículo que se chocou com um ônibus em morreu. Até hoje, a causa do acidente é investigada — contou Marília.
Ao lado dela, esteve presente a psicopedagoga Nilce Azevedo Cardoso, 74 anos. Integrante da organização Ação Popular no anos de chumbo, ela revela que foi torturada em Porto Alegre e no quartel da Operação Bandeirante (Oban), em São Paulo.
Um dos organizadores do evento, o ex-deputado Raul Carrion, lembrou que vítimas da ditadura são lembradas todo os anos, mas neste, em especial, por conta de manifestações do presidente Jair Bolsonaro.
— Este ato demonstra uma grande unidade de força política das mais variadas orientações, em torno de uma grande causa: a defesa da democracia. É incompatível com estado democrático de direito a apologia de um golpe militar e a crimes cometidos pela ditadura militar como está fazendo o presidente — ressaltou Carrion.
Logo após as homenagens, o grupo liderado por Carrion se deslocou para a Avenida José Bonifácio, ao lado da Redenção, para uma caminhada, se juntando a dezenas de pessoas ligadas a partidos e movimentos de esquerda.
À frente da marcha, estava um grupo de mulheres vestidas de preto com máscaras sobre o rosto, com a inscrição "ditadura nunca mais". Logo atrás, políticos, lado a lado, carregavam uma faixa da Frente Gaúcha pela Democracia e Direitos Humanos.
Ao som de tambores, os manifestantes gritavam palavras de ordens como "democracia não combina com tirania" e "ditadura, censura, tortura, e 64 nunca mais".
À tarde, na Redenção, manifestantes, em grande parte trajando preto, concentraram-se convocados por um evento criado no Facebook. A partir das 15h, circularam diversas tribos no entorno do Monumento ao Expedicionário. A bibliotecária aposentada Nara Herter, 67 anos, confeccionou uma placa em EVA, sustentada por um cabo de rodo de limpeza, que dizia, de um lado, "Ditadura nunca mais", e, do outro, "Paz, justiça, democracia".
— Me oponho à ditadura, não quero que volte nunca mais. Foi uma barbárie com pessoas mortas, torturadas, e ele (o presidente Jair Bolsonaro) dizendo que a ditadura não existiu. Ele não estudou história? — condenou Nara, em referência à manifestação de Bolsonaro, dias atrás, recomendando que o golpe militar de 1964 fosse "comemorado".
Os irmãos Vitório Henrique Aires, sete anos, e Leônidas Demétrio Aires, oito, incentivados pelos pais, produziram cartazes especialmente para o protesto deste domingo. "Para não esquecer, para que não se repita!", lia-se em um deles. O outro exibia as palavras "Memória, verdade e justiça". Ambos tinham uma hashtag: #ditaduranunca+.
— Falamos com eles sobre a ditadura, a perseguição de várias pessoas. Foi um período bem difícil — disse o pai dos guris, o designer Marcelo Aires, 37 anos, acompanhado da esposa, a também designer Gabriela Pasuch, 32.
Além dos parques Marinha do Brasil e Redenção, a reportagem circulou por outras regiões da cidade, como Parque Moinhos de Vento, e não identificou celebrações em favor do golpe de 31 de março. Também monitorou redes sociais, nas quais não foram encontradas referências a locais de manifestações.
No Parque Moinhos de Vento, houve concentração de um grupo manifestando-se em favor da ditadura militar à tarde.