Diante de empresários na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) nesta terça-feira (9), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) atacou o Auxílio Brasil aprovado no governo de Jair Bolsonaro (PL), defendeu que o país "retorne à normalidade" e enalteceu sua parceria com o ex-governador de SP Geraldo Alckmin (PSB). Ele também fez defesa enfática das urnas e do processo eleitoral.
— Como a gente pode viver em um país em que o presidente conta sete mentiras por dia? Que chama uma carta que defende a democracia de cartinha? Quem sabe a carta que ele gostaria de ter é uma feita por milicianos no Rio de Janeiro. E não uma carta feita por empresários, intelectuais defendendo o regime democrático, defendendo a urna eletrônica — disse Lula, que fez uma defesa enfática do atual processo eleitoral.
— Que negócio é esse de as Forças Armadas fiscalizarem as urnas? Os militares têm de fiscalizar nossas fronteiras — afirmou.
Sobre o Auxílio Brasil, Lula afirmou que o país está assistindo à "maior distribuição de dinheiro que uma campanha política já viu desde o fim do Império".
— Me preocupa se o povo aceitará pacificamente a retirada desses benefícios depois das eleições — disse.
Ao tratar de sua parceria com Alckmin, disse que a aliança é "uma das grandes novidades políticas desse país".
— Já fomos adversários. Esse jeitão dele bonzinho não foi tão bom na campanha. Eu tô com as canelas até agora machucadas — disse Lula, arrancando risos da plateia. — E eu e ele resolvemos relegar a segundo plano e compor uma chapa — afirmou o petista.
Alckmin ainda brincou:
— Caneladas passam, é preciso olhar para o futuro.
— Essa junção só pode fazer as pessoas entenderem que não aconteceria se nós não tivéssemos convicção da nossa responsabilidade. Até porque estamos pegando um Brasil um pouco pior do que o que eu peguei em 2003, com um agravante, que é a falta de credibilidade internacional — disse Lula.
O ex-presidente lembrou de seu relacionamento com José Alencar, que foi seu vice-presidente em dois mandatos e é o pai de Josué, presidente da Fiesp. O petista disse que Alencar era tratado como presidente, e não como vice, e prometeu a Alckmin: "Você também vai ser tratado assim".
O economista e ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), André Lara Resende, chegou à Fiesp acompanhando a comitiva do PT. Lula estava com o coordenador de seu plano de governo, Aloizio Mercadante, o candidato do PT ao governo do Estado de São Paulo, Fernando Haddad, o ex-chanceler Celso Amorim, o ex-governador do Piauí Wellington Dias e o ex-ministro Luiz Dulci.
Lula tem ampliado o diálogo com o empresariado de diferentes setores, para tentar desfazer o mal-estar entre atores econômicos com o PT. A ida da comitiva petista à Fiesp é um sinal desse novo momento. Antes, sob o comando de Paulo Skaf, a Fiesp patrocinou uma campanha contra medidas adotadas no governo Dilma Rousseff. O "pato da Fiesp", mascote da ação da entidade, tornou-se um símbolo dos protestos contra Dilma.
O bom relacionamento de Lula com Josué Gomes da Silva já fez com que ele fosse cotado para ser vice do petista na eleição de 2018. Na época, o empresário era filiado ao então PMDB. No ano passado, a Fiesp recuou da ideia de divulgar um manifesto em defesa das instituições — e oposição aos atos de 7 de setembro contra o Supremo Tribunal Federal que vinham sendo convocados por bolsonaristas. Neste ano, por outro lado, a entidade está na liderança de um movimento pela defesa da democracia e do processo eleitoral articulado por empresários e sociedade civil, que deve culminar com um ato no dia 11 de setembro na Faculdade de Direito da USP.
Alckmin agradeceu "a posição da Fiesp na defesa da democracia".
— As pessoas passam, as instituições ficam. O que precisamos é ter boas instituições. A nação é mais importante do que o governo. O governo é o braço político do Estado. A nação é nossa língua, nossa cultura, nossa religião. A luta dos que já morreram. A nação assinou a carta aos brasileiros — disse Alckmin.
Alckmin afirmou ser necessário acompanhar os empresários em "preocupações" expostas pelo presidente da Fiesp, como a "competitividade", o combate à inflação e o crescimento com sustentabilidade.
— E, aqui, bem colocado, os acordos internacionais. O presidente Lula é um homem reconhecido no mundo inteiro e vai recolocar o Brasil na economia mundial — disse o ex-governador de São Paulo.
Lula passou a palavra a Mercadante e a Alckmin antes de discursar. Ao dar início a seu pronunciamento, Mercadante, que foi derrotado por Alckmin na disputa pelo governo de São Paulo em 2010, também elogiou a união do ex-tucano com Lula. A aliança, disse ele, é "improvável, imprescindível nesse momento do país e complementar".
Engrossando o coro de Lula, Mercadante também criticou o modelo do Auxílio Brasil.
— Uma das nossas elaborações é o novo Bolsa Família, que é muito melhor do que essa compra de voto que estamos vendo — afirmou.
Em seu discurso, Mercadante ainda afirmou ser inegociável a presença de políticas sociais de combate à fome e à pobreza no governo.
— Precisamos de um programa de renda exitoso como foi o Bolsa Família — disse.
O ex-ministro também pregou que o país volte a investir em infraestrutura, amplie investimentos na área de tecnologia e falou sobre a necessidade de ter uma agenda econômica sustentável. Mercadante voltou a defender o papel do BNDES para que a indústria retome seus investimentos.
O ex-ministro ainda disse que o BNDES deve aumentar sua presença nos investimentos para micro e pequenas empresas, e também no fomento de concessões. E ressaltou que o PT é favorável às concessões à iniciativa privada, e às parcerias público-privadas.
— Nós fizemos 10 vezes mais concessões do que o governo FHC e três vezes mais que Bolsonaro e ele pegou o modelo pronto que nós fizemos — disse.
Lula já esteve na Fiesp em julho, para um almoço organizado por Josué Gomes da Silva. Na ocasião, o encontro foi reservado com nomes do empresariado de diversos setores — não apenas do industrial. A reunião desta terça-feira faz parte das rodadas de conversas que a Fiesp tem organizado com todos os candidatos à Presidência. Bolsonaro havia confirmado participação no dia 11, mas cancelou a presença e não remarcou nova data.