Há várias coisas que me intrigam, mas uma delas é por que motivo certas histórias somem do noticiário ao passo que outros casos, às vezes menos importantes e menos trágicos, ficam dias e dias e dias sendo explorados à exaustão. Muitos fatos relevantes e graves simplesmente desaparecem dos artigos de opinião, são abandonados pelos comentaristas, não se tornam campanhas com “hashtags” e com engajamento de celebridades e formadores de opinião nas redes sociais.
Ninguém pediu perdão ao menino Fernando dos Santos Lopes, nem à sua família, nem aos seus amiguinhos de escola, nem à sua comunidade que certamente ainda está impactada pela morte do garoto de nove anos baleado na cabeça enquanto passeava de carro com o tio num domingo à tarde em plena luz do dia em Novo Hamburgo. Uma bala perdida – que segundo as primeiras (e talvez únicas) investigações foi resultante de um tiroteio entre facções de traficantes que se encontram em guerra ad aeternum – acertou a cabeça de Fernando no dia 16 de outubro. As últimas matérias na imprensa sobre o caso saíram no dia 18 de outubro, portanto há mais de uma semana. Depois disso e de algumas notas protocolares de pesar, silêncio.
Fico me questionando se alguma autoridade esteve presente no velório do menino. Se alguém que se engaja prontamente na internet com qualquer campanha “pela paz” fez ao menos uma prece por essa família dilacerada pela maior das injustiças e pelo maior dos terrores: perder uma criança. O pai do Fernando, Edison de Souza Lopes, deu declarações que são de esmigalhar o coração de qualquer um que ainda tenha amor e compaixão dentro de si. Ele disse: “Meu filho era perfeito. Uma criança desenganada pelos médicos quando recém-nascido pois nasceu prematuro. Era um menino alegre brincalhão, ele era lindo e me tiraram ele”.
Essa frase “me tiraram ele”, assim, na terceira pessoa do plural, usa um recurso da língua portuguesa para sujeito indeterminado, ou seja, quando não se sabe quem ou o que executou a ação exprimida pelo verbo. Na verdade, todos nós sabemos quem ou o que tirou esse menino muito amado da família dele. Nossa sociedade está doente de muitas formas, mas creio que o problema principal seja realmente a perda da noção do que realmente importa, do que é mais precioso.
Ao que parece, lamentar a morte de uma criança não conta pontos na atual escala de sinalização da virtude. Não dá engajamento, não serve como “beija-mão” de quem dita qual agenda se deve seguir dentro de um grupo, não dá audiência nem reconhecimento aos tais “formadores de opinião”, não faz bonito entre os ativistas de rede social. Perdão, Fernando. Na verdade, quem realmente importa – teus pais, teus amigos, teus professores, teus vizinhos, tua comunidade – jamais vai esquecer de ti. Fica bem, anjinho, cuida bem dos teus ali de cima.