Enquanto almeja a tão aguardada renovação na política — prometida por ambos os polos que disputam o segundo turno —, o eleitor vê algumas mudanças no cenário já garantidas pelas eleições de 2018. Se antes o tempo de TV e rádio e a quantidade de partidos em uma coligação eram sinônimos de votação expressiva, atualmente não garantem bom resultado nas urnas.
Outra quebra de paradigmas é com relação à forma de financiamento de campanha, que, na teoria, priorizou nomes com mandato em exercício, mas, na prática, mostrou-se ineficiente para garantir a reeleição. Evitar falar em pautas-bomba, ou encobrir posicionamentos polêmicos, também não adiantou. Com a internet, os concorrentes ou a própria imprensa se encarregaram de revelar como pensam os postulantes.
Menor peso do tempo de TV
Uma das surpresas após o resultado do primeiro turno foi a votação conquistada por Geraldo Alckmin (PSDB). O tucano, cabeça de chapa na maior coligação que disputava o Planalto (PSDB, PP, PTB, PSD, SD, PRB, DEM, PPS, PR) e, consequentemente, com maior tempo de propaganda na mídia tradicional (5min32s), conseguiu apenas 5.096.277 votos válidos (4,76%). Para se ter ideia, Jair Bolsonaro (PSL), presidenciável mais votado com 49.275.358 votos válidos (46,03%), tinha apenas oito segundos para expor seus projetos em rádio e TV.
Fernando Haddad (PT), que também passou para a segunda etapa do pleito, conseguiu 31.341.839 votos (29,28%), dispondo de dois minutos e 32 segundos. Haddad e Bolsonaro priorizaram a web para disseminar seus projetos. Bolsonaro, por estar impossibilitado de fazer corpo a corpo em razão da facada que tomou em 6 de setembro, apostou suas fichas na rede mundial de computadores.
— Tempo de TV não elege ninguém, apenas ajuda a eleger ou reeleger. No contexto do século 21, tem outros instrumentos, como redes sociais. Pega o candidato que lidera as pesquisas, por exemplo: ele tinha quase nada de tempo na televisão, mas dominou as redes sociais. Outra questão é que houve concorrentes que fizeram pré-campanha há tempos (desde o fim da Reforma Política de 2015, candidatos podem realizar pré-campanha desde que não peçam explicitamente por voto) — analisa o professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas.
— Outro fenômeno que é paradoxal, e que o tempo vai mostrar se é verdadeiro, é que o eleitor que veio das mídias sociais tem se mostrado mais fiel do que o da TV, que muda de opinião — acrescenta Caldas.
Alta taxa de renovação
Na Câmara dos Deputados, outro resultado inesperado: o índice de novos ocupantes para as cadeiras da Casa foi o mais alto em 20 anos, superando 50%. Desde o pleito de 1998 que um número tão expressivo de novos deputados não ganhava o direito de ser empossado — mesmo que a regra eleitoral aprovada em 2017 favorecesse quem já cumpria mandato. Isso porque, com a proibição que empresas dessem dinheiro às campanhas, foi criado o fundo partidário com recursos públicos (R$ 1,7 bilhão neste ano) para financiar a disputa. Essa verba foi distribuída aos postulantes pelas cúpulas de cada partido, que, em geral, deram mais atenção a políticos que já tivessem visibilidade, principalmente aqueles com função parlamentar em andamento.
O Senado teve uma renovação ainda maior, com índice de 85%. Das 54 vagas disputadas, 46 foram preenchidas por nomes que não eram senadores até o momento. Entre aqueles que não tinham mandato e ganharam a eleição para representar seus Estados a partir de 2019, quatro já passaram pela Casa. Já 22 integraram o Congresso em algum momento de suas trajetórias políticas. Entre os senadores que assumem no ano que vem, 20 são realmente neófitos, sendo que nove deles foram eleitos pela primeira vez na vida.
— O efeito mais cruel da renovação foi no Senado, onde famílias tradicionais perderam postos. O eleitor usou e abusou da possibilidade de renovar, algo que é mais fácil em uma eleição majoritária, em que se tem de escolher A ou B — ressalta Caldas.
Punição da neutralidade
Ocultar posicionamentos sobre temas antipáticos aos eleitores também foi uma estratégia que não funcionou. Pegando como exemplo os dois concorrentes a mandatário do país no segundo turno, ambos tentaram se desvencilhar de pechas antigas ou pejorativas. Bolsonaro buscou evitar o rótulo de preconceituoso, e Haddad de ser pau-mandado de Lula.
— O passado do PT está mais próximo do que o de Bolsonaro, que costuma ser ligado ao movimento de 64. O impeachment da Dilma é recente, tem o mensalão também. Evocar o passado é mais prejudicial ao Partido dos Trabalhadores — avalia Caldas.