Quem passa às margens da BR-285, em Mato Castelhano, no norte gaúcho, pode se considerar um privilegiado: a Floresta Nacional de Passo Fundo (Flona) fica à vista de qualquer visitante, principalmente aqueles apaixonados pela natureza, seja pelas árvores ou animais que ali habitam.
A área de conservação existe desde a década de 1940 e, em 2007, passou a ser administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Ao todo, se estende por 1.328 hectares — o equivalente a mais de 1,2 mil campos de futebol. Desses, 600 hectares são de Mata Atlântica nativa e 400 hectares de reflorestamento de araucárias, iniciado em 1947.
Funcionário da Floresta há 40 anos, Ênio José Graboski trabalhou no primeiro viveiro instalado na reserva para reflorestamento. Ele calcula que mais de 100 árvores foram plantadas ali, tanto por ele e quanto por gerações anteriores:
— É o único fragmento de floresta que nós temos aqui na região. Espero que as pessoas olhem com um olhar diferente, porque aqui é a natureza infinita, é uma natureza que Deus criou para nós e para todas as pessoas, para as futuras gerações.
Nos rios que cortam a área existem 24 espécies de peixes, enquanto a mata é refúgio para 20 espécies de répteis, mamíferos e mais de 200 aves — entre elas, os populares papagaio-charão. Outros animais comuns no local são onças-pardas, ouriços, urutaus e jaguatiricas, sendo alguns em risco de extinção.
No local, as espécies favorecem o trabalho de conservação e também a pesquisa, uma vez que a Flona permite a entrada de estudantes, pesquisadores e entidades de preservação ambiental para a observação do manejo de árvores da floresta, como o pino. Por ser um local de conservação, o espaço é aberto ao público, desde que com horário marcado.
Xaxim da época da independência
Em boa parte de uma das trilhas usadas por pesquisadores e funcionários dentro da Flona, de 8 quilômetros, apenas veículos 4x4 podem passar. Logo na saída da sede, a primeira surpresa: um xaxim de 4 metros de altura. Como a planta cresce apenas 2 centímetros ao ano, os pesquisadores acreditam que ela está no mesmo lugar desde a independência do Brasil, em 1822.
— É uma brincadeira que fazemos com as crianças. Por ser uma árvore que demora tanto tempo para crescer, estamos falando aí de 200 anos de história — disse o engenheiro agrônomo e gestor da Flona em Passo Fundo, Adão Luiz da Costa Gullich.
Por causa da exploração desenfreada na década de 1950, hoje os xaxins estão na lista de árvores em alto risco de extinção.
— Quem é mais antigo vai lembrar que as mães e avós colocavam flores, principalmente as samambaias, que são da mesma família, as pteridófitas, em vasos feitos dos troncos dessa árvore. Na época não existia essa consciência das pessoas. Por isso, o xaxim quase desapareceu — reforçou Gullich.
A colossal “Três dedos”
O caminho entre a mata preservada revela a companhia de verdadeiras gigantes. As araucárias dominam boa parte da paisagem de uma floresta ombrófila mista. São pelo menos 10 mil árvores da espécie em toda a unidade de conservação de Passo Fundo.
A trilha termina na araucária mais alta da floresta: a “Três Dedos”, árvore com 40 metros de altura e 5,25m de circunferência. Pelos cálculos dos pesquisadores, ela deve estar no lugar há pelo menos 500 anos. A explicação para o nome está no tronco: são três ramificações que seguem até o topo e lembram uma mão humana. Segundo os funcionários da unidades, essa estrutura é extremamente rara para a espécie.
— Duas ramificações até não são tão difíceis de achar, mas a genética das araucárias não apresenta ramificação no tronco, é um tronco cilíndrico e uniforme. Isso é uma raridade. Talvez a única na nossa região e do sul do país — explica Gullich.
Para conhecer essas e outras espécies que compõem a Flona, o público pode agendar sua visita à floresta pelo telefone (48) 98831-7579.