Infelizmente, vários acontecimentos dos últimos dias comprovaram a total veracidade de uma frase que tem sido atribuída ao escritor Ariano Suassuna: “A inteligência e o fanatismo nunca moram na mesma casa”. E onde o fanatismo reside, não há lugar para o bom senso, muito menos para os fatos e a capacidade de reflexão lógica e inteligente sobre eles.
Tem sido no mínimo deprimente acompanhar declarações de vencedores e de perdedores das últimas eleições, cada qual dentro de sua respectiva bolha, muitas beirando o delírio. Pior: ações e discursos contradizem totalmente o que – em teoria – se prega dentro de seus quadros e agendas. A incoerência é filha única do isolamento, porque parece não haver espaço para quem ouse discordar do que é dito, do que é feito e do que é divulgado dentro dos domínios dos fanáticos.
O filósofo e ensaísta Francisco Bosco, falando sobre essas hordas de fanáticos, observou o seguinte: “se os fenômenos da realidade ameaçarem entrar em choque com a experiência do prazer do grupo, a tendência é sacrificar a realidade, não o grupo. Isso aprofunda a polarização também, pois a recusa ao enfrentamento da realidade torna muito difícil encontrar espaços de intercessão e de diálogo.”
Faz tempo que muitos não conversam sobre política em busca de discussão de problemas e propostas de soluções, mas unicamente para saber qual é o “posicionamento” do interlocutor. Qualquer palavra dita meio fora de um roteiro pré-concebido e imediatamente somos rotulados: “fascista”, “esquerdista”, “isentão”, “bolsonarista”, “comunista”, “omisso”, “inimigo”. Aliás, uma das maiores atrocidades cometidas contra cidadãos brasileiros – anônimos ou famosos – foi a pressão para “se posicionar”, sendo que o voto é, segundo a Constituição, “direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei”.
Mas, na era do “new cabresto”, parece que virou obrigação revelar qual é o seu time neste jogo e ser julgado conforme sua escolha. Se alguém não “fizer o L” ou pendurar uma bandeira do Brasil na sacada, dentro de certos círculos será visto como pária. Parece que ninguém ainda viu que o problema está no jogo em si dentro desse interminável campeonato de Série B em campinho de várzea: faz muito tempo que a sociedade brasileira não tem uma vitória relevante que a conduza para a Série A.
O que mais me choca é a hipocrisia, é ver que sempre se coloca em primeiro lugar “quem” está tendo certas atitudes e proferindo certos discursos, em vez de se guiar por “o que” está sendo feito e dito. Onde estão os critérios? Onde realmente está o respeito às leis, à ética, à moral e à civilidade? Esse pode tudo desde que “meu lado” seja o vencedor é o que decreta derrotas acachapantes e contínuas para todo um povo. Na casa do fanatismo, nada se constrói, nada se reforma, nada se edifica: tudo se combate, se invade, se destrói.