Erasmo Battistella ficou intrigado quando um amigo lhe perguntou o que era biodiesel. Alexis Rochenbach não parou de pensar em um software de gestão pedido pelo cliente que recém havia lhe comprado um computador. Antônio Roso jamais esqueceu as palavras do pai de que o negócio do futuro era aço. Foi assim, a partir de centelhas instigantes de conversas despretensiosas, que três visionários do Planalto Médio construíram empresas bilionárias.
Presidente da BSBios, maior produtora de biodiesel do país, Battistella está à frente de um complexo industrial que faturou R$ 10 bilhões em 2022, sendo responsável por 21,89% do Produto Interno Bruto (PIB) de Passo Fundo, onde mantém a sede das operações. Diariamente, cerca de 500 caminhões entram e saem da fábrica espraiada por 30 mil metros quadrados onde o empresário produz combustível, óleo vegetal e farelo de soja, entre outros derivados de oleaginosas.
A operação se repete em outra unidade da empresa, em Marialva, no Paraná. Juntas, as duas usinas têm capacidade de fabricar 2,6 milhões de litros de biodiesel por dia, a partir dos grãos fornecidos por 10.837 agricultores. Em expansão, a BSBios adquiriu, no ano passado, uma planta na Suíça, produzindo biodiesel de segunda geração a partir de óleo de cozinha usado. Em janeiro, chegou ao Paraguai, onde irá desenvolver diesel verde e bioquerosene para aviação. O próximo passo é a instalação em Passo Fundo de uma usina de etanol de trigo, num investimento de R$ 600 milhões.
Tudo isso começou em 2004, quando um jovem Battistella, então com 25 anos e dono de um posto de combustíveis, estava na fila do Banrisul no município vizinho de Colorado. Abordado por um amigo que queria entender o que era biodiesel, o empresário tratou de pesquisar o produto e descobriu que havia uma política nacional de incentivo ao setor.
Eu tive um estalo: estou no meio da soja e vendo diesel. Vou criar uma microusina, comprar a soja e vender o biodiesel para os agricultores.
ERASMO BATTISTELLA
Presidente da BSBios, maior produtora de biodiesel do país
— Eu tive um estalo: estou no meio da soja e vendo diesel. Vou criar uma microusina, comprar a soja e vender o biodiesel para os agricultores — conta Battistella, que projeta chegar em 2030 como um dos três maiores produtores de biodiesel do mundo.
No início da trajetória, Battistella procurou apoio de um dos maiores empresários da região. Sócio da fábrica de estruturas metálicas Metasa, Antônio Roso deu prestígio e suporte financeiro ao negócio, permanecendo como acionista da BSBios até 2010. Aos 76 anos, além da Metasa, ele é dono do mais moderno shopping de Passo Fundo e tem um portfólio diversificado de negócios, com 12 CNPJ's e faturamento anual de R$ 1 bilhão.
Seus mais novos empreendimentos envolvem a construção de um bairro planejado e um complexo logístico em Passo Fundo. Com 344 unidades residenciais espalhadas por 22 hectares, o loteamento tem 50 mil metros quadrados de área verde e fica a 13 minutos do centro da cidade. Já o terminal logístico foi projetado para abrigar cem lotes com até 5 mil metros quadrados cada um, aproveitando a localização geográfica do município para atuar como centro de operação e distribuição empresarial. Também está nos planos tornar o espaço um porto seco, dotado de estrutura alfandegária.
Filho de agricultores que viviam da produção de madeira e erva-mate, principais motores da economia da região até os anos 1950, Roso começou a trajetória empresarial divorciado do campo. Internado num colégio religioso na adolescência, abandonou a escola tão logo o padre o mandou capinar uma roça. Mesmo formado em Direito, jamais exerceu a atividade e fez da veia empreendedora sua profissão de fé.
Troquei uma Kombi por um bar, transformei o bar em lancheria, depois comprei o prédio, e assim fui indo, até lembrar do pai me dizer que um dia a madeira ia acabar e o negócio era trabalhar com aço. Assinei 24 promissórias e fundei a Metasa.
ANTÔNIO ROSO
— Troquei uma Kombi por um bar, transformei o bar em lancheria, depois comprei o prédio, e assim fui indo, até lembrar do pai me dizer que um dia a madeira ia acabar e o negócio era trabalhar com aço. Assinei 24 promissórias e fundei a Metasa — conta Roso, que começou produzindo esquadrias e hoje fatura R$ 400 milhões ao ano fornecendo estruturas para a indústria de petróleo e de celulose.
No final dos anos 1990, enquanto Roso ganhava os prêmios estaduais de "Homem do Aço" e "Empresário do Ano", Alexis Rochenbach dava aulas de Ciências da Computação na Universidade de Passo Fundo (UPF). Ele recém havia fundado uma firma de venda de computadores, a Compasso, atendendo empresas da região. Certo dia, um lojista que havia adquirido uma máquina perguntou se ele também não dispunha de algum programa que o ajudasse na gestão do negócio. A partir do pedido, Rochenbach percebeu que deveria apostar em softwares, e não em hardwares.
Recrutando talentos na UPF, ele montou um escritório com 10 funcionários no centro de Passo Fundo. Aos poucos, a Compasso passou a desenvolver programas, galgando clientes sobretudo na indústria moveleira da Serra. O crescimento foi tamanho que logo despertou a atenção da UOL, gigante do setor de conteúdo e serviços de tecnologia, que em 2013 adquiriu o controle acionário da companhia. Hoje, Rochenbach é acionista e CEO de uma empresa com 6 mil colaboradores espalhados por mais de 500 cidades do Brasil e do Exterior.
Estamos em vários países do mundo, mas nosso maior centro de desenvolvimento continua em Passo Fundo, com 500 profissionais. Isso deu suporte para o nosso crescimento.
LUCIANO GUARESCHI
Diretor de Operações e um dos sócios da Compass UOL
Para acelerar a expansão global, o nome mudou para Compass UOL. Nos últimos anos, a companhia comprou seis empresas somente nos Estados Unidos, ampliando o leque de clientes e serviços. Hoje a Compass oferece soluções digitais para mais de 400 clientes em setores como mídia, telecomunicações, finanças, educação, manufatura e varejo. A empresa não divulga o faturamento, mas analistas do mercado asseguram que a cifra é bilionária — somente a Avenue Code, desenvolvedora americana com 1 mil funcionários recém adquirida pela Compass, fatura R$ 950 milhões anuais.
— Estamos em vários países do mundo, mas nosso maior centro de desenvolvimento continua em Passo Fundo, com 500 profissionais. Isso deu suporte para o nosso crescimento — assegura o diretor de Operações, Luciano Guareschi, um dos estudantes recrutados por Rochenbach na UPF e que hoje é um dos sócios da empresa.