As imagens gravadas por um motorista que trafegava pela Ponte Rio-Niterói no final da tarde de segunda-feira são impressionantes: um navio de grande porte à deriva se chocou contra a ponte por onde circulam milhares de pessoas diariamente. O impacto foi tão grande que fez a estrutura de uma das principais obras de engenharia do Brasil tremer.
Esse incidente é extremamente simbólico para entendermos como o Brasil está sempre ou preso por um fio ou à deriva, fadado à autossabotagem. Vamos aos fatos: segundo a Marinha, o navio graneleiro São Luiz é objeto de disputa judicial desde 2016, portanto há seis anos estava ancorado e abandonado na Baía da Guanabara. Aqui já temos o primeiro grande escárnio do sistema: a morosidade e a incompetência da justiça para resolver imbróglios. É inacreditável que um processo desses resulte em seis longos anos de espera para ser resolvido.
Entre as muitas coisas difíceis de entender neste país, uma delas é a lentidão do poder judiciário. Nem se pode justificar isso pela falta de recursos, visto que esse setor público sabidamente recebe verbas polpudas, está tudo lá no tal Portal da Transparência. Contudo, enquanto as consequências da inoperância da justiça abalavam as estruturas da Ponte Rio-Niterói e prejudicavam a rotina de milhares de cidadãos, a mais alta corte do judiciário estava reunida em Nova York para mais uma daquelas “palestras” e “seminários” no Exterior, prestando satisfações a sei lá quem numa festinha de autocongratulação bem longe daqui.
Quando – e como – os mais altos dignitários da corte vão começar a tomar reais providências para facilitar e agilizar o trabalho de juízes, promotores, defensores públicos, advogados, oficiais de justiça, delegados, inspetores e demais trabalhadores do poder judiciário? Desde quando é normal e aceitável que um processo se arraste por seis longos anos ou mais? Sempre causa revolta quando se lê a notícia de alguém que morreu antes que um processo judicial a seu favor fosse julgado ou quando um criminoso escapa impune porque seu crime prescreveu. E de quem é a culpa por isso se não dos altos escalões que se eximem de suas responsabilidades de gestão?
Em sua nota, a Marinha ainda informou que o vento forte naquele dia e o desgaste das amarras do navio com o decorrer dos anos causaram o incidente. Agora, engenheiros da empresa privada responsável pela ponte estão avaliando os danos e um “inquérito” será instaurado para identificar os responsáveis. Sabemos muito bem que não vai dar em nada: se houver algum prejuízo financeiro, a concessionária privada da ponte e seus clientes vão pagar por ele.
Enfim, só mais um exemplo de como a incompetência do Estado gera prejuízos ao setor privado e à população. Na verdade, estamos todos iguais ao navio que esteve ancorado esses anos todos: desgastados, abandonados e por um fio.