"Sempre que me acontece alguma coisa importante, está ventando”. Lembrei muito a frase de Ana Terra em O Tempo e O Vento, de Erico Verissimo, nos últimos dias. Não só pela expectativa/preparação para o ciclone que virou tempestade e felizmente não provocou estragos, mas pela simbologia dessa imagem. Do movimento que não pode ser parado. Do imponderável. Da força da natureza e da vida que segue, apesar das nossas vontades ou caprichos. Às vezes é o que nos falta: aceitar que as coisas são como são. Se elas não mudam, mudemos nós.
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Ainda uma variação sobre o mesmo tema: quem conseguiu dormir embaixo de cobertas quentinhas, alimentar-se e agasalhar-se, tinha uma casa para voltar e janelas para se certificar que estavam fechadas, não pode reclamar de quase nada. Depois de uma semana adoentada e de uma incomodativa surpresa familiar — com esperança de resolução —, percebi que a gente passa muito tempo pedindo e pouco tempo agradecendo. Mais do que isso: às vezes, nos distraímos com pequenos problemas, que um simples afastamento mostraria que estamos fazendo tempestade em copo d’água. Não vale deixar nenhuma resolução (do que possa ter solução) para depois, porque pode ser tarde. Me repetindo: a vida é agora, o presente é tudo o que temos.
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O frio chega e, com ele, as providenciais campanhas do agasalho. Embora pareçam uma síntese do altruísmo das pessoas, escondem um lado perverso. Já repararam que sempre há o pedido para que doem peças em “bom estado”? Isso é surreal, mas quem já recolheu peças doadas entende o porquê. Muita gente pega roupas que iriam para o lixo e doa, com aquele pensamento de que uma roupa rasgada é melhor do que nenhuma roupa. Cobertores com cheiro de xixi, blusas que não serviriam nem para pano de chão, meias sem pares, calças sujas... Difícil acreditar que em pleno 2022 algumas pessoas se achem melhores do que as outras — justamente aquelas que não o são.
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“Do lugar onde estou já fui embora”, versa Manoel de Barros no ótimo Livro sobre nada. Quem nunca ficou tempo demais, insistiu demais, tentou demais algo que estava fadado a terminar? E, ficando, insistindo, tentando, acabou deixando mais de si pelo caminho do que gostaria? Fez um investimento emocional que só serviu para se conhecer melhor. Aprender. Transcender. Às vezes, perder é quase ganhar.
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Falando com um amigo sobre um assunto que se tornou mais frequente na pauta, ele quis agradecer pelo espaço que o tema tem recebido. Tentei explicar que ele costumava trazer novidades e, com isso, ganhávamos todos. Relação de ganha-ganha deveria ser cada vez mais comum: todos construindo uma história, uma ideia. Mas, infelizmente, o que se vê ainda é o desequilíbrio, as pessoas acharem que para um ganhar, o outro precisar perder. No trabalho ou nos relacionamentos. Ou pior: perde-perde, com dois frustrados fingindo que está tudo bem. Afastemos os caranguejos.