O juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sergio Moro, decidiu nesta segunda-feira (1º/10) retirar o sigilo de parte da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci. Em 12 páginas assinadas pelo réu, pelos seus advogados, por dois servidores da Polícia Federal (PF) e pelo delegado Filipe Hille Pace, Palocci narra suposto esquema de corrupção durante os governos do PT. Palocci se comprometeu a devolver R$ 37,5 milhões pelos crimes cometidos.
O depoimento de Palocci contendo as denúncias ocorreu em 13 de abril de 2018. A decisão de Moro foi tomada no processo da Operação Lava-Jato que apura suposto pagamento de propina que seria destinada à construção de sede do Instituto Lula. Além de Palocci, nesta mesma ação também é réu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O acordo foi homologado pelo desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da Lava-Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em 21 de junho de 2018.
"Dos depoimentos prestados por Antônio Palocci Filho no acordo, o termo de colaboração nº 1 (evento 11, arquivo termoaud3, do processo 5026427-19.2018.4.04.7000) diz respeito ao conteúdo do presente feito. Examinando o seu conteúdo, não vislumbro riscos às investigações em outorgar-lhe publicidade", decidiu Moro.
São três os documentos liberados pelo juiz: um traz uma síntese do que Palocci revelou à PF, outro lista as condições do acordo e o terceiro é a decisão de Gebran que homologa a delação.
Palocci está preso na Superintendência da PF, em Curitiba.
O que disse o ex-ministro na delação
No "Termo de Colaboração nº 1", Palocci narra suposto esquema de corrupção durante os governos PT. Ele explica inicialmente como funcionava a chamada "governabilidade".
"Que essa discussão a respeito da formação do governo praticamente se seguiu durante todos os governos do PT; Que colaborador cita a existência de dois grupos, um formado entre ele, Miro Teixeira, Luiz Gushiken e José Genoíno, dentre outros, que pretendia seguir um caminho programático. E outro grupo formado entre José Dirceu, e Marco Aurélio Garcia, às vezes também com Dilma Rousseff, que pretendia seguir um caminho pragmático".
O ex-ministro fala sobre a postura do partido no esquema.
"Houve desonestidade em toda a estrutura do PT e dentre todas suas lideranças; Que os ilícitos permearam todas essas relações".
Sobre o suposto esquema de propina, Palocci diz que as empresas contratadas para serviços na Petrobras "destinavam cerca de 3% dos valores dos contratos de publicidade ao PT através dos tesoureiros".
Em relação a Lula, afirmou que em fevereiro de 2007, logo após sua reeleição, o ex-presidente o convocou para uma reunião no Palácio da Alvorada, "em ambiente reservado, no primeiro andar, para, bastante irritado, dizer que havia tido ciência de que os diretores da Petrobras Renato Duque e Paulo Roberto Costa estavam envolvidos em diversos crimes no âmbito das suas diretorias". Diz que o então presidente perguntou a ele quem era a pessoa responsável pela nomeação dos diretores. Palocci, então, respondeu que era o próprio Lula. O ex-ministro também afirma que relembrou Lula de que "ambos os diretores estavam agindo de acordo com parâmetros que já tinham sido definidos pelo próprio Partido dos Trabalhadores e pelo Partido Progressista".
Conforme as declarações de Palocci, apesar do diálogo, "não tomou medidas posteriores para tirar os diretores dos cargos ocupados". Disse, ainda, que Lula, na mesma reunião, afirmou que caberia a Palocci gerenciar os recursos ilícitos que seriam gerados e o seu "devido emprego na campanha de Dilma Rousseff para a Presidência da República".
Palocci também cita o presidente Michel Temer na delação premiada. Afirma que o deputado Fernando Diniz, então líder da bancada do PMDB mineiro, com apoio do ex-ministro Henrique Eduardo Alves, do deputado cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e de Temer conseguiram fazer Lula "nomear Jorge Zelada para a diretoria (internacional da Petrobras)". E que "pode exemplificar que o PMDB, ao ocupar a Diretoria Internacional, tratou de promover a celebração de um contrato de SMS na área internacional com a Odebrecht com larga margem para propina, a qual alcançava cerca de 5% do valor total de 800 milhões de dólares, ou seja, 40 milhões; Que o contrato, tamanha a ilicitude revestida nele, teve logo seu valor revisado e reduzido de 800 para 300 milhões".
Segundo Palocci, "das mil medidas provisórias editadas nos quatro governos do PT, em pelo menos novecentas houve tradução de emendas exóticas em propina". Também que "em época eleitoral quitavam-se grandes acertos de corrupção". Segundo o ex-ministro, os grandes arrecadadores do PT foram Delúbio Soares, Paulo Ferreira e João Vaccari.
Sobre a relação com as empresas, afirmou que as pessoas que tratavam de doações de grande porte junto aos empresários foram ele próprio, "apenas no Governo Lula e enquanto e principalmente quando exerceu mandato de deputado federal, além de José Dirceu e Guido Mantega". Palocci também disse que nunca abriu contas no exterior para o PT, "mas sabe que a agremiação já fez isso sem utilizar o nome do partido e lideranças".
Benefício
Por revelar o suposto esquema de corrupção durante os governos do PT, Palocci terá redução de dois terços da pena de prisão a que for condenado e/ou terá a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos.
Obrigações
Em um dos itens do acordo, Palocci se compromete a identificar os autores, coautores e partícipes da organização criminosa, além de revelar a estrutura hierárquica do esquema. Também se compromete a entregar todos os documentos, fotografias, arquivos eletrônicos, entre outros, à Justiça.
Contrapontos
A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu, na tarde desta segunda-feira (1) à quebra do sigilo de trecho da delação de Antonio Palocci, feita pelo juiz Sergio Moro. Em nota oficial distribuída à imprensa, o advogado Cristiano Zanin Martins disse que a "conduta adotada hoje pelo juiz Sergio Moro apenas reforça o caráter político dos processos e da condenação injusta imposta ao ex-presidente". Confira a nota na íntegra.
A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) também criticou, por meio de nota, as afirmações de Palocci. "É estarrecedor (...) que uma delação não aceita pelo Ministério Público, e suspensa por um juiz de segunda instância, seja acolhida e tenha tido seu sigilo quebrado por um juiz de primeira instância. Sobretudo neste momento, em que o povo brasileiro se prepara para eleger o presidente da República, governadores, senadores, deputados federais e deputados estaduais", diz trecho da nota. Confira a nota na íntegra.