A sequência de cinco homicídios em seis dias gerou um alerta entre as forças de segurança pública em Bento Gonçalves. A onda de crimes remete aos anos de 2018 e 2019, quando a Capital do Vinho teve 52 assassinatos e apareceu como a cidade mais violenta do interior gaúcho na comparação proporcional de crimes x número de habitantes.
Agora, novamente, as disputas do crime organizado por territórios para a venda de drogas explicam o número elevado de mortes.
As forças de segurança tratam como público e notório que existe uma guerra de facções e, por isso, homicídios irão acontecer. O conflito envolve uma organização criminosa vinda do Vale do Sinos e uma aliança entre traficantes locais.
— Voltou essa ameaça dos homicídios resultante do tráfico de drogas. São brigas de facções pelo domínio da venda de drogas. A nossa visão é que todos estes 14 homicídios têm relação com o tráfico, inclusive estes mais recentes que ainda estão em investigação. Mais uma vez, Bento fica com essa imagem de ser uma cidade violenta e dominada por uma briga de facções. Temos operações em andamento para diminuir essa violência e estancar crimes que amedrontam a sociedade e a região de uma forma geral — opina o delegado Álvaro Becker, da 2ª Delegacia de Polícia da cidade.
Após seis anos consecutivos de aumento dos homicídios e mais de 50 assassinatos em 2018 e 2019, a mobilização policial na Capital do Vinho conseguiu reduzir as mortes violentas pela metade no ano passado — foram 25 casos. A solução foi temporária. Em menos de quatro meses, 2021 contabiliza 14 assassinatos — um aumento de 75% na comparação com o mesmo período do ano passado.
— Com certeza, há uma tendência de aumento em razão de movimentos destas facções. É sintomático esta diferença de fevereiro e março (dois homicídios) e janeiro e abril (12 homicídios). Monitoramos essa guerra de facções pelo serviço de inteligência e acreditamos que logo terá uma tendência de queda. Pelo tamanho de Bento Gonçalves, está dentro da média dos últimos anos — corrobora o delegado regional da Serra, Cleber dos Santos Lima.
As ações policiais acontecem, com patrulhamento, apreensões e recomendação transferências de líderes presos, mas é uma questão de tempo para a facção se reorganizar e retomar a violência de suas práticas criminosas, como indicam os números.
— Pelo controle que temos, a maioria das vítimas participava de uma ou de outra organização criminosa. É uma troca de homicídios (entre eles). Às vezes, um caso de vingança resulta em quatro mortes, como foi em janeiro (chacina no bairro Municipal). É um crime que afeta totalmente os índices. Temos os outros índices em redução, principalmente os assaltos, o que destoa são os homicídios. Essa disputa entre os criminosos tem uma continuidade — comenta o major Luís Fernando Becker, comandante do 3º Batalhão de Policiamento em Áreas Turísticas (3º BPAT).
Na comparação deste primeiro trimestre com o mesmo período do ano passado, a Brigada Militar (BM) de Bento Gonçalves apreendeu mais armas — 15 contra 6 — e mais drogas — 1,5 quilo contra 513 gramas . Entre janeiro e março, foram 99 prisões em flagrantes — 52% mais do que o ano passado. A eficiência aumentou, mas não foi capaz de resolver os crimes contra a vida.
— Chegamos ao ponto de descobrir uma rixa, de um foragido que estava prometido de morte, fazer ações para capturar ele e devolver ao sistema penitenciário. Evitamos que fosse mais uma vítima. É um trabalho mais específico, que busca estas ações pontuais. Também temos atuado em tentativas de homicídio com muita força para prender os criminosos que participam deste tipo de ações — aponta o major Becker, citando uma perseguição após um tiroteio com dois baleados no bairro Tancredo Neves que terminou com um suspeito morto em Garibaldi.
Ampliar monitoramento é proposta
As discussões por uma solução contra as guerras do tráfico acontecem em âmbito estadual nos encontros do programa RS Seguro. A estratégia reúne as forças de segurança das 23 cidades gaúchas mais violentas para compartilhar experiências e planejar operações e destinação de recursos. Bento Gonçalves foi incluída no programa em julho do ano passado.
Uma das medidas para a redução de homicídios é a transferência de lideranças para cadeias mais distantes. Em um ambiente onde não tem influência, esses criminosos têm mais dificuldades para se comunicar com os comparsas lá fora. Entretanto, essa alternativa é de complicada execução diante da superlotação do sistema penitenciário gaúcho e brasileiro.
Uma ideia debatida neste momento vem da Secretaria Municipal de Segurança. A pasta está sob a liderança do tenente-coronel da BM Paulo César de Carvalho, que tem um pré-projeto para ampliar o sistema de videomonitoramento.
— Estamos reavaliando o sistema e queremos aumentar o número de câmeras em curto prazo. Estamos em fase de pré-projeto, buscando um número ideal e discutindo com o grupo de gestão integrada. Também procuramos incluir uma inteligência artificial para reconhecimento de placas e foragidos. Para identificar veículos já temos algumas, mas são poucas, infelizmente. Agora, queremos esta leitura facial em pontos estratégicos.
O secretário municipal argumenta que os homicídios são praticados com veículos roubados ou furtados, o que este software de reconhecimento poderia identificar e alertar aos PMs antes de o homicídio acontecer. Outro ponto destacado por Carvalho é que os assassinatos são praticados pelos mesmos criminosos. Assim, as câmeras facilitariam a identificação.
— O homicídio não tem patamar aceitável. A ideia é sempre diminuir. A prefeitura sempre se coloca a disposição para ajudar no que for possível para as forças de segurança darem esta resposta imediata. Precisamos construir soluções e as conversas são constantes — complementa.
Assassinatos por ano em Bento Gonçalves
2011: 16
2012: 16
2013: 15
2014: 20
2015: 21
2016: 28
2017: 34
2018: 52
2019: 52
2020: 25
2021: 14 (até o dia 15 de abril)