A trajetória da família Salatino está diretamente ligada à evolução do setor têxtil em Caxias, vide a imediata relação do sobrenome com a malharia fundada oficialmente em 1946. A história do empreendimento, porém, teve início duas décadas antes. Foi quando o filho de imigrantes italianos Salvador Salatino chegou a Caxias como caixeiro viajante - o pai, Antonio Salatino, era natural da Calábria e havia migrado para o Brasil ainda em 1882.
Um resumo desse percurso ganhou as páginas do álbum Caxias do Sul - A Metrópole do Vinho, publicado em 1957 pelo jornalista Duminiense Paranhos Antunes. O texto “Vultos do Passado” detalhou aqueles primórdios:
“Salvador Salatino nasceu em 1894, em Porto Alegre, onde se fez moço e teve o aprendizado do trabalho no comércio, como caixeiro que foi por alguns anos na antiga Casa Carvalho. Nesse estabelecimento conheceu a jovem Marieta Silveira, da qual se enamorou e foi correspondido. Em 1920, Salvador Salatino contraiu matrimônio com a referida moça, vindo a seguir para Caxias, onde iniciou sua atividade como viajante. Econômico, ajudado pela jovem esposa, reuniu algum capital e com ele se fez comerciante, estabelecendo-se na cidade. Por uma fatalidade, em 1926 seu estabelecimento foi presa de um incêndio, perdendo Salvador Salatino tudo quanto havia ganho naqueles anos”.
Na voragem das chamas
O incêndio em questão foi detalhado na edição de 27 de novembro de 1926 do jornal “Correio Colonial”. A notícia informava que “Caxias continua atravessando a era do fogo”, vide um sinistro naquela mesma semana junto à Estação Férrea - quando uma pilha de tábuas ardeu em chamas durante a madrugada.
“E, na noite imediata, novo alarme, à 1h30min, trazia para a rua grande (a Júlio) parte da população. Desta vez, porém, o sinistro assumia proporções assombrosas, elevando-se as chamas a grande altura, o que facilitava que o mesmo fosse avistado de enorme distância. O prédio que ardia rapidamente era a casa comercial do sr. Salvador Salatino, situada à Rua Júlio de Castilhos, esquina da Visconde de Pelotas, portanto no coração da cidade. O sr. Salatino, que com sua família residia na parte superior, foi despertado com o arrombamento das portas do prédio e com fortes pedradas nas janelas do quarto de dormir. Procurando a escada para sair, esta se achava envolta pelo fogo, fazendo-se mister o emprego de escadas portáteis, pelas quais a família Salatino desceu para a rua”.
Confecções, chapéus e fazendas
Conforme o texto de 1926, numerosos populares, auxiliados por “praças” da polícia municipal e pela turma do Tiro de Guerra 248, começaram a retirar para a rua as mercadorias que se encontravam nas prateleiras:
“O capital existente da Casa Salatino era avultado, sendo avaliado em cerca de 300 contos, constando de fazendas, modas, confecções, artigos para homens e senhoras, chapéus e gêneros coloniais e estrangeiros. Grande parte das mercadorias foi retirada, ficando alguma avariada, devido à confusão e à ação da água. Uma hora depois de constatado o incêndio, só restavam da Casa Salatino as paredes mestras e um montão de cinzas”.
Não se sabe ao certo como deu-se a reforma do imóvel. Dois anos depois, porém, uma notícia no jornal “O Regional” de 2 de abril de 1928 destacava que “ativam-se os preparativos para a inauguração da Casa Salatino, no prédio situado no entroncamento das ruas Júlio de Castilhos e Visconde de Pelotas, há pouco adquirido especialmente para esse fim”. Completava a nota:
“O sr. Salvador Salatino, proprietário do estabelecimento, está realizando importantes reformas no aludido prédio, que apresentará agradável aspecto”.
É exatamente esse aspecto que vemos no antigo cartão-postal reproduzido mais acima, com as janelas e portas tomadas de mercadorias. Detalhe 1: o postal foi impresso a poucos metros dali, na não menos lendária tipografia da Casa Saldanha, na esquina em frente. Detalhe 2: o casarão, após algumas mudanças na fachada, atualmente abriga a Joalheria Beretta. Reconheceu?
Leia mais
A trajetória da antiga Malharia Nilza
Guerino Sanvitto e a Malharia Jane em 1950
Tecelagem Irmãos Panceri em 1948
Ver para crer
Acima e abaixo, dois anúncios da Casa Salatino e da posterior Malharia Salatino - ainda quando ambas funcionavam na esquina da Júlio com a Visconde. A mudança para o prédio da Rua Garibaldi (atual Cartório Eleitoral) deu-se somente em 1953, ano da inauguração das novas e modernas instalações.
Ah, sim: o “reclame” em italiano, publicado na edição de 24 de janeiro de 1925 do jornal Correio Colonial, não perdia tempo e dialogava diretamente com os coloni: “preço sem medo da concorrência” e “ver para crer”.
Leia mais
Anna Saldanha: precursora do espiritismo em Caxias do Sul
Mistério em centro espírita de Caxias: onde estão os restos mortais de Anna Saldanha?
Os possíveis caminhos do corpo de Anna Saldanha, precursora do espiritismo em Caxias do Sul
Lanifício Gianella em imagens e lembranças
Lanifício Gianella: um século de história
Lanifício Gianella e outros anúncios na estreia do Pioneiro em 1948
Ranchos no Lanifício Gianella em 1941
Lanifício Gianella na Festa da Uva de 1965
O falecimento de Ermelinda Viero Gianella em 1969