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João Spadari Adami, o barbeiro dos negros

Confira uma crônica inédita do historiador, destacando um episódio de discriminação racial ocorrido nos anos 1950

Rodrigo Lopes

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Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami / divulgação
João Spadari Adami foi historiador, cronista, barbeiro e alfaiate

Uma das atrações do evento Uma Noite no Arquivo, nesta sexta, a exposição Coisas que o tempo empoeirou: crônicas de João Spadari Adami tem como destaque um texto de Adami nunca publicado em jornais. Trata-se da crônica O Barbeiro dos Negros, em que o autor detalha um episódio de discriminação racial envolvendo um dos maiores jogadores da história do futebol gaúcho: Osmar Fortes Barcellos, o Tesourinha (1921-1979).

Era março de 1952, e a imprensa regional repercutia o fato de o Grêmio oficializar a participação de atletas negros a partir da contratação de Tesourinha – o craque, que defendia o Club de Regatas Vasco da Gama, no Rio de Janeiro, regressava ao futebol gaúcho.

Primeiro esportista negro consagrado a vestir a camisa tricolor na era profissional do time, Tesourinha estreou marcando dois gols na vitória de 5x3 sobre o Juventude. Foi no dia 16 de março de 1952, na antiga Quinta dos Pinheiros, em Caxias. A véspera, porém, reservou um encontro casual, cuja história vem a público agora, 72 anos depois.

SEM DISTINÇÃO

Tesourinha e o goleiro Ivo buscavam uma barbearia nas imediações da então Praça Rui Barbosa (Dante Alighieri). É nesse momento que entra em cena o barbeiro, alfaiate e historiador João Spadari Adami (1897-1972). Confira parte da crônica:

“Foi numa manhã de um sábado que dois moços, um de epiderme branca e um de dita preta, pararam na porta de minha barbearia. Tendo o primeiro deles me perguntado se eu servia gente de cor. Respondendo-lhe, eu, que não fazia distinção entre brancos e pretos, conquanto fossem elementos dignos de ser atendidos. Eu pergunto, disse o cidadão de pele branca, porque estivemos numa barbearia ali perto do Cine Central, Salão Avenida, e não quiseram cortar a barba deste meu companheiro”.

Revista Manchete Esportiva / reprodução
Apelido “Tesourinha” surgiu de um bloco carnavalesco chamado “Os Tesouras”, do qual o menino Osmar fez parte

OUTROS CASOS

João Spadari Adami não recusou o atendimento e tomou conhecimento de que havia cortado a barba do célebre Tesourinha apenas na tarde daquele sábado. O episódio, porém, não foi um fato isolado.

O barbeiro ainda descreve na crônica outro ocorrido similar, afirmando que “naquela época, gente de cor, em nossa cidade, era sistematicamente rechaçada na quase totalidade das barbearias. E, quiçá, fosse eu o único barbeiro a atender gente de cor”.

O CRONISTA

A exposição Coisas que o tempo empoeirou: crônicas de João Spadari Adami é organizada pela servidora municipal Pâmela Cervelin Grassi, da Unidade Arquivos Privados do Arquivo Histórico Municipal, e busca destacar a faceta de cronista do patrono da instituição. 

O registro citado é um texto datiloscrito, com rasuras, correções e acréscimos, materializado no verso de um papel reaproveitado (foto abaixo). Um documento singular, que testemunha as experiências vividas por pessoas negras na década de 1950 em Caxias.

Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami / divulgação
A crônica original, preservada no acervo do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami

AGENDE-SE

O quê: Uma Noite no Arquivo.
Quando: nesta sexta, dia 6, a partir das 18h30min. A exposição é permanente e pode ser conferida de segunda a sexta, das 10h às 16h.
Onde: Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami (Av. Júlio de Castilhos, 318 - Caxias do Sul).
Quanto: entrada franca.

PARCERIA

Informações desta página são uma colaboração do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

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