Por 11 votos contrários e sete favoráveis, a Câmara de Vereadores de Passo Fundo rejeitou o substitutivo ao projeto de lei que determinava que as escolas públicas e privadas do município informassem pais ou responsáveis sobre "quaisquer atividades pedagógicas de gênero" a serem realizadas no ambiente escolar. A proposta havia sido apresentada pelo vereador Rodinei Candeia (Republicanos).
Na justificativa, o autor afirma que a matéria está baseada nos princípios constitucionais de defesa e no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). Candeia argumenta que o objetivo era "assegurar aos pais e responsáveis o direito de vedar a participação de seus filhos e tutelados em atividades pedagógicas de gênero, garantindo que eles tenham voz na educação de seus filhos".
"Importante ressaltar que este projeto não busca coibir qualquer manifestação livre, iniciativa livre ou outra liberdade de criação, produção e exibição de atividades no ambiente escolar. O objetivo principal é aproximar os pais e responsáveis do ambiente escolar, proporcionando-lhes o direito de serem informados de casos de atividades controversas ou de gênero apresentado aos seus filhos", afirma a proposição.
A votação atraiu manifestantes contrários e favoráveis, que, com cartazes, expressaram seus posicionamentos acerca da proposta, que também dividiu opiniões entre os parlamentares na tribuna. O vereador Leandro Rosso (Republicanos) não participou da sessão por estar cumprindo agenda em Porto Alegre. Já Gio Krug (PSD) estava na Câmara, mas não acompanhou da votação.
A empresária Franciele Kist foi uma das apoiadoras da proposta a acompanhar a atividade no plenário. Para ela, o projeto era muito claro, e apenas dava aos pais a oportunidade de saber quando os filhos teriam atividades relacionada ao tema e a opção de deixar as crianças participarem ou não.
— Nós, como pais, queremos apenas ser avisados, comunicados do que o meu filho vai estar aprendendo na escola. Não só nesse tema, como em todas as outras coisas, todas as outras coisas que estão ensinando dentro da escola. É essencial que os pais saibam. Quanto mais transparente for, melhor, quanto mais claro for, melhor. O Estatuto do Adolescente da Criança dá direito de os pais saberem o que vai ser passado na escola para os nossos filhos. Então, esse projeto é claro, ele é simples, a gente apenas quer ser comunicado — afirma.
Na semana passada, o CMP Sindicato, que representa os professores da rede municipal, divulgou uma nota de repúdio à proposta. Para a entidade, o projeto é inconstitucional e fere a liberdade dos professores.
— Muitas vezes os abusos que as crianças sofrem são identificados dentro do ambiente escolar. As escolas estão recebendo um público bastante diverso, famílias diferentes. E esses temas precisam ser abordados dentro da escola, até para que o preconceito não se amplie ainda mais. Os nossos alunos fazem parte de famílias onde são constituídas às vezes por pai e mãe, mas também por mãe e mãe, pai e pai. E essas dúvidas surgem dentro da sala de aula. Eu, enquanto professora, não tenho o que esperar para dar a resposta. Eu preciso tratar desse assunto, para que essa criança seja respeitada e a sua família também — defende a diretora do CMP Sindicato, Geniane Dutra.
Na tribuna
Um dos vereadores que se posicionaram contrários ao projeto foi Professora Regina Costa dos Santos (PDT). A parlamentar classificou a matéria como inconstitucional e "eleitoreira".
— Quando a gente olha uma matéria desta, que nós temos que informar o que é dado em sala de aula, todos os senhores já têm esta informação. Entrem lá na base curricular de ensino, estão lá todos os temas transversais. Se algum pai não está sabendo o que está fazendo a escola do seu filho, pois bem, não está indo na escola o suficiente. Têm reuniões de pais que a gente não consegue ter quórum para fazer, tem que juntar todas as turmas para ter 40 pais — afirmou a vereadora.
Outra vereadora a se manifestar contrária ao projeto foi Eva Valéria, do PT. Na tribuna, a parlamentar lembrou que dados apontam que 80% dos casos de violências envolvendo crianças e adolescentes ocorrem dentro do âmbito familiar.
— A educação é o dever da família, do Estado e da sociedade. Os pais numa escola fazem a diferença. Tem grupos de pais, tem atividades, é ali que os pais têm o dever de participar. Todo início de ano é estabelecido o que vai ser ensinado nas aulas e fica à disposição dos pais. Estas informações ficam disponíveis (...) Qualquer um dos pais que tenha o mínimo de interesse pode saber, com antecedência, o que vai ser ensinado ao filho. Seja da esquerda ou da direita, vamos respeitar a educação, vamos respeitar as crianças que são violentadas inclusive na família, temos que ter responsabilidade — diz a vereadora.
Na outra ponta, a vereadora Ada Cristina Munaretto (PL) foi uma dos parlamentares que votaram favorável ao projeto. Para ela, a matéria de forma alguma desrespeita os profissionais da educação.
— Isso se trata do respeito às nossas crianças, aos pais, ao gênero de quem escolher, à sensualidade e respeito ao ser humano. Contudo, esse projeto não desrespeita professores, ele não desrespeita as crianças. Na escola, ele não desrespeita a ninguém, somente a quem tem algo para esconder. Ele quer, sim, que os pais possam saber o que as crianças estão aprendendo na escola. Nós queremos respeito, assim como nós devemos respeito a todo ser humano, independentemente de escolha. Por isso voto favorável — pontuou a parlamentar.
O autor do projeto, vereador Rodinei Candeia, reiterou sua manifestação de que o objetivo central do projeto era de que apenas os pais fossem informados das atividades. Para ele, a matéria não apresentava qualquer tipo de inconstitucionalidade.
—É um tema polêmico, talvez mal compreendido por alguns, mas a gente deixou bem claro qual era o objeto do Projeto de Lei, que só queria que os pais fossem informados sobre se vai haver ou não exposição de matérias relacionadas a gênero, a teoria de gênero nas escolas. Era só uma questão de informação, o projeto não padecia de nenhum visto de inconstitucionalidade, mas os colegas acabaram rejeitando. Eu acho importante de qualquer forma nós levantarmos e debatermos esse tema de uma maneira civilizada, de uma maneira educada, e acho também bem importante a participação das pessoas, favoráveis e contrários, para que a gente consiga se olhar nos olhos e se entender melhor — explicou o proponente.