Em 2017, o governo de José Ivo Sartori (MDB) deu início às negociações com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) para levar adiante a adesão do Estado ao Regime de Recuperação Fiscal. Mas, desde então, Sartori e a equipe enfrentaram uma série de dificuldades para fechar acordo – e, nesta quarta-feira (28), a secretária-executiva do Ministério da Fazenda, Ana Paula Vescovi, afirmou que, sem a inclusão do Banrisul na lista de estatais a serem privatizadas, não há chance de concluir as tratativas.
O programa foi criado pela União para ajudar governos estaduais em crise a ajustarem as contas – em especial o Rio de Janeiro. A seguir, confira um resumo do plano apresentado e do que prevê o Regime de Recuperação Fiscal.
PERGUNTAS E RESPOSTAS
O que é o regime de recuperação fiscal?
É uma alternativa criada pela União para socorrer Estados em calamidade financeira em troca de contrapartidas. Os benefícios incluem carência no pagamento da dívida por três anos (prorrogáveis por mais três) e autorização para novos financiamentos. O Rio de Janeiro foi o único a aderir até agora. Com isso, conseguiu a suspensão de sua dívida e adiantou empréstimo de R$ 2,9 bilhões, que foi usado para colocar contas atrasadas em dia (o que é permitido pela lei que criou o regime).
Quais são as principais contrapartidas exigidas?
São várias contrapartidas. Confira as principais:
1) Privatização de empresas dos setores financeiro, de energia e de saneamento, entre outros, para a quitação de passivos.
2) Oferta de ativos como garantia para novos financiamentos.
3) Congelamento de salários de servidores e proibição de contratação de novos funcionários.
O que o governo de José Ivo Sartori (MDB) vinha buscando com o acordo?
Carência no pagamento da dívida com a União por pelo menos três anos, o que significaria fôlego ao caixa de cerca de R$ 4 bilhões ao ano, e aval para novo financiamento – para isso, ofereceria como garantia a CEEE, a CRM e a Sulgás e dividendos do Banrisul (a venda do banco, segundo Sartori, estaria fora de cogitação). Hoje, as parcelas da dívida já estão suspensas por decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), mas a avaliação, na Secretaria da Fazenda, é de que a medida pode cair se o acordo não for selado.
Por que sempre houve resistências à adesão ao regime no Rio Grande do Sul?
Os valores que não forem pagos à União não serão perdoados, ou seja, terão de ser honrados de qualquer forma no futuro. Só que, ao final do período de carência, a soma pendente será maior por causa da incidência de juros e correção. O custo disso, segundo a Secretaria da Fazenda, será de cerca de R$ 1 bilhão. Outro ponto negativo decorre dos novos empréstimos previstos, que acabarão aumentando a dívida com instituições financeiras. Há, também, críticas em relação às contrapartidas exigidas, consideradas excessivas, e ao fato de que o regime não solucionará a crise em definitivo.
Quais vinham sendo os argumentos de Sartori para prosseguir na negociação?
O governo reconhece que não é o melhor negócio, mas diz se tratar da única alternativa imediata para amenizar a crise. Conforme o Piratini, o custo da adesão (juro e correção da dívida) sairia "mais barato" do que o custo anual dos juros cobrados pelo uso dos depósitos judiciais para cobrir déficits (de R$ 960 milhões por ano). O Estado afirma ainda que, se for obrigado a voltar a pagar a dívida (em torno de R$ 280 milhões por mês), poderá entrar em colapso, atrasando ainda mais os pagamentos de salários e fornecedores, levando a uma bola de neve.
Em que ponto estão as negociações com a União e por que até agora não foram concluídas?
Em novembro de 2017, o Piratini apresentou ao governo federal um plano de recuperação fiscal especificando medidas de contenção que o Estado promete cumprir nos próximos três anos – essa é uma exigência legal para permitir a adesão e precisa passar pelo crivo do Ministério da Fazenda.
Em 20 de dezembro de 2017, o governador José Ivo Sartori e o presidente Michel Temer assinaram um "protocolo de acordo", que informaram ser o primeiro passo para a adesão.
Desde então, Sartori e a equipe seguiram negociando com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) os termos do plano para poder firmar, inicialmente, um "pré-acordo". Seria uma espécie de sinalização ao STF de que o Estado estaria no caminho da adesão para evitar a queda da liminar que suspende o pagamento da dívida. O problema é que, desde o início, a STN discordou de pontos do plano.
A dificuldade do governo Sartori de conseguir levar adiante as privatizações da CEEE, CRM e Sulgás contribuíram para isso. Outro ponto de divergência foi o Banrisul, cuja venda sempre foi imposta como condição pela STN. Também havia discordâncias em relação a dados fiscais do Estado, em especial em relação ao percentual de receita comprometido com pessoal e dívida.
Apesar disso, durante a campanha, o governador chegou a dizer que estava tudo certo para a assinatura desse pré-acordo, o que, até agora, não se concretizou. O governador eleito Eduardo Leite (PSDB) disse, durante a campanha, que pretende prosseguir nas negociações, por considerar a adesão fundamental para o Estado, mas com alterações no contrato. Além disso, ele prometeu não vender o Banrisul.
O PLANO DE RECUPERAÇÃO FISCAL DE SARTORI
Confira os principais pontos do plano apresentado por Sartori à União:
1) Freio no custeio da máquina
- Salários dos servidores estaduais não receberiam reajustes além da reposição da inflação até 2020 (com exceção dos aumentos da segurança pública, assegurados até 2018).
- Não seriam criados cargos ou funções nem haverá alteração de planos de carreira que resultem em aumento de despesa nesse período.
- Contratações seriam congeladas, exceto para a reposição em áreas essenciais como saúde, segurança e educação.
2) Manutenção de ICMS mais alto
- Prorrogação do aumento das alíquotas do ICMS, aprovado em 2015 e válido até 2018. Segundo o governo Sartori, a manutenção dos atuais índices a partir de 2019 representaria receita de R$ 12,6 bilhões até 2023, recurso vital para o Estado reequilibrar as contas.
3) Corte nos benefícios a empresas
- Redução de 10% no volume de isenções fiscais do Estado.
4) Fim do uso dos depósitos judiciais
- Usados pelo Estado como espécie de "empréstimo" para cobrir déficits desde 2004, os depósitos judiciais não seriam mais ser utilizados – o que já ocorre desde janeiro. Esses recursos pertencem a pessoas e empresas em litígio na Justiça e ficam depositados em uma conta do Judiciário até o fim dos processos, como garantia para o cumprimento das sentenças.
5) Oferta de ativos e privatizações
- Privatização de CEEE, Companhia-Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás, como contrapartidas para a obtenção de novo financiamento.
- Os dividendos que o Estado recebe do Banrisul, de cerca de R$ 150 milhões por ano, também seriam oferecidos como ativos à União para viabilizar a obtenção de empréstimo.
- O Banrisul, segundo Sartori, não seria privatizado ou federalizado.